O Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou, por unanimidade, a solução consensual entre a Karpowership do Brasil (KPS), o Ministério de Minas e Energia (MME) e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para cumprir o contrato do Procedimento Competitivo Simplificado (PCS), leilão emergencial realizado em outubro de 2021 para contratar termelétricas adicionais em meio à crise hídrica daquele ano.
O acordo aprovado prevê a redução das multas editalícias e contratuais aplicadas à KPS, de R$ 1,114 bilhão para R$ 336 milhões, ao mesmo tempo em que reduziu a da geração inflexível das quatro usinas contratadas, de 144 MW médios para 29 MW médios de energia.
Segundo o relator do processo, ministro Benjamin Zymler, o acordo gera um benefício de R$ 1,638 bilhão para os consumidores de energia elétrica, dos quais R$ 80 milhões se referem à redução da inflexibilidade das usinas.
Solução definitiva
Esse é o segundo acordo de solução consensual referente às termelétricas da KPS que o TCU aprova. O primeiro acordo foi aprovado em junho, com validade até o fim de 2023, e também incluiu a flexibilização da energia das termelétricas da KPS que venceram o leilão de 2021. Nesse caso, o tribunal estimava uma economia de R$ 580 milhões em encargos aos consumidores.
Com esse acordo, os processos administrativos que tramitavam na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) sobre a KPS foram suspensos, mas poderiam ser retomados a partir de janeiro de 2024 caso o segundo acordo não fosse aprovado.
As tratativas no TCU têm a intenção de resolver conflitos entre as empresas vencedoras do PCS e o governo, depois que muitos dos projetos entraram em operação com atraso.
A empresa turca venceu o PCS com quatro projetos, as usinas Karkey 013, Karkey 019, Porsud I e Porsud II, que somam 560 MW e foram contratadas ao preço médio de R$ 1.599,47/MWh.
Os empreendimentos não entraram em operação no prazo previsto pelo edital. A Aneel iniciou o processo de penalidade, que poderia levar à rescisão dos contratos, mas a empresa entrou com recurso administrativo pedindo excludente de responsabilidade, e o mérito do pedido não foi deliberado até o momento. Em paralelo, a empresa foi à Justiça e conseguiu as liminares que garantem sua geração e o recebimento integral do encargo pela energia, sem pagar nenhuma penalidade pelo atraso.
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Com a proteção judicial, a KPS passou a ter direito ao recebimento da receita integral contratada, apesar de haver geração mais barata disponível no sistema. Segundo o ministro Zymler, a “redução substancial” das penalidades partiu de uma negociação entre as partes e a área de solução consensual do Tribunal, que buscaram um “meio do caminho” entre seus interesses. De um lado, as multas serão menores, mas de outro a KPS desistirá das ações judiciais e ainda terá direito a uma remuneração menor, já que as usinas terão flexibilidade e não vão mais gerar o tempo todo na base.
“Não há dúvidas que as multas aplicadas pela Aneel e pela CCEE [Câmara e Comercialização de Energia Elétrica] são adequadas. Mas, o que estamos fazendo aqui é juízo de culpabilidade entre as partes”, destacou Zymler.
“Por que [a inflexibilidade] não foi para zero? A KPS trouxe à mesa de discussão a impossibilidade de reduzir a zero sua geração por razões logísticas e contratuais. Das quatro usinas do processo, a UTE Karkey 013 será responsável pela geração, isso é um grande ganho para os consumidores de energia elétrica”, afirmou o ministro do TCU durante a leitura do seu voto.
De acordo com Zymler, como a usina teve cinco meses de atraso para iniciar a geração de energia, o prazo do contrato será ampliado em cinco meses, totalizando 44 meses de operação comercial.
Embora os acordos tenham sido celebrados pelo governo, a Abrace, associação que representa os grandes consumidores de energia, afirmou que o assunto poderia ter sido resolvido pela Aneel, no âmbito administrativo, sem a interferência do tribunal. “Esse seria um caso raro em que a segurança jurídica favorecia quem paga a conta, mas, infelizmente, como representantes dos consumidores não fomos aceitos como parte do processo de conciliação no TCU”, lamentou a entidade.
O que aconteceu?
Durante o voto, o relator do processo, ministro Benjamin Zymler, lembrou que o PCS foi idealizado como mecanismo de contratação extraordinária para aumento da oferta de energia buscando mitigar potenciais dificuldades de suprimento de energia elétrica no período entre 2022 e 2025, em decorrência dos baixos níveis de afluência hídrica verificados nos dois anos anteriores.
O procedimento foi estabelecido conforme diretrizes do MME com prazos reduzidos, com definição de requisitos específicos para estabelecimento do certame, delimitação de localização dos empreendimentos (submercados Sul e Sudeste/Centro-Oeste), além do estabelecimento do prazo de suprimento entre maio de 2022 e dezembro de 2025. Já a Aneel ficou responsável, entre outras coisas, por elaborar o edital e as minutas dos Contratos de Energia de Reserva (CERs) que seriam firmados, além de autorizar a implantação e exploração dos novos empreendimentos.
No âmbito do PCS foram contratados mais de 24.900 TWh de energia, com disponibilidade de cerca de 1.220 MW de potência ao Sistema Interligado Nacional (SIN). Os contratos de energia de reserva foram celebrados totalizando mais de R$ 11 bilhões anuais, dos quais cerca de R$ 9 bilhões seriam repassados ao consumidor cativo, com impacto de 4,49% nas tarifas de energia.
A KPS venceu o certame para implantação de quatro usinas termelétricas (Karkey 013, Karkey 019, Porsud I e Porsud II), que agregam 560 MW de potência ao SIN. Os contratos foram celebrados para geração de 1.261,701 TWh de energia elétrica inflexível por ano – aproximadamente 144 MW médios em base anual.
Solicitação de solução consensual
A reversão do cenário de escassez hídrica em 2022, o aumento da energia armazenada nos reservatórios das hidrelétricas e a redução dos preços da energia no mercado de curto prazo fizeram com que os contratos do PCS não fossem mais necessários para o suprimento de energia do SIN, segundo Zymler.
Considerando esse novo cenário e o atraso de parte dos empreendimentos, o TCU fixou prazo para que o MME avaliasse as vantagens e desvantagens quanto às possibilidades de manutenção dos contratos, rescisão ou outra solução negociada, considerando impacto nas tarifas no curto, médio e longo prazos e a segurança do fornecimento de eletricidade.
Em março deste ano, o ministro do MME, Alexandre Silveira, apresentou solicitação de solução consensual para tratamento da controvérsia, envolvendo divergências sobre a possibilidade e as alternativas de alteração amigável dos contratos da KPS, buscando compatibilizar sua execução com as necessidades do sistema no horizonte de curto e médio prazos, com os impactos tarifários da energia contratada em um cenário de escassez de energia, e com os investimentos e esforços envidados pela KPS para viabilização dos empreendimentos.
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