Belo Monte tenta aumentar geração de energia em 2022

Camila Maia

Autor

Camila Maia

Publicado

29/Nov/2021 13:18 BRT

A Norte Energia, concessionária da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu (PA), está conversando com o governo para tentar voltar a implementar o hidrograma A, no qual gera consideravelmente mais energia, a partir de 2022. Pelas regras de suas licenças e também pelo edital, esse seria o caminho natural da hidrelétrica no próximo ano, mas um imbróglio com o Ibama e o Ministério Público do Pará relacionado aos impactos da geração de energia na Volta Grande do Xingu pode fazer com que o empreendimento contribua menos com o sistema em seu próximo período de cheias.

A usina já declarou ao Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) que irá implementar o hidrograma A em 2022, de acordo com o Programa Mensal da Operação (PMO) de novembro, o que significa que a formação de preços vai, necessariamente, considerar essa informação em janeiro. Como neste mês a vazão dos hidrogramas A e B será a mesma, e o B está autorizado pelo Ibama até janeiro, a Norte Energia pode alterar a declaração para fevereiro, mas a expectativa da concessionária é de conseguir sensibilizar o governo e o Ibama para aumentar sua geração no próximo ano.

Os números estão a favor do pleito da usina. No total, o hidrograma A, se implementado entre janeiro e julho de 2022, contribuiria com 1,1 GW médio a mais ao sistema que o B, disse à MegaWhat o presidente da Norte Energia, Paulo Roberto Ribeiro Pinto. "Isso significa deixar de lançar 2,6 milhões de toneladas de CO2 na atmosfera com a geração por termelétricas", disse o executivo.

Conflito com Ibama e MP

O edital de licitação de Belo Monte e as licenças ambientais que garantiram sua operação determinavam que a usina iria alternar, nos primeiros seis anos, entre os hidrogramas A e B, sendo o primeiro com maior geração de energia que o segundo. No A, a vazão média mensal no trecho de vazão reduzida chega ao máximo de 4.000 m³/s em abril, enquanto no B a vazão máxima é de 8.000 m³/s no mesmo mês. Foi com base nisso que foi calculada a garantia física de 4.571 MW médios da megausina, que tem 11.233,1 MW de potência, e opera a fio d'água, isto é, sem reservatório. Como os meses de cheia são concentrados entre janeiro e julho, é nesse período que a usina gera mais energia e contribui com o Sistema Interligado Nacional (SIN).

Após um ano de operação, contudo, o Ibama avaliou que ambos os hidrogramas causavam danos consideráveis no treco da Volta Grande do Xingu, como vazões insuficientes para alimentação dos peixes. Esses efeitos ambientais, que superaram as expectativas do Ibama, foram causados por conta da redução do volume de água liberado neste trecho.

No início deste ano, foi então imposto um novo hidrograma pelo Ibama, no qual a vazão subiria dos 1.100 m³/s previstos pelos hidrogramas A e B para janeiro para quase 11 mil m³/s, aumentando a água liberada, porém reduzindo drasticamente a energia gerada pelo empreendimento. A decisão acendeu um alerta no setor elétrico, que já enfrentava uma crise hídrica sem precedentes.

Em fevereiro, a Norte Energia e o Ibama chegaram a um acordo, que envolvia a implementação do hidrograma B até janeiro de 2022, além de investimentos milionários em medidas de mitigação social e ambiental na região.

"O próximo ano seria o A, mas o termo de compromisso com o Ibama ficou concentrado no hidrograma B. Então, teríamos que provar que os compromissos foram atendidos, e iríamos conversar com o Ibama", explicou o presidente da Norte Energia.

Nem mesmo depois do acordo, a geração da hidrelétrica ficou garantida. Em junho, o MPF chegou a conseguir uma liminar suspendendo o termo de compromisso e exigindo novos estudos pela hidrelétrica sobre os impactos do desvio do rio. Logo depois, a liminar foi derrubada, e o acordo voltou a prevalecer, mas o MPF disse que iria recorrer. Atualmente, o termo de compromisso está vigente, garantindo o hidrograma B até o fim de janeiro, mas depois disso a situação está incerta.

Diante da crise hídrica, que tem obrigado o ONS a despachar termelétricas mais caras que chegam ao custo de R$ 2.500/MWh, a Norte Energia viu uma oportunidade para reforçar seu pleito de voltar à alternância entre os hidrogramas A e B, como era previsto originalmente, com o argumento adicional de que, além de ser uma energia mais limpa, é também mais barata. "Essa energia que Belo Monte gera custa R$ 144/MWh", disse Pinto.

"Há sim um interesse empresarial, em defesa dos acionistas da Norte Energia, e o hidrograma faz parte do projeto. Mas, vejo essa contribuição de Belo Monte como fundamental para o próprio consumidor, que deixaria de comprar uma energia de até R$ 2.500/MWh para pagar R$ 144/MWh", afirmou.

O executivo lembrou ainda do leilão emergencial de reserva realizado recentemente pelo governo, que contratou 1.220 MW de potência, ou 778 MW médios de garantia física, ao preço médio de R$ 1.563,61/MWh. Ao longo dos quatro anos de vigência desses contratos, as despesas serão da ordem de R$ 40 bilhões, contra um custo de R$ 4 bilhões para Belo Monte gerar energia adicional, considerando o hidrograma A em ação.

"Para quem entende que com o hidrograma A Belo Monte gera prejuízos grandes na Volta Grande do Xingu, nosso entendimento é que, em sete meses de geração, o custo-benefício é muito favorável, porque é pior jogar milhões de toneladas de CO2 na atmosfera", disse. É com base nisso que a Norte Energia tem dialogado com o Ministério de Minas e Energia (MME), Ibama e órgãos relacionados ao Ministério Público. "Mas a decisão de gerar não é minha, o governo tem que se entender com o Ibama", completou.

Atualmente, a usina, que pelas vazões históricas do Xingu estaria gerando em torno de 240 MW, está gerando quase 3.000 MW, contribuindo de forma significativa com o atendimento da carga. "Está chovendo muito na cabeceira do Xingu, então a expectativa é que será um período de muita água", disse.

Procurado pela MegaWhat, o MME respondeu que está avaliando com o Ibama, o ONS e a Norte Energia as opções para a operação de Belo Monte ao longo de 2022, de modo a minimizar os impactos ambientais e energéticos. O Ibama e o Ministério Público informaram que iriam avaliar as questões, mas não responderam até a publicação desta reportagem.