Terminal eletrificado da Vast em parceria com Wilson Sons, no Porto do Açu | Foto: divulgação Vast
Terminal eletrificado da Vast em parceria com Wilson Sons, no Porto do Açu | Foto: divulgação Vast

Shore power

Eletricidade para abastecer navios já aumenta demanda no Porto do Açu

Shore power, que será obrigatório na Europa a partir de 2030, já é aplicado em projeto da Vast e Wilson Sons e está em estudo pela Petrobras

Terminal eletrificado da Vast em parceria com Wilson Sons, no Porto do Açu | Foto: divulgação Vast
Terminal eletrificado da Vast em parceria com Wilson Sons, no Porto do Açu | Foto: divulgação Vast

Em maio deste ano, a Wilson Sons e a Vast, empresa do grupo Prumo que opera no Porto do Açu, inauguraram um atracadouro eletrificado que possibilita o abastecimento de navios com a eletricidade da terra (shore power ou onshore power supply, no termo em inglês).

Tradicionalmente, as embarcações queimam combustível ininterruptamente para consumo próprio, mesmo quando estão atracadas. No shore power, quando as embarcações estão atracadas, usam eletricidade do grid, em vez de gerar energia pela queima de combustíveis fósseis. A propulsão continua sendo feita com combustível tradicional.

Shore power no Porto de Hamburgo, na Alemanha. | Crédito: Porto de Hamburgo

Desde o início da operação, o atracadouro eletrificado da Vast já levou a um aumento superior a 4% na compra de energia pelo porto, e a carga pode aumentar na medida em que mais e maiores embarcações receberem a energia da terra quando estiverem atracadas.

O abastecimento é feito com energia renovável certificada. Assim, em termos de emissões, a Vast calcula uma redução de 7,6% em suas emissões de escopo 3 – já que a Wilson Sons é uma parceira da Vast, que não tem controle total sobre o abastecimento e atividades das embarcações. Já a Wilson Sons projeta uma redução de 20% em suas emissões de escopo 1 no terminal.

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Além de reduzir emissões, o shore power representa menor custo operacional, uma vez que substitui o uso de diesel marítimo, mais caro, por eletricidade. Segundo a Vast, a estimativa é de uma economia de dez litros de diesel marítimo por hora nas embarcações atracadas.

O projeto começou com embarcações do tipo rebocadores, e o terminal tem capacidade para atracar até quatro destes barcos simultaneamente. Ainda neste ano, o projeto deve aumentar, abastecendo também outros tipos de barcos de apoio com eletricidade da costa. Estes barcos são de menor porte, e por isso a Vast calcula um adicional de 1% a 2% na redução de emissões já conquistada.

Terminal eletrificado da Vast em parceria com Wilson Sons, no Porto do Açu | Foto: divulgação Vast

Padronização é desafio, mas frota própria facilitou projeto

O shore power é uma tendência global para a descarbonização da navegação – a União Europeia, por exemplo, estabeleceu que a partir de 2030 todas as embarcações acima de 5 mil toneladas deverão usar a energia da terra nos portos do bloco. Entre os principais desafios para a implementação do shore power, está o estabelecimento de uma padronização para navios que circulam entre portos e regiões diferentes.

“Não existe hoje um padrão adotado internacional que tenha efetividade global, mas já existem regulamentos que determinam como deve ser a conexão de shore power”, explicou à MegaWhat o gerente de Desenvolvimento de Negócios da DNV Jonas Mattos. O executivo participou de um painel sobre descarbonização do setor na NavalShore, no Rio de Janeiro.

Na Vast, que opera o terminal de petróleo do Porto do Açu, a utilização de uma frota própria facilitou o projeto. “Nós estamos falando do terminal que em 2023 concentrou quase 40% de todas as operações de exportação de petróleo do Brasil”, contextualiza o diretor de sustentabilidade da Vast, Adriano Truffi Lima.

Por conta do porte das atividades, o terminal conta com uma frota de apoio dedicada, e o fato de algumas embarcações ficarem fixas no terminal (quando não estão atendendo aos clientes do porto) eliminou o gargalo da padronização. São estes os barcos que já contam com shore power e que serão em breve plugados na energia do grid quando estiverem atracados.

A expansão da iniciativa para todos os navios que circulam pelo Açu, entretanto, ainda não é evidente. Apesar de ser viável tecnicamente, a replicação do modelo implica em custos que podem não ser justificáveis para um uso menos frequente quanto o de uma frota dedicada. “Os barcos não estão adaptados e podem vir a consumir pouca energia. Estamos avançando conforme os barcos têm uma demanda mais clara para essa quantidade de energia”, explica o diretor de Administração Portuária da Porto do Açu Operações, Vinicius Patel.

