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Braskem avança em mercado livre de gás e avalia 'explorar' importação da Argentina

Braskem (Divulgação)
Braskem (Divulgação)

A Braskem concluiu a migração total do seu parque industrial de São Paulo para o mercado livre de gás natural e já se prepara para replicar o processo em outras unidades no país. A meta é atingir 1 milhão m³/dia no ambiente a partir de janeiro de 2026.

Em entrevista à MegaWhat, Gustavo Checcucci, diretor de Energia e Descarbonização Industrial , afirmou que o amadurecimento do mercado foi decisivo para a escolha, que visa aumentar a competitividade da empresa em meio a desafios globais. Migrações de outros parques industriais da companhia devem ocorrer de forma gradual.

A ação integra a estratégia de descarbonização da Braskem, que prevê investimentos de R$ 4 bilhões para atingir a meta de emissões líquidas zero (net zero) até 2050. A empresa tem estruturado diversas frentes para avaliar o papel de cada fonte energética em suas operações.

Nessa estratégia, a companhia ainda analisa, a partir de 2026, “explorar” o gás natural da Argentina via Vaca Muerta, “caso haja avanços regulatórios”. A Braskem também está prestes a fechar seu primeiro contrato de fornecimento de biometano, ainda com volume reduzido devido ao custo elevado do insumo – mesmo com os avanços do mercado.

Além disso, a petroquímica está em vias de assinar um novo contrato de compra de energia (PPA, na sigla em inglês) e segue analisando a inserção do hidrogênio verde em suas operações industriais.

São Paulo já opera no mercado livre com apoio da Voqen

A migração incluiu o Polo Petroquímico do Grande ABC, que reúne quatro unidades industriais e pode gerar uma economia de até 25%, alinhando-se também às metas ambientais da empresa. A operação contou com o apoio da Voqen, comercializadora de energia criada Braskem, e envolveu negociações com a Companhia de Gás de São Paulo (Comgás).

Braskem Polo ABC

Com a migração finalizada, a empresa chegou a operar com 700 mil m³ de gás natural, volume acima do previsto contratualmente, aproveitando oportunidades comerciais no ambiente livre.

Além de São Paulo, a Braskem obteve no ano passado autorização da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs) para migrar suas unidades do Polo Petroquímico de Triunfo. Segundo Checcucci, o processo de assinatura de 11 contratos será finalizado em 1º de agosto. Um mês depois, em 1º de setembro, será realizada a migração de um volume menor no estado da Bahia.

“Vamos aumentar nosso volume de gás no mercado livre gradativamente. Mas, tranquilamente, a partir de 1º de janeiro de 2026, teremos um volume superior a 1 milhão de m³ por dia de gás natural, o que já é bastante relevante”, afirmou o executivo.

Segundo ele, a Voqen projeta no médio prazo, a partir de 2027, que a demanda da Braskem e clientes ultrapasse os 2 milhões de m³/dia no mercado livre.

Competitividade energética e riscos no ambiente regulado

Checcucci destacou que o cenário industrial atual é cada vez mais complexo, pressionado por fatores como a volatilidade do dólar e tarifas de importação. Nesse contexto, o mercado livre de gás e energia representa uma alternativa estratégica para a redução de custos e o aumento da flexibilidade operacional.

A Voqen desempenha um papel central nesse movimento, estruturando operações em tempo real para capturar oportunidades de mercado. Checcucci acrescenta que a Braskem “não defende” contratos 100% no modelo spot para evitar exposições em cenário de uso intensivo de térmicas a gás, que podem onerar e trazer insegurança para o processo industrial. 

“A comercializadora pode operar em tempo real e capturar as oportunidades do mercado, fazendo frente à demanda industrial. Também há um ponto importante que é o risco, porque em uma situação de alta nos preços de gás, que agora é uma questão sua e não mais da distribuidora, que demanda uma inteligência de mercado. Por isso, nós buscamos equilibrar o nível de risco versus a competitividade”, disse.  

