A diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou a abertura de duas consultas públicas relacionadas a Medida Provisória (MP) 1.232/2024 nesta terça-feira, 03 de setembro. Uma das CPs receberá contribuições sobre o plano apresentado pela Âmbar Energia para assumir o controle da Amazonas Energia, uma transferência vista como “preocupante” pelo diretor-geral da autarquia, Sandoval Feitosa, dada a falta de experiência da holding do grupo J&F no segmento.
A preocupação de Sandoval é compartilha pelo diretor-relator do processo, Ricardo Tili, que pontuou, em seu voto, a análise da área técnica da autarquia de que a empresa utilizou do seu quadro técnico a ser constituído na distribuidora e do seu histórico de atuação no setor elétrico em geração para se dizer apta a assumir a concessão.
“A matéria tem causado preocupação e as áreas técnicas e o relator pontuaram a necessidade de um plano de ação robusto, dado os desafios grandes da concessão. A parte da qualificação técnica preocupa muito o regulador, porque precisamos de uma equipe eficiente, capacitada, para que possamos reverter a tendência naquela concessão”, afirmou o diretor-geral.
Segundo Feitosa, a autarquia tem sinalizado “há muito tempo a deterioração das condições técnicas, financeiras e econômicas da concessão”, porém a MP, analisada em prazo “exíguo”, pode emular as condições de eficiência esperadas para a concessão, considerando o que aconteceu em outras concessões no país.
De acordo com a Medida Provisória, o novo controlador precisa demonstrar capacidade técnica e econômica, realizar aporte de capital, apresentar benefícios à concessão e aos consumidores e a transferência deve ocorrer por valor simbólico, aprovado pela assembleia geral do atual controlador, a Oliveira Energia.
Transferência de controle da Amazonas e a análise da área técnica
A consulta pública, a se realizar no período de 4 a 13 de setembro de 2024, busca obter subsídios e informações adicionais para o estabelecimento das condições necessárias à transferência do controle societário, da Amazonas Energia, nos termos de um dos artigos da Medida Provisória.
Em nota, a Aneel afirmou que o período da consulta é justificado pela urgência de deliberação da situação da Amazonas Energia, dada a perda das condições de sustentabilidade econômico-financeira da distribuidora conjugada com o término das flexibilizações temporárias, endereçadas pela Medida Provisória nº 1.232/2024, ainda em setembro de 2024.
O objetivo da CP é discutir o problema econômico-financeiro enfrentado pela Amazonas Energia, tanto do ponto de vista da dívida quanto a geração de caixa para os níveis compatíveis com a concessão de distribuição de energia elétrica no estado, por meio da transferência de controle acionário.
Um dos pontos a serem discorridos na CP é o plano da Âmbar para concessão, que, no ponto de vista da área técnica da agência, precisa ser aprimorado para conseguir a recuperação a concessionária e diminuir o ônus aos consumidores de energia.
Em aderência ao previsto na Medida Provisória, a Âmbar Energia entende que são necessárias flexibilizações durante três ciclos tarifários, gerando um custo de R$ 15,8 bilhões à Conta de Consumo de Combustíveis (CCC), sendo que o valor considerado “ideal” pela área técnica é de R$ 8 bilhões.
“A Aneel calcula que, caso não se exija da futura concessionária desempenho similar ao observado em outras distribuidoras que passaram por um processo competitivo, o custo a ser rateado pelos consumidores brasileiros ao longo de 15 anos, na CCC, será de R$ 15,8 bilhões. Caso seja adotada flexibilização dos parâmetros de perdas não técnicas, receitas irrecuperáveis e custos operacionais segundo a metodologia sugerida pela Aneel para a concessão, o impacto na CCC seria reduzido para R$ 8,04 bilhões”, diz a autarquia.
A Aneel também prevê que a Âmbar submeta à agência um plano de ação para redução estrutural dos custos da CCC em um ano. A estratégia deve incluir ações para redução de furtos e da inadimplência, modernização dos serviços, interligação de sistemas isolados e redução do consumo de termelétricas.
Com relação à dívida, a Âmbar Energia pretendem realizar a assunção imediata dos créditos pertencentes a Eletrobras, a conversão de tais créditos em capital social da Amazonas e readequação da estrutura de capital da empresa, por meio da redução do seu capital social da empresa, resultante da absorção do prejuízo acumulado e, como resultado, a adequação da alavancagem da empresa a patamar moderado e compatível com a capacidade de recuperação e de remuneração dos investimentos feitos na concessão.
Em sua análise, a área técnica da Aneel aponta que a modelagem financeira encaminhada indica a conversão de R$ 10 bilhões da dívida existente em aporte de capital ainda em 2024, o que equacionaria o problema de endividamento existente, permitindo, inclusive, a exclusão do cadastro de inadimplência atual.
Conversão de contratos
A segunda consulta pública, aberta de 4 a 11 de setembro de 2024, busca colher subsídios e informações adicionais para a conversão dos contratos originais em Contratos de Energia de Reserva (CER), que tem a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) como entidade responsável pela celebração dos contratos.
A MP estabelece que os contratos de compra e venda de energia elétrica relativos às distribuidoras lastreados por usinas termelétricas cujas despesas com a infraestrutura de transporte dutoviário de gás natural sejam reembolsáveis pela CCC podem ser convertidos em CER, a critério da parte vendedora.
Na NT, a Superintendência de Regulação dos Serviços de Geração e do Mercado de Energia Elétrica (SGM) da Aneel propõe uma minuta de CER que preveja que a CCC mantenha as despesas atuais (reservas de capacidade de transporte e consumo); e que a Conta de Energia de Reserva (Coner) assuma o custo fixo e o CVU (que contém a molécula do gás).
A conversão do contrato pode solucionar um problema da Amazonas Energia, que deveria assinar novos contratos de compra de energia com termelétricas da Eletrobras nos sistemas isolados, que vencem em 2025, com nova vigência até 2030. A distribuidora, contudo, não tinha condições de assinar os aditivos porque já está sobrecontratada, e isso degradaria ainda mais sua já frágil situação econômico-financeira.
Essas usinas estão dentro do pacote vendido pela Eletrobras à Âmbar Energia, do grupo J&F, no início desta semana. Agora, os contratos poderão ser transformados em energia de reserva, custeada por encargo pago por todos os consumidores. Na prática, não vai representar um aumento do subsídio pago pelos demais consumidores, já que quem paga a CCC também paga o encargo de energia de reserva. Mas o dinheiro irá direto para a geradora, enquanto hoje a CCC é paga à distribuidora, que depois faz o repasse à geradora – e a Amazonas não vem fazendo esses pagamentos. Como a energia de reserva não é alocada no portfólio da distribuidora, a empresa não fica mais sobrecontratada.