A publicação da Medida Provisória (MP) 1.227/2024, que impõe restrições à compensação de créditos das contribuições PIS/Pasep e Cofins, gerou críticas do Senado Federal, Câmara dos Deputados e de diversos agentes ligados à indústria e ao setor de petróleo e gás, que alertaram para a possibilidade de retração de investimentos. Por se tratar de uma MP, o texto já está em vigor, mas precisa ser aprovada pela Câmara e pelo Senado para virar lei e não perder a eficácia após um período de até 120 dias.
Chamada também de “MP do Equilíbrio Fiscal”, a medida busca compensar perdas de receita que o governo terá este ano com o acordo que manteve a desoneração da folha de pagamento para 17 segmentos da economia e para municípios com até 156 mil habitantes. Adotada por meio da Medida Provisória nº 540, de 2011, e logo depois convertida em lei, a desoneração é uma política que substituiu a contribuição previdenciária de 20% paga pelo empregador sobre a folha de pagamento por alíquotas que variam entre 1% e 4,5% sobre a receita bruta da empresa.
Indústria se posiciona
A Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás) expressou preocupação com a MP, dada a possibilidade de que afete a competitividade do setor regulado de gás natural canalizado ao comprometer o fluxo de caixa das empresas contribuintes, que não mais poderão compensar seus créditos de PIS/Cofins com outros débitos tributários federais. Segundo a entidade, isso prejudica a realização de investimentos e expansão de seus empreendimentos econômicos, que poderiam ser capazes de gerar um aumento de receita tributária, a longo prazo, frente ao estímulo de um maior potencial de capacidade instalada.
Para a Abegás, a única exceção “admitida” da proposta seria a compensação tributária regular dos créditos de PIS/Cofins do regime não-cumulativo com os débitos de Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB).
Já a Confederação Nacional da Indústria (CNI) informou que tomará todas as medidas jurídicas e políticas para contestar os termos da MP, por entender que ela vai em sentido contrário à política do governo de restaurar a competitividade da atividade industrial no Brasil, como proposta na Nova Indústria Brasil (NIB).
“Chegamos ao nosso limite. Nós somos um vetor fundamental para o desenvolvimento do país e vamos às últimas consequências jurídicas e políticas para defender a indústria no Brasil”, diz Ricardo Alban, presidente da CNI, em nota. “Não adianta ter uma nova e robusta política industrial de um lado se, do outro, vemos esse ataque a nossa competitividade”, completou.
Por sua vez, a Associação Brasileira de Produtores Independentes de Petróleo e Gás (ABPIP) destacou que a MP patrocinada pelo Ministério da Fazenda traz “diversos problemas e impactos negativos” para a economia em geral e para o setor de petróleo e gás, especialmente para as operadoras independentes.
”As restrições à compensação de créditos resultarão em um aumento significativo da carga tributária, impactando negativamente sua competitividade, capacidade de investimento e dificultando o planejamento e a gestão dos negócios. As operadoras independentes, dado o seu perfil e por operarem campos de baixa economicidade, serão as mais impactadas pelas medidas da MP, que pode inclusive tornar inviáveis algumas de suas operações”, afirmou a associação.
O Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) defendeu que as empresas terão que utilizar outros recursos para pagar seus impostos que não os créditos de PIS/Cofins e que a medida representa um retrocesso, sendo “incompatível com os consensos estabelecidos durante a aprovação e o processo de implementação da reforma tributária”.
A entidade afirma ainda que a medida vai onerar vários setores da economia, como o de petróleo, gás e combustíveis, que já “convivem com uma carga tributária elevada”, tendo como consequência a elevação de custos no transporte público e no frete de cargas e alimentos, entre outros, com impactos negativos no consumidor final.
Críticas do Senado e da Câmara
A MP também foi muito criticada no Congresso, até por não ter sido negociada previamente com os parlamentares. Senadores sugeriram ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que busque alternativas para aumentar a arrecadação dos cofres públicos sem comprometer o setor produtivo.
A senadora Tereza Cristina (PP-MS), líder do partido, afirmou à Pacheco que a medida traz insegurança para os setores como o da indústria, o da agropecuária e o de minérios. Na visão da senadora, o impacto é maior sobre os setores que exportam, já que produtos destinados à exportação são isentos do recolhimento de Cofins e PIS/Pasep. Segundo ela, isso significa que, com a MP, não haverá débitos dessas contribuições que possam ser compensados com os créditos gerados. Para ela, usar a limitação da compensação de créditos como forma de permitir a manutenção da desoneração da folha é o mesmo que “dar com uma mão e tirar com a outra”.
Uma coalizão de 24 parlamentares da Câmara dos Deputados publicou um manifesto falando sobre “as graves consequências que a Medida Provisória poderá causar à economia nacional”, alertando que as restrições aumentam a burocracia tributária e contradizem os princípios que orientaram a reforma tributária aprovada recentemente.
O que diz a MP
A MP veio para compensar a queda da arrecadação pela manutenção do regime de desoneração da folha, que deveria ter acabado em 2023, mas foi prorrogado por mais quatro anos pelo Congresso Nacional no final do ano passado, através da Lei nº 14.784/2023. Cálculos do ministério da Fazenda sugerem que a continuidade da política pode custar R$ 26,3 bilhões ao governo no exercício de 2024, sendo R$ 15,8 bilhões em relação às empresas e R$ 10,5 bilhões em relação aos municípios. Com o fim da compensação, a estimativa do governo era de um aumento de R$ 29,2 bilhões na arrecadação somente em 2024.
Segundo a pasta, a MP visa combater a “desarmonia sobre as contas públicas e reduzir as distorções que afetam estados e municípios, promovendo a justiça tributária”, com diretrizes envolvendo sistemática de não-cumulatividade do PIS e Cofins. De acordo com a Fazenda, a não cumulatividade deveria ser um instrumento para tributação efetiva, neutra nas cadeias de produção em consumo, em que cada contribuinte, ao recolher o tributo, abate o valor incidente nas operações anteriores.