Regulação, desafios contratuais e expansão da oferta de gás

Segundo o executivo, a migração só foi possível devido ao amadurecimento regulatório e à maior oferta de gás no mercado, com a entrada de novos produtores e importadores, além da operação do projeto Rota 3, que amplia o escoamento do gás natural do pré-sal da Bacia de Santos.

No início de julho, a Braskem anunciou cerca de R$ 4,3 bilhões em investimentos no ativo que processará o gás natural da Rota 3 no Complexo de Energias Boaventura (ex-Comperj), da Petrobras. A operação ainda depende de aprovação da governança interna da empresa.

Braskem participou de cerimônia oficial promovida pela Petrobras, no Rio de Janeiro, onde foi anunciado o Transforma Rio
Braskem participou de cerimônia oficial promovida pela Petrobras, no Rio de Janeiro, onde foi anunciado o Transforma Rio

Checcucci também destacou as penalidades impostas no mercado regulado ao ultrapassar volumes contratados, o que restringe a flexibilidade operacional e reduz a competitividade.

“Com uma comercializadora, se houver subcontratação, conseguimos comprar gás rapidamente e evitar penalidades, mantendo a competitividade”, disse.

Apesar dos avanços, ele apontou a necessidade de maior padronização e harmonia entre contratos de distribuidoras, transportadoras e produtores, além da redução dos custos do insumo.

No Rio Grande do Sul e em São Paulo, por exemplo, a migração exigiu a assinatura de múltiplos contratos: de rede de distribuição, confissão de dívida, transporte e fornecimento de molécula — um processo mais simples para consumidores finais, mas que ainda é complexo para comercializadoras como a Voqen.

“Só para a Voqen foram cinco contratos adicionais: dois de molécula, dois de transporte e um de venda para a Braskem. No mercado spot, firmamos cerca de dez contratos ao longo do mês. Cada estado tem seus próprios desafios, com contratos pré-definidos para distribuição e transporte, além do Master Sales Agreement”, explicou.

Redução de custos e novas fontes para a indústria

Checcucci também chamou atenção para os custos de escoamento e para as revisões tarifárias em curso nas distribuidoras, que envolvem “aumentos expressivos de margem”, além das discussões em andamento na Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) sobre transporte de gás, que podem impulsionar o volume disponível no país e baratear o insumo.

O executivo vê avanços importantes com a operação do Rota 3, a possibilidade de importação da Argentina e com o leilão do gás da União previsto pela Medida Provisória (MP) nº 1.304, que considera estratégico para a indústria, mas que pode restringir liquidez devido a competitividade do gás com o mercado de energia.

“Minha preocupação é a necessidade do insumo no setor elétrico, pois pode haver restrição de liquidez. É essencial ter térmicas, mas que operem com gás não associado, como o GNL [gás natural liquefeito]. O gás associado, vinculado à extração de petróleo, deveria ser destinado prioritariamente à indústria”, concluiu.

Vaca Muerta, biometano e hidrogênio

O executivo esteve no último mês na Argentina e vê “potencial” no gás de Vaca Muerta para aumentar o gás no Brasil, apesar de questões regulatórias ainda pendentes.

“O mercado está evoluindo nesse sentido. Estamos, via comercializadora, tentando capturar e trazer gás para a Braskem e para clientes da Argentina. Vamos, a partir do ano que vem, explorar melhor tudo isso”, disse.

Preste a firmar o seu primeiro contrato de biometano, a Braskem vê o passo como crucial para seu processo de descarbonização depois de chegar em uma solução técnica-econômica para fazer sentido.

“O grande desafio é o quanto o próprio mercado consegue reduzir o custo. O biometano precisa ser um pouco mais competitivo. A Braskem tem todo o interesse e temos uma demanda grande por esse insumo, mas não é trivial achar um biometano que seja competitivo para as nossas operações. A  indústria já está muito desafiada sobre a lógica de competitividade”, comentou sobre o tema.

Já o hidrogênio verde “ainda é distante” e precisa ganhar competitividade, mas a empresa estuda seu uso em pequena escala, e espera, até o final do ano, avançar com assunto e, eventualmente, anunciar algo.

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