A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) negou o pedido de suspensão da transferência das usinas térmicas Mauá III e Aparecida, da Eletrobras, para a Âmbar Energia, do grupo J&F, protocolado pela Cigás, distribuidora de gás do Amazonas que tem o empresário Carlos Suarez como um dos principais acionistas.
Conforme os autos, depois de a autarquia aprovar a transferência em 23 janeiro deste ano, a Cigás recorreu da decisão em 6 de fevereiro usando como justificativa a liminar assinada pelo desembargador Ney Bello, na qual acatava a alegação da empresa de que deveria ser consultada antes da transferência dos contratos, já que é a responsável por repassar o gás até as termelétricas que abastecem o estado do Amazonas. Posteriormente, a decisão foi derrubada por outro desembargador.
“A concretização da transferência dos contratos termelétricos originais […] para a Âmbar, somente poderá ser feita após, ou, ao menos, concomitantemente à resolução de todas as contingências (existentes e prováveis), garantindo-se que custos advindos da relação contratual anterior à conversão dos contratos não sejam imputados aos consumidores brasileiros, mas mantidos e segregados sob a responsabilidade e titularidade dos atores contratuais que protagonizaram as diversas ações”, argumentou a Cigás.
Entretanto, no entendimento da Aneel, a transferência só poderia ser suspensa caso houvesse a “verossimilhança das alegações apresentadas” – juízo de probabilidade que se baseia em evidências indiciárias – ou o receio de dano irreparável ou de difícil reparação, o que “não se encontra presente na argumentação da cigás”.
Segundo a agência, a transferência de titularidade das usinas “não ofende qualquer comando judicial exarado em face da autarquia”. Além disso, a Aneel diz não ter conhecimento e que não foi intimada quanto a decisão liminar alegadamente proferida pelo Tribunal de Contas do Estado do Amazonas, sendo que “nem poderia ser diferente, haja vista que tal Tribunal Estadual não tem jurisdição sobre a Aneel, uma autarquia federal”.
“Entende-se, portanto, que, ao menos neste exame superficial, o despacho deve ser prestigiado, pois não padece de aparente vício de ilegalidade, haja vista que proferido por autoridade competente, não haver evidente violação à norma e a sua finalidade, foram observadas as formalidades legais, as garantias da ampla defesa e do contraditório, bem como apresentar motivação fática e jurídica adequada e suficiente. Dessa maneira, ausentes os requisitos tanto da aparência do bom direito quanto do perigo na demora, deve-se indeferir o efeito suspensivo pleiteado”, diz trecho da decisão do diretor-geral da agência, Sandoval Feitosa.
Compra da Âmbar
A Âmbar Energia fechou em junho acordo para compra de termelétricas da Eletrobras que fornecem energia em Sistemas Isolados no Norte do país.
Logo depois, foi editada pelo governo a Medida Provisória (MP) 1.232, que viabilizou a conversão dos contratos da Amazonas Energia com essas mesmas usinas, reduzindo substancialmente os riscos, já que a distribuidora de energia está inadimplente em muitos contratos, mesmo recebendo recursos da Conta de Consumo de Combustíveis (CCC) para custear a energia. Com a mudança para contratos de reserva, o pagamento será feito diretamente às termelétricas, sem passar pela distribuidora.
A MP em questão foi editada com a finalidade de viabilizar a transferência de controle societário da Amazonas Energia, negociada com a Âmbar. O processo, porém, tem sido conturbado. A assinatura da transferência do contrato aconteceu nos últimos minutos de vigência da MP antes desta perder eficácia, porque não foi aprovada pelo Legislativo para ser convertida em lei.
Até o momento, a transferência do controle da distribuidora não foi concluída, porque a Aneel autorizou o negócio sob júdice, e a Âmbar entende que não tem segurança para assumir a empresa e realizar os investimentos com os quais se comprometeu. O prazo para a conclusão da transferência terminaria em 31 de dezembro, mas foi postergado também por força de decisão judicial na primeira instância.
Cigás entra no processo
Em paralelo, a Cigás entrou com a ação alegando que deveria ser consultada antes da transferência dos contratos, já que é a empresa responsável por repassar o gás até às termelétricas da região. A distribuidora de gás é controlada pelo estado do Amazonas, e tem Carlos Suarez, fundador da OAS, como maior sócio privado.
Na petição, a Cigas alegou que a conversão dos contratos repassaria aos consumidores do país, por meio da CCC, um custo de R$ 16 bilhões em suas contas de energia. “E tudo isso em um provimento jurisdicional de urgência, precário e raso”, diz a inicial da Cigás, se referindo à Conta de Consumo de Combustíveis (CCC), que subsidia os CCEARs.
Os CER, por sua vez, são pagos por encargo por todos os consumidores. A conversão foi pensada para reduzir os riscos de inadimplência e a sobrecontratação da Amazonas Energia, mas a distribuidora de gás afirmou que converter contratos iria “impactar os compromissos assumidos nos contratos de fornecimento de gás para geração de energia termelétrica”, o que pode gerar “repercussões catastróficas para a operação da Cigás”.
Segundo a Âmbar, porém, a aquisição das usinas da Eletrobras envolveu apenas os ativos, sem caixa e sem dívida. Por isso, a transação “não afeta qualquer alegado direito da Cigás”, nem as condições e riscos de seus negócios.
“Esta nova tentativa de Suarez de extrair benefícios de um negócio que não lhe diz respeito deve ter o mesmo destino de seus ataques anteriores contra os interesses da Âmbar: o fracasso”, concluiu a empresa dos irmãos Batista.
Terceira derrota do ano para Cigás
Em janeiro, o desembargador federal João Batista Moreira, presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), derrubou a liminar concedida que suspendia a conversão dos Contratos de Compra de Energia no Mercado Regulado (CCEARs) da Amazonas Energia por Contratos de Energia de Reserva (CER) e, na prática, inviabilizava a operação da distribuidora de energia, assim como a transferência de seu controle, hoje da Oliveira Energia, para a Âmbar, da holding J&F.
Dias depois, a Juíza Jaiza Maria Pinto Fraxe, da 1ª Vara Federal Cível da Sessão Judiciária do Amazonas, indeferiu os recursos da Aneel e da Cigás contra a decisão que prorrogou em 60 dias o prazo para cumprimento da venda da Amazonas Energia para a Âmbar.
A magistrada ainda determinou que a Cigás pague uma multa de litigância de má-fé após a empresa afirmar que foi excluída do processo e deveria ter sido consultada antes da transferência dos contratos de compra de energia.
Segundo decisão da juíza, a Cigás foi regularmente intimada acerca da decisão anterior sobre a transferência e teve prazo de cinco dias úteis para se manifestar, porém, entrou com recurso depois.