Segundo Patel, a estrutura para eletrificação dos portos não é tão complexa, embora possa ser demorada. A conexão ao grid pode ter um prazo mais longo para novas estruturas. Já para áreas que estejam conectadas, basta fazer a revisão da demanda e conectar a subestação.

Shore power no Porto de Hamburgo | Foto: Porto de Hamburgo

No projeto da Vast e da Wilson Sons, os requisitos estruturais também incluíram a instalação de quadros de medição para a faturas individuais, pois a cobrança da energia consumida pelos barcos acontece por meio de notas de débito. “A Vast não cobra pela oferta de energia, não é um negócio da Vast ser comercializadora”, explica Adriano Truffi Lima.

Na Petrobras, estimativa inicial de redução é de 10 mil toneladas de CO2 equivalente

Em 2021, a Petrobras realizou um estudo preliminar de aplicação de shore power em algumas embarcações de apoio operando nos terminais de Macaé e Porto do Açu. O levantamento apontou potencial de redução de cerca de 10 mil tCO2e por ano – a medida inclui o gás carbônico e outros gases de efeito estufa.

“No entanto, com o aprofundamento dos estudos e abrangência para outros portos e terminais e tipos de embarcações, há uma expectativa de que o potencial de mitigação seja maior, e que estes valores irão variar de acordo com o tempo de operação, o tipo de embarcação, e o porto ou terminal”, explicou em nota a Petrobras.

A companhia avalia aplicar o shore power para embarcações de apoio offshore, rebocadores, navios tanques de petróleo e derivados. Segundo a estatal, os estudos avaliam a aplicação em embarcações próprias e afretadas, e os contratos recentes de embarcações de apoio já incluem a possibilidade de shore power.

Inicialmente, a companhia deve aplicar o abastecimento eletrificado apenas em seus terminais próprios, mas a companhia planeja, no futuro, realizar o mapeamento da infraestrutura existente e necessidade de adequação em outros portos e terminais.

Eletrificação de embarcações

Após o uso de energia elétrica para abastecer embarcações atracadas, a próxima discussão deve ser a eletrificação dos próprios barcos. “Como são barcos que fazem pequenas viagens e sem grandes volumes de carga, o uso de baterias e motores elétricos é uma realidade não muito distante”, avalia Adriano Truffi Lima, da Vast.

No Brasil, a Equinor, em colaboração com a CBO e a Wärtsilä, já trabalham com a hibridização de embarcações, que alternam a propulsão entre bateria e combustível tradicional.

Em operação no Brasil, barco de apoio híbrido utiliza baterias e diesel, com potencial de diminuir até 30% das emissões.  Embarcação é fruto de parceria entre Equinor, CBO e Wärtsilä.
Em operação no Brasil, barco de apoio híbrido utiliza baterias e diesel, com potencial de diminuir até 30% das emissões. Embarcação é fruto de parceria entre Equinor, CBO e Wärtsilä. | Foto: divulgação/CBO

Lima acredita que até o fim da década podem surgir as primeiras embarcações 100% elétricas. E então os terminais portuários precisarão se adaptar para oferecer carregamento rápido e seguro das baterias – que, geralmente, são produzidas com material inflamável. “Num terminal de petróleo isso tem que ser olhado com muita clareza”, diz.

Biocombustíveis e transporte de outras fontes

Outra rota para a descarbonização naval está nos biocombustíveis. Os portos também são uma estrutura fundamental para a circulação novas fontes de energia no contexto da transição energética, como amônia e hidrogênio de baixo carbono.

Tanto o shore power, quanto o abastecimento por biocombustíveis ou transporte de outras fontes, exigem adaptações na infraestrutura portuária. “Existe uma preocupação com a infraestrutura, que não está andando na velocidade que a regulamentação exige e que a tecnologia já tem”, avalia Jonas Mattos, da DNV. Segundo ele, a conexão a redes de energia é mais simples do que o manejo de combustíveis mais inflamáveis, como hidrogênio ou amônia.

No Brasil, a Vast prepara um terminal de líquidos, com estrutura para armazenagem e despacho de combustíveis. Segundo Lima, inicialmente, o terminal trabalhará com combustíveis e óleos convencionais, mas o objetivo é incluir operações de mistura de biocombustíveis. O terminal deve começar a ser construído em 2024 com previsão de inauguração em 18 meses após início das obras.

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