Eólica

Regra para projetos híbridos abre espaço para expansão de renováveis e otimização da rede

UFV Flutuante da Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf)/ Crédito: Saulo Cruz (MME)
UFV Flutuante da Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf)/ Crédito: Saulo Cruz (MME)

As novas regras para usinas híbridas ou associadas, aprovadas no início do mês pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), trazem enorme potencial de combinação de distintas tecnologias de geração de energia no país, com ganhos significativos para a otimização do uso do sistema de transmissão.

Segundo levantamento da MegaWhat, considerando as 40 maiores hidrelétricas do Brasil, se forem instalados painéis solares flutuantes em 1% da área alagada, haveria um acréscimo de 22 GW de potência ao Sistema Interligado Nacional (SIN). 

A estimativa considera a mesma potência instalada por área do projeto de Pesquisa & Desenvolvimento (P&D) da hidrelétrica de Sobradinho. De acordo com o analista setorial da MegaWhat, Lucas Frangiosi, o potencial é muito maior, uma vez que existem 925 hidrelétricas no Brasil.

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Com a nova regra, que passa a vigorar em janeiro de 2022, os conjuntos híbridos ou associados poderão contratar montante de uso do sistema de transmissão (Must) dentro de uma faixa que varia entre a soma das potências elétricas ativas nominais da tecnologia de geração de maior participação e a soma das potências elétricas ativas nominais de todas as tecnologias de geração da central geradora híbrida.

A medida foi bem recebida pelos investidores em geração de energia, uma vez que vai permitir a combinação de diferentes fontes sem precisar aumentar o Must declarado, aumentando a competitividade do empreendimento. “Nós temos usinas eólicas na Bahia, onde venta muito à noite. Se eu adiciono solar, posso aproveitar 100% da conexão de dia”, explicou Francine Martins Pisni, gerente de assuntos regulatórios na AES Brasil.

A regra não veta tecnologias, o que significa que hidrelétricas que estejam no Mecanismo de Realocação de Energia (MRE) poderão associar outras fontes aos empreendimentos, como os painéis solares flutuantes. 

A energia não hídrica, contudo, não poderá ser contabilizada no MRE, o que contraria as expectativas dos agentes que acreditavam que, com a hibridização das hidrelétricas, o problema do GSF poderia ser minimizado.

“Não foi a solução que a gente esperava, mas foi a possível. Nossa primeira preocupação é que um grupo de agentes defendia que fosse vedada a associação com usinas do MRE, e isso não aconteceu”, disse Pisni, da AES, uma das empresas mais afetadas pelo GSF no sistema, pela forte presença de hidrelétricas em seu portfólio. Para a especialista, o ponto de satisfação é que não houve a vedação, e agora será possível trabalhar entendendo os riscos e oportunidades para pleitear a mudança no futuro.

Para Angela Gomes, consultora estratégica na PSR, a regra é positiva para as hidrelétricas, que poderão agregar mais uma usina pagando menos Must. “Ele não vai poder alocar a garantia física no MRE, mas poderá ser um hedge, assim como qualquer investimento”, disse. Ou seja, essa energia adicional que será gerada poderá ser utilizada como uma proteção contra o GSF, como já é feito atualmente pelas usinas, mas com a vantagem de pagar menos pela transmissão.

“Sobre usar a associação como solução do MRE e jogar nele também usinas renováveis, já ouvi isso no passado, mas hoje não mais porque já existe a otimização de portfólio dos próprios players”, disse Gomes.

A vantagem para os empreendimentos existentes está na otimização do uso da rede e na composição do hedge, disse Franklin Miguel, diretor de regulação e comercialização na Norte Energia, concessionária da hidrelétrica de Belo Monte. 

Segundo ele, para a usina, é inclusive melhor que a energia adicional não seja contabilizada no MRE, já que isso permite contratar essa energia ou liquidar no PLD. “É ruim para o agente colocar no MRE, porque você recebe apenas a tarifa de otimização”, disse o especialista, se referindo à TEO, que foi fixada em 2021 em R$ 12,74/MWh.

Para Belo Monte, por conta da localização próxima do Equador, a insolação é boa, e a hidrelétrica pode aproveitar as áreas em torno ou mesmo dentro do reservatório para colocar os painéis solares flutuantes. “Estamos estudando como se daria a contratação, se faria sentido ou se aumentaria muito o Must”, disse Miguel.

Uma alternativa para a hidrelétrica, considerando seu regime de chuvas concentrado em seis meses do ano, uma alternativa pode ser utilizar a energia gerada pelos painéis solares para produzir hidrogênio verde em parte do ano, evitando o aumento do Must. “Ainda é incipiente a tecnologia, mas é possível”, disse Miguel. Já no período em que a usina tem menor vazão, a energia solar pode ser injetada na rede.

Transmissão

Enquanto a regra para usinas híbridas e associadas foi pensada em otimizar o uso da rede de transmissão, a votação do processo na Aneel levantou uma preocupação sobre os gargalos de transmissão de energia no país.

Segundo Monique Riscado, gerente de projetos e consultora da PSR, a resolução aprovada determinou que a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) e o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) terão 120 dias para propor as alterações nos procedimentos de carga e de comercialização, quando serão definidas as eventuais regras para corte em caso de sobrecarga, o que pode acontecer caso um gerador contrate um Must menor que o necessário.

“É claro que com os projetos ficando mais viáveis, você pode ter um desafio relacionado à transmissão, mas não se pode travar as usinas híbridas por outras questões que precisam ser resolvidas”, disse Riscado. 

Para Élbia Gannoum, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), a autorização dos projetos híbridos não significa que, dos 21 GW em eólicas instalados, todos terão a instalação de painéis solares fotovoltaicos. “Não serão em todos que teremos a possibilidade de ganho de escala”, explicou.

“É a nova fronteira da competição, mas eu tenho dúvida se o montante de projetos eólicos com solares serão tão maiores que os montantes dos projetos separados”, disse Gannoum. Para ela, considerando a expansão do sistema até 2030, no máximo 30% dos projetos devem ser híbridos, com um papel “marginal”, sem poder de levar a curva de preço para um patamar mais baixo.

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