Combustíveis

“ONS dos combustíveis” pode ser positivo, mas tabelamento de preços preocupa especialistas

O anúncio do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, sobre a criação de um órgão para fiscalização do mercado de distribuição de combustíveis no Brasil surpreendeu o mercado, deixou dúvidas sobre sua formatação e levantou preocupações sobre o tabelamento de preços de combustíveis – o que é vedado pela atual lei do petróleo. O anúncio foi feito pelo ministro na última segunda-feira, 30 de outubro, enquanto participava de um evento em Minas Gerais.

“ONS dos combustíveis” pode ser positivo, mas tabelamento de preços preocupa especialistas

O anúncio do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, sobre a criação de um órgão para fiscalização do mercado de distribuição de combustíveis no Brasil surpreendeu o mercado, deixou dúvidas sobre sua formatação e levantou preocupações sobre o tabelamento de preços de combustíveis – o que é vedado pela atual lei do petróleo. O anúncio foi feito pelo ministro na última segunda-feira, 30 de outubro, enquanto participava de um evento em Minas Gerais.

Especialistas ouvidos pela MegaWhat consideram que aproximar o mercado das atividades de controle de combustível pode ser positivo, mas questionam a viabilidade regulatória para controlar preços e a necessidade de mais um órgão para realizar atividades atualmente desempenhadas pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

A ideia de garantir que os descontos praticados pela Petrobras “ou qualquer outra fornecedora, importador ou refinaria”, como disse Silveira, cheguem ao consumidor final é vista com bastante desconfiança, tanto pelas condições para que tal medida ocorra na prática, quanto pelo risco de tabelamento de preços.

Entre os fatores que desafiam a aplicação de uma fiscalização robusta sobre os postos, está a grande quantidade desses estabelecimentos – em torno de 40 mil em todo o país – e a multiplicidade de fornecedores de combustíveis em um mercado com refinarias privadas e que tem grandes volumes de combustíveis importados.

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“Quais serão as bases para a fiscalização dos preços? A Lei do Petróleo fala que há livre concorrência, não temos tabelamento de preços há muitas décadas”, diz Fernando Xavier, sócio nas áreas de Energia, Petróleo e Gás do Machado Meyer Advogados. “Não tem base legal. É o tipo de medida que, se passar, é litígio na hora”, complementa.

“Como o preço é livre, se ele quiser que os descontos da Petrobras sejam sempre integralmente repassados para o consumidor, teria que tabelar o preço. O posto não é o único elo na cadeia, se deixar o preço livre, tem sempre um elo que pode se apropriar da margem, não tem como garantir”, diz o diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Pedro Rodrigues.

O Instituto Combustível Legal (ICL) divulgou comunicado elogiando a criação do novo órgão, mas também apontando preocupação com a intervenção sobre margens e preços. “Nós somos favoráveis a criação de uma robusta central de monitoramento de combustíveis para evitar fraudes tanto operacionais quanto fiscais. Porém, hoje o país tem cerca de 43 mil postos de combustíveis que disputam a preferência do consumidor e trabalham em livre concorrência, isso não pode mudar”, diz em nota o presidente do ICL, Emerson Kapaz.

Para os agentes, o controle de preços deve ser regulado pela própria concorrência, e não por um órgão externo. “A distribuição e a revenda são elos da cadeia de suprimentos de combustíveis com muitos agentes, e portanto, muito competitivos. O agente que não repassar reduções de preços dos produtos da Petrobras ou de Importadores sofrerão com reduções dos volumes vendido”, disse o presidente da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), Sérgio Araujo.

Fiscalização pode ser aprimorada

Para que o mercado de livre concorrência funcione corretamente, é importante que haja mecanismos para fiscalização de práticas anticoncorrenciais, que entidades como a ANP, o Programa de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon) e entidades fiscais estaduais já desempenham atualmente. “O aumento da fiscalização poderia ser feito pelo aprimoramento desses órgãos e não criando mais uma entidade, que no final aumentaria o custo de transação do setor”, diz Pedro Rodrigues, do CBIE.

Para Fernando Xavier, do Machado Meyer Advogados, a criação de um novo órgão focado na fiscalização pode ser positiva para a ANP na medida em que libera recursos da agência para atividades mais estratégicas, como regulação de novos combustíveis e matérias-primas. “Depende muito de como seria desenhado”, pondera.

O especialista também avalia ser positiva a iniciativa de aproximar o setor privado da gestão de abastecimento nacional e o formato de entidade paraestatal, mais flexível do que uma autarquia ou agência reguladora do ponto de vista da criação de cargos, financiamento e deliberações.

Setores elétrico e de combustíveis têm naturezas diferentes

O ministro Alexandre Silveira e o Ministério de Minas e Energia (MME) chamaram o novo órgão de Operador Nacional do Sistema de Distribuição de Combustíveis, em alusão ao Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). A comparação causa estranheza pelas diferenças entre o mercado elétrico e o de combustíveis. “O setor elétrico é um monopólio natural, remunerado através de tarifa. O setor de combustível é um varejo”, avalia o diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Pedro Rodrigues.

Especialistas ouvidos pela MegaWhat também criticam a forma como o anúncio foi feito, sem uma minuta mais detalhada. “Temas muito sensíveis não deveriam ser apresentados de forma pouco detalhada. Já deveria vir com um alinhamento maior e talvez com um pouco mais de cuidado. Um ministro de estado sabe o impacto que algumas informações podem ter”, disse Fernando Xavier, do Machado Meyer Advogados.

MME diz que não haverá aumento de despesas nem interferência na ANP

Procurado pela MegaWhat, o Ministério de Minas e Energia (MME) informou que o sistema “criará mecanismos para o monitoramento em tempo real das informações logísticas, de comercialização, de qualidade, de preços e tributos de toda a cadeia de abastecimento”, mas não deu mais detalhes de como isso seria feito.

Segundo o ministério, com o compartilhamento de dados da ANP, será possível o acesso a informações como preços, volumes, movimentação e estoques, não apenas dos combustíveis, mas dos insumos para fabricação ou transformação. “Com o aumento da eficiência desses mecanismos de fiscalização, será possível combater a formação de cartéis e a adulteração dos combustíveis”, diz a nota.

O MME também informa que a criação do operador não afetará as atribuições da ANP nem implicará aumento de despesa, “pois será custeada a partir de contribuições de seus membros e emolumentos”.

Segundo declaração de Alexandre Silveira na última segunda-feira, há uma proposta em elaboração que será encaminhada “em breve” para apreciação do Congresso Nacional.

Matéria editada no dia 06/11 às 11h24 para correção da identificação de Sérgio Araujo.