
O avanço da inteligência artificial demanda altos investimentos em energia, data centers e infraestrutura, o que pode ampliar as diferenças entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. Além disso, o uso ultra intensivo de energia por parte dos data centers requer o uso de energia limpa, como forma de reduzir a emissão de gases de efeito estufa. O tema foi discutido no evento Construindo Coalizões para a Ação Climática no Brics Expandido, que aconteceu em 3 de julho no Rio de Janeiro, no painel “Transformação digital para o desenvolvimento sustentável nos Brics”. O evento foi organizado pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI) em parceria com a Siemens Energy, com o objetivo de fomentar discussões relevantes em prol de ações efetivas antes da COP30 para que a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima seja um espaço voltado para negociações finais e implementação.
Redata e uso intensivo de energia
O governo brasileiro está preparando uma Medida Provisória (MP) para criar a Política Nacional de Data Centers (Redata), que deve oferecer isenção dos tributos federais a sistemas de data centers, em troca de contrapartidas dos investidores.
Para a diretora de Relações Institucionais da Elea Data Centers, Caroline Ranzani, ao trazer mais data centers para o Brasil, o Redata poderá desenvolver o setor no país e proporcionar mais segurança ao processamento de dados nacionais. “Mais da metade dos dados brasileiros são processados na Virgínia, nos Estados Unidos. Não é porque não temos capacidade, [é porque] não temos competitividade, preço para concorrer”, disse. Assim, a desoneração poderá facilitar o desenvolvimento deste mercado.
Entre as contrapartidas do Redata, está o uso de energia renovável, o que Ranzani vê como positivo diante da enorme quantidade de energia que os data centers consomem. “Existem previsões de que, nos próximos cinco anos, a indústria de data centers vai ser responsável por 10% do consumo de energia mundial. É muita coisa. Então, é importante falar em requisitos de sustentabilidade”, avaliou.
O Redata também deverá estabelecer a reserva de pelo menos 10% da capacidade de processamento para dados nacionais. Assim, Ranzani entende que a política deve evitar a simples “exportação de energia” na forma de processamento de dados, além de fomentar um ecossistema local de inovação. Para isso, entretanto, a especialista indica que será preciso investir na qualificação da mão-de-obra no país.
Reflexos políticos e sociais da digitalização
A diretora do Departamento de Segurança da Informação do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, Danielle Ayres, ressaltou que o salto tecnológico que a inteligência artificial já promove na sociedade deve ser ainda maior com a computação quântica. Esta potencialidade deverá ter reflexos em diversos campos, incluindo a busca de soluções para as mudanças climáticas, mas também pode ampliar as diferenças entre os países com mais ou menos acesso à tecnologia.
“O resultado de não pensar nisso como um processo também econômico e social é aumentar as distâncias entre aqueles que são mais produtores de tecnologia, os centros hegemônicos do sistema, e aqueles que vão continuar sendo periféricos e talvez menos úteis do que foram no passado. E aí, obviamente, isso vai gerar problemas de diversas esferas”, disse Ayres.
Para a especialista, outra questão fundamental é a busca por alguma padronização entre as legislações dos países. Na visão de Ayres, os países devem estabelecer critérios internos sobre a digitalização, enquanto no cenário internacional é preciso buscar referências comuns de governança, para evitar “descompassos”.
O secretário de Promoção Comercial, Ciência, Tecnologia, Inovação e Cultura do Ministério de Relações Exteriores, embaixador Laudemar Gonçalves de Aguiar Neto, destacou que as políticas públicas de digitalização e transição energética precisam de participação social, incluindo setor privado e academia. Assim, as regulações poderão ser de longo prazo e refletir projetos de Estado, e não de governos.
“Não há unanimidade, mas todos têm que trabalhar juntos, buscando uma convergência (…). Nós não vamos conseguir enfrentar as mudanças climáticas, não vamos ter cooperação internacional em inovação, e não vamos conseguir fazer a transição energética sem políticas de Estado. Políticas de governo não levam a nada”, disse Neto no painel.
Ele também destacou que o acesso à digitalização pode representar grandes avanços em regiões mais remotas, que passam a ter mais acesso a serviços como saúde digital, educação, cultura e comércio. Segundo ele, esta transformação pode mudar a vida das pessoas e torná-las mais capacitadas a influenciar os processos políticos e sociais.
Transformação digital na Índia e semelhanças com o Brasil
No painel, o diretor de Indústria de Minérios e Metais da indiana Tata Consultancy Services, Virgilio da Costa, lembrou que a Índia e o Brasil apresentam panoramas sociais parecidos, com parte da população em situação de pobreza nos ambientes urbano, rural e de floresta. Por isso, ele avalia ser importante que os países façam uma boa gestão da infraestrutura de digitalização para que os indivíduos tenham acesso a informação, saúde, segurança e serviços financeiros.
O vice-Chairman da Câmara de Comércio e Indústria dos Brics e co-fundador e presidente da Confederação de Jovens Líderes (CYL, na sigla em inglês), Sameep Shastri, destacou a potencialidade de cooperação entre os países do Brics também nos processos da transformação digital. Ele mencionou iniciativas do governo indiano, como o desenvolvimento de um meio de pagamento que atualmente é aceito em todas as nações do Brics e a promoção de comunidades digitais. Com as rápidas transformações na sociedade provocadas pela digitalização, Shastri também destacou a importância de uma educação digital para toda a população.
*Conteúdo oferecido pela Siemens Energy
