A realização de um leilão para contratação de potência em 2020 vai depender do volume de contratação de energia dos leilões A-4 e A-5 previstos para abril, que envolverão termelétricas existentes e novas. “Estamos colocando a discussão do leilão de potência em pauta, mas é uma discussão condicionada”, disse Thiago Barral, presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE).
A MegaWhat visitou a sede da EPE, no Rio de Janeiro, para mais uma entrevista da série que vai conversar com as principais personalidades do setor elétrico. O resultado completo da conversa estará disponível em janeiro. Enquanto isso, antecipamos aos nossos assinantes o que Barral comentou sobre os leilões inéditos projetados para 2020.
Prévia da entrevista realizada em dezembro de 2019 na sede da EPE“O leilão de potência será realizado se os leilões de energia nova e existente A-4 e a-5 de 2020 não forem suficientes para garantir o suprimento adequado no horizonte”, disse Barral.
O governo publicou na semana passada as diretrizes dos leilões de energia existente A-4 e A-5, previstos para serem realizados simultaneamente em 30 de abril de 2020. Os certames serão destinados à energia de termelétricas a gás natural e carvão, desde que tenham custo variável unitário (CVU) de no máximo R$ 300/MWh. Além disso, os projetos existentes poderão ser “contestados” por novas usinas, se estas se provarem mais eficientes.
Um problema identificado pela EPE é que, nesses certames, a contratação de energia dependerá da demanda declarada pelas distribuidoras. Ao mesmo tempo, mudanças em discussão hoje deixam as concessionárias incertas sobre qual será a composição de seus portfólios em alguns anos.
Há por exemplo, a questão da descotização da energia hoje enquadrada no regime de cotas de garantia física e potência, que aloca uma garantia física proporcional na carteira de cada distribuidora. Outra discussão relevante é sobre o vencimento do Anexo C do contrato de Itaipu, que trata da comercialização da energia gerada naquela hidrelétrica.
“Essa é uma preocupação do Ministério de Minas e Energia. Discutir e entender com as distribuidoras como se daria a declaração de necessidade delas e trabalhar os aspectos relacionados ao portfólio das empresas para que elas possam ter todos os elementos necessários para isso”, disse Barral.
A EPE também está envolvida nas discussões de Itaipu. “Trabalhamos ao longo de todo esse ano com o MME para assessorar o processo de negociação”, disse Barral. Segundo ele, a estatal realizou uma série de estudos de apoio, tratando de possíveis cenários para o uso da energia de Itaipu.
Enquanto os leilões de termelétricas foram pensados diante do vencimento do contrato de algumas usinas mais caras e ineficientes nos próximos anos, o leilão de potência surgiu como uma solução “transitória” para o modelo de separação de lastro e energia, que vai permitir que todos os consumidores, livres e cativos, possam financiar igualmente a expansão do sistema. Hoje, quase todas as usinas despacháveis (termelétricas e hidrelétricas) são financiadas pelo mercado cativo, por meio da tarifa.
A EPE e o MME identificaram, considerando projeções de avanço da economia e crescimento da demanda por energia, que pode haver um déficit de potência nos próximos anos. O “plano A”, por assim dizer, envolve a substituição dos 3 GW de energia de termelétricas caras cujos contratos vencem entre 2024 e 2025 nos leilões de energia existente.
Se os leilões não contratarem energia suficiente, a EPE e o MME vão avaliar as perspectivas de crescimento da demanda e o suprimento de potencia projetado para os próximos anos. “Vamos continuar trabalhando monitorando esses números. Se isso se confirmar, nós já teremos feito o trabalho preparatório para executar uma ação para garantia da segurança de suprimento, mas isso será condicionado a uma série de ações que vão anteceder o leilão de potência”, disse Barral. A ideia é que, nesse leilão de potência, possam participar termelétricas e também hidrelétricas que estejam em processo de repotencialização das máquinas. Essa energia seria contratada como energia de reserva, uma vez que, nessa categoria, todos os consumidores pagam da mesma forma por meio de encargo.
Para 2021, a EPE já vislumbra a realização de leilões de contratação de lastro de forma separada da energia, a fim de garantir a confiabilidade do sistema e também de permitir que todos os consumidores, livres e cativos, sustentem a expansão da matriz de forma equilibrada.
“Nossa expectativa é que a separação de lastro e energia remova barreiras para a adequada alocação de custos associados a confiabilidade do sistema”, disse Barral. Ele lembrou que, hoje, como as fontes despacháveis (termelétricas e hidrelétricas, principalmente) ficam alocadas no mercado regulado, os consumidores cativos acabam concentrando o custeio dessa garantia de confiabilidade.
Isso porque a estrutura do mercado livre não permite um crescimento “saudável e sustentável” no longo prazo. “Queremos remover barreiras para que isso ocorra de forma sustentável e competitiva”, disse. Para o presidente da estatal de planejamento de energia, apenas a separação de lastro e energia não é suficiente, sozinha, para garantir essa expansão equilibrada do mercado. “Mas é uma condição necessária para que se possa avançar na abertura ordenada do mercado, sem gerar distorções e desequilíbrios”, completou.