Dez anos e duas grandes crises econômicas depois, já era de se esperar que a realidade em 2021 seria bem diferente do cenário projetado no Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2012-2021. Mas algumas curiosidades na comparação entre o previsto e o ocorrido de fato chamam atenção, justamente quando o país se vê em meio a uma nova crise energética.
Lançado oficialmente em janeiro de 2013, o PDE 2012-2021 estimava que o consumo de energia elétrica do país alcançaria 773,8 mil gigawatts-hora (GWh) em 2021. De acordo com a última versão da resenha do consumo de energia da Empresa de Pesquisa Energética, nos últimos 12 meses encerrados em abril, porém, o consumo de energia no país totalizou 484,5 mil GWh, um volume 37,4% inferior ao previsto no plano.
A diferença expressiva entre o consumo projetado e o realizado deve-se principalmente às duas crises econômicas registradas na última década. A primeira ocorreu no período de 2015 e 2016, com uma queda acumulada do PIB de 7,1% naquele biênio. O PDE 2017-2026 fez uma correção de rota e ajustou a previsão de consumo de energia em 2021 para 609 GWh em 2021. Uma nova crise econômica, porém, atingiu em cheio o país no ano passado, com um recuo de 4,1% do PIB.
Frustração
A frustração no consumo de energia em 2021 deve-se principalmente à variação do PIB. O estudo decenal havia sido elaborado com base em um crescimento médio do PIB de 4,7% ao ano. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), porém, o crescimento da economia brasileira na última década foi de apenas 0,26% ao ano.
Outro ponto alarmante é que o PDE 2012-2021 previa que o consumo industrial de energia chegaria ao fim do período em 266,5 GWh. O setor, porém, registra atualmente consumo de 172,4 GWh, volume inclusive 10% menor que o observado em 2012, de 192 GWh.
Era de se esperar que tal frustração do consumo de energia dez anos depois deixaria o país, pelo menos, em uma situação confortável em relação ao balanço entre oferta e demanda. Mas não foi isso que aconteceu.
Oferta
Ao se olhar a oferta projetada no PDE 2012-2021, também é possível constatar que o cenário projetado não se concretizou. A capacidade instalada atual do parque gerador brasileiro, de 171,2 gigawatts (GW), de acordo com dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) é 15% menor que o previsto no fim do horizonte daquele plano decenal, de 184,4 GW.
Ao analisar a composição da oferta, a fonte hidrelétrica é a que apresentou a maior frustração em termos absolutos, de 44,3 GW. A potência não adicionada ao sistema é equivalente a quatro hidrelétricas do porte de Belo Monte, no rio Xingu (PA), de 11,233 GW, ou pouco mais do que três usinas do tamanho de Itaipu, na fronteira com o Paraguai, de 14 GW.
O PDE 2012-2021 previa uma capacidade instalada de fonte hidrelétrica de 153 GW em 2021. O parque gerador hidrelétrico do país hoje, porém, é de 108,7 GW, segundo o ONS.
O problema, no entanto, não ocorreu apenas com as hidrelétricas. A projeção de oferta de praticamente todas as fontes de energia registrou frustração em 2021, em relação ao previsto no PDE 2012-2021. A única tecnologia que apresenta hoje capacidade instalada superior ao previsto naquele plano é a de termelétrica a gás natural. O plano previa 13,1 GW de usinas a gás instaladas em 2021. De acordo com o ONS, porém, o parque termelétrico a gás do país hoje soma 15 GW.
(Foto: Alexandre Marchetti)