Técnicos da pasta avaliam que incentivos não otimizam uso de recursos energéticos, entre outros pontos
Dias depois do Brasil atingir 1 GW de capacidade instalada de micro e minigeração distribuída, o governo federal divulgou estudo em que conclui que o sistema de incentivos concedidos para a instalação dessas centrais não é adequado. O foco principal recai sobre a adoção de painéis fotovoltaicos, que domina as novas instalações de micro e miniGD no país, cuja regulamentação está a cargo da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), e em vias de ser revisada.
As conclusões do estudo, realizado pela Secretaria de Avaliação, Planejamento, Energia e Loteria (Secap) do Ministério da Economia, a partir de avaliações de experiências internacionais, indicam que a expansão do mercado é muito mais sensível à evolução tecnológica do que a estímulos governamentais.
E se for necessário conceder subsídios, eles sustentam que o atual modelo não deveria ser utilizado porque não otimiza o uso do recurso energético, uma vez que o investimento depende mais da tarifa de cada distribuidora do que da eficiência da geração em cada região do país.
O trabalho aponta, entre outros aspectos, uma distorção segundo a qual o atual sistema fomenta a criação de um subsídio cruzado daqueles que não possuem paineis solares instalados para os prosumidores (como são conhecidos os consumidores de energia que recorrem a essas centrais).
No caso da geração solar, eles afirmam que a energia injetada na rede durante momentos de sol é consumidora pelos demais consumidores da respectiva área de concessão, pagando por uma produção que não corresponde ao preço praticado pelas distribuidoras nos leilões regulados.
Como exemplo, o trabalho cita os resultados do leilão de energia nova A-4 de 2018, no qual a energia solar teve preço final médio de R$ 118,57/MWh. Ao mesmo tempo, ao compensar a energia da micro e miniGD pela tarifa cheia de baixa tensão, o efeito é semelhante à venda, pelo prosumidor, à distribuidora por um preço de R$ 750,00/MWh, “o que amplia muito a rentabilidade dos investimentos em micro e minigeração solar distribuída”.
Os especialistas da Secap avaliam ainda que o modelo não traz transparência na explicitação do subsídio, o que dificulta medir e monitorar os impactos da concessão dos benefícios e cria círculo vicioso, já que a adoção de centrais por prosumidores eleva a tarifa dos demais consumidores, incentivando-os a recorrer à modalidade.
“No limite, torna insustentável o negócio da distribuição e o pagamento das tarifas pelos consumidores que não instalam a geração”, Os técnicos afirmam ainda que os prosumidores fazem uso de serviços pelos quais não os remunera, algo visto como ineficiente no campo da estrutura tarifária.
Modelo
O atual modelo de micro e mini GD permite a concessão de créditos nas tarifas de energia em função da energia injetada na rede. Os excedentes podem ser acumulados para abatimento em contas posteriores, de acordo com a Resolução 482/2012 da Aneel.
O trabalho considera ainda que a descarbonização da matriz elétrica não deve ser utilizada como argumento para esse movimento. por entenderem que a predominância da geração hidrelétrica caracteriza a matriz do Brasil como limpa, o que enfraqueceria o argumento da redução de emissões para favorecer a concessão de subsídios.
“No Brasil, nem mesmo há metas para a descarbonização da geração elétrica, pois, em um comparativo internacional, o quadro atual é genuinamente favorável”, aponta o estudo. Os especialistas frisam ainda que a ampliação da GD não seria suficientemente capaz de desmobilizar a produção por termelétricas, uma vez que no campo da segurança energética, “essas duas fontes não são substitutas”.
Redução do peso nas tarifas
A crítica aos subsídios dos especialistas do Ministério da Economia se dá em meio a movimentações para a redução dessas medidas no setor elétrico (e na economia como um todo). No fim do ano passado, nos estertores do governo de Michel Temer, um decreto reduziu a concessão de subsídios para consumidores rurais e para empresas de água e saneamento via Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).
A abertura gradual do mercado livre, com a redução de limites mínimos de migração de consumidores de energia para o mercado livre, de 3 MW para 2,5 MW a partir de julho, e para 2 MW a partir de janeiro do próximo ano, na prática, reduz a concessão de subsídios para fontes incentivadas, via desconto no uso do fio.
A própria Consulta Pública 33, de modernização da regulamentação do setor elétrico, já apresentava medidas de redução de subsídios nas tarifas.
Na última quarta-feira (12/06), a Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 8.817/2017, que destina 50% dos recursos da bonificação pela outorga de licitações de concessões de usinas hidrelétricas para reduzir a cobrança da CDE.
Ao mesmo tempo, a Aneel realizou a audiência pública 01/2019 para debater aperfeiçoamentos na Resolução 482. Encerrada em maio passado, a audiência recebeu 116 contribuições documentais (a Secap do Ministério da Economia foi uma das entidades que apresentaram propostas) e gerou três reuniões presenciais, em Brasília, São Paulo e em Fortaleza.
O estudo da Secap sugere aprimoramentos no sistema de compensação (net metering), de modo que o prosumidor seja remunerado apenas pela tarifa de energia, entre outras medidas, equiparando-o a um gerador líquido, de olho no realismo tarifário e de modo a ajustar o incentivo diante de eventuais evoluções tecnológicas que tornem a modalidade mais competitiva.
Os especialistas frisam que “é necessário compreender o perfil do consumidor que detêm geração distribuída e a disponibilidade do sistema de distribuição fornecida aos prosumidores, para que esses custos sejam corretamente alocados”, completam os técnicos.
A discussão sobre subsídios também reabriu novos debates entre as distribuidoras e agentes do setor. Em janeiro, a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) criou um canal para receber denúncias de distribuidoras que descumprem as regras e dificultam o acesso do consumidor à geração distribuída.
Em paralelo, a Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee) vem defendendo a concessão de subsídios apenas “quando necessário e, mesmo assim, com imprescindível sinal de eficiência”., com foco no ProGD, programa do governo para incentivar a modalidade. Eles apresentaram estudos sobre o tema em parceria com o Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor).