As instituições financeiras que manifestaram interesse em participar da “Conta-Covid”, empréstimo negociado pelo governo para injetar recursos no caixa das distribuidoras de energia, indicaram condicionantes às suas propostas relacionadas ao nível de adesão das distribuidoras à transação.
Ao mesmo tempo, segundo fontes ouvidas pela MegaWhat, algumas distribuidoras consideraram muito alto o custo final do empréstimo, que foi estimado em até CDI + 3,89% ao ano, e avaliam tomar uma fatia mínima no empréstimo, o que pode comprometer sua conclusão.
A MegaWhat teve acesso à carta enviada pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) às distribuidoras comunicando que a taxa de juros da operação, considerando o volume estimado de R$ 16,3 bilhões, seria equivalente a CDI + 2,9% a.a.. Considerando os fees dos bancos, o custo final pode chegar a até CDI + 3,89 a.a., taxa superior ao custo de capital de muitas distribuidoras de energia.
A CCEE informou ainda que 19 instituições financeiras manifestaram interesse em participar da transação: BNDES, Banco do Brasil, Bocom BBM, CCB, Santander, Bradesco BBI, Itaú BBA, BTG, Citibank, SMBC, Votorantim, Alfa, ABC Brasil, Safra, JP Morgan, Credit Suisse, Bank of America, Haitong e MUFG.
Custo alto
O spread final da operação surpreendeu algumas distribuidoras, que defendiam uma taxa menor, devido ao baixo risco da operação. “Os fees de estruturação da operação e o empilhamento de custos é que estão tornando ela cara”, disse um executivo do setor, que pediu para não ser identificado.
O problema, nesse caso, é que algumas distribuidoras podem optar por tomar recursos abaixo dos limites máximos estabelecidos pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para a operação.
O decreto 10.350/2020, que estabeleceu as diretrizes para a conta, e a resolução normativa (REN) 885 da Aneel falham, na visão das distribuidoras, ao não deixar claro quem vai arcar com os custos financeiros da operação.
Prevalece o entendimento de que os juros do financiamento serão pagos também pelos consumidores, por meio da tarifa. O maior obstáculo estaria na questão de valores que potencialmente excedam o impacto da pandemia na CVA.
“Vamos supor que eu tenha direito a R$ 100 milhões, mas o meu mercado se recupere e eu acabe tendo impacto de R$ 50 milhões. Eu vou devolver o excedente, mas não está claro se o pagamento do spread do que eu peguei a mais vai ser compartilhado com toda a cadeia ou ficará só comigo”, disse um executivo de uma distribuidora.
Segundo ele, não faz sentido a distribuidora arcar com todo o custo, já que ela tomou o empréstimo como uma forma de manter toda a cadeia líquida. “Se eu tiver o risco de arcar com esse custo tão oneroso, não vou pegar o máximo, vou pegar o mínimo. Vou pegar R$ 50 milhões”, exemplificou, ressaltando que era uma situação hipotética.
Essa lógica vale especialmente para as companhias que têm um custo de capital inferior ao que será embutido na Conta-Covid. Mesmo nesses casos, não valeria a pena a distribuidora ir diretamente ao mercado fazer a captação, pois iria onerar seu balanço.
Um dos principais pontos da Conta-Covid é que ela é “off balance”, isto é, não será registrada como passivo nos demonstrativos das distribuidoras. Isso é importante para não aumentar o nível de endividamento dessas empresas.
“Não vamos onerar nosso balanço para atender a demanda. Estamos provendo liquidez para um problema que não é das distribuidoras, mas de toda a cadeia”, disse um executivo do setor, lembrando que as distribuidoras ficam com cerca de 18% do que arrecadam. O restante é repassado para pagar custos como encargos, compra de energia e transmissão.
Também não está claro na REN 885 se o spread da Conta-Covid será off balance, o que chega a preocupar as concessionárias mais alavancadas. “O texto ficou pouco objetivo e isso gera certo desconforto”, disse uma fonte.
BNDES
Se algumas distribuidoras decidirem não aderir ao empréstimo ou retirar valores inferiores ao limite máximo, o total da Conta-Covid será, consequentemente, menor que os R$ 16,3 bilhões estimados pelos bancos.
Para chegar à taxa média final, o BNDES assumiu um terço do empréstimo a um custo menor do que os demais bancos, o que puxou o montante para baixo. Não está claro ainda se o banco estatal vai manter sua fatia no bolo ou se vai reduzir a exposição para continuar com a mesma proporção de um terço do montante.
Se o BNDES continuar com a mesma exposição (aumentando a proporção do total financiado), a tendência é que o custo caia no processo de bookbuilding, já que alguns bancos que ofereceram spreads mais caros para participar poderão sair fora do negócio.