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Engie diz que avanço da GD e curtailment podem acabar com indústria de geração centralizada

Eduardo Sattamini, presidente da Engie no Brasil
Eduardo Sattamini, CEO da Engie Brasil

A Engie focará seus investimentos em transmissão de energia e em eventuais fusões e aquisições (M&A, na sigla em inglês), deixando de lado a compra de projetos greenfield. Segundo executivos da companhia, a estratégia será adotada por conta da conjuntura atual do setor elétrico, que vem sofrendo com a demora na conexão de ativos, sobreoferta de energia e cortes na geração.

No segundo trimestre do ano, as usinas eólicas e solares operadas pela empresa registraram 14% de cortes na geração sobre uma produção de 1,3 GW médios, conforme dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). As demais usinas do Sistema Interligado Nacional (SIN) registraram indisponibilidade total de 15%, segundo a Engie.

Durante teleconferência para apresentação dos resultados do período, Guilherme Ferrari, diretor de Energias Renováveis e Armazenamento, afirmou que os cortes estão “maltratando os geradores renováveis”, e que a companhia analisa formas de reduzir os impactos, incluindo ações regulatórias.

Em complemento, Eduardo Sattamini, CEO da empresa, chamou a atenção para a relação entre o avanço da geração distribuída e a sobreoferta de energia no país, que é uma das causas apontadas para os cortes na geração. Para ele, o avanço da modalidade e seu impacto no curtailment podem causar impactos na significativos na indústria de geração centralizada do país.

“A geração distribuída realmente é um grande problema para o setor elétrico e causa impactos para o desenvolvimento da capacidade de geração, para a administração da rede de distribuição e para o bolso do consumidor, além de gerar distorções e problemas para todos os agentes, exceto para aqueles que se beneficiam dela. Se a GD continuar crescendo deste jeito, o curtailment vai acabar com a indústria de geração centralizada no país e criar um nível de complexidade e um custo para a sociedade absolutamente elevado”, afirmou, ao pedir uma “contenção” da modalidade e conscientização do Congresso.

M&As e possibilidades para TAG e Jirau

Sattamini também comentou sobre a alocação de capital e a tendência de excesso de oferta de renováveis no Brasil, que deve levar a empresa a não investir em usinas renováveis greenfield no momento.

“Renováveis, eventualmente, podemos realizar investimentos através de M&A contratados, como é o caso da nossa aquisição [da hidrelétrica] da EDP, cujo fechamento financeiro devemos realizar nas próximas semanas, e continuar investindo em greenfield na parte de transmissão. Nós vamos olhar para os leilões no segundo semestre”, afirmou o executivo.

Em relação à hidrelétrica Jirau, a empresa aguarda sinalização de sua controladora para, junto aos órgãos estatutários da companhia, iniciar os estudos e a proposta para transferência da participação de 40% na Jirau Energia e de 100% na comercializadora Geramamoré Participações e Comercializadora de Energia Ltda.

Recentemente, o Ministério de Minas e Energia (MME) emitiu portaria estabelecendo novos montantes de garantia física para a usina. Segundo Sattamini, o ativo está cada vez com menos risco, mas o grupo vai se posicionar para comunicar ao mercado sobre uma possível transferência.

Questionado sobre a venda do restante da participação da TAG para fazer frente aos investimentos programados ou desalavancar o balanço, o executivo informou que é uma possibilidade, mas “não uma vontade no momento”.

“Isso vai ser feito dentro do contexto da gestão das estruturas de capital da companhia. Por enquanto, participamos como grupo com 50% do capital da TAG”, comentou.

Conservadorismo do Operador

Guilherme Ferrari, diretor de Energias Renováveis e Armazenamento, também abordou os efeitos do “conservadorismo” e da alteração de requisitos pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico, que têm causado demora para a entrada em operação comercial de ativos.

“É um primeiro desafio, uma primeira mudança que observamos, fruto do maior conservadorismo do ONS na entrada em operação de nova capacidade. Mas o grande ponto, hoje, é o atraso na obtenção da declaração de atendimento aos procedimentos de rede junto ao ONS, que está exigindo muito mais nos estudos do que exigia no passado”, disse.

Para ilustrar a questão, o diretor destacou que, no fim do segundo trimestre de 2025, 165 dos 188 aerogeradores do Conjunto Eólico Serra do Assuruá, na Bahia, estavam em operação comercial e 23 em teste, o que corresponde a 846 MW instalados e comissionados.Enquanto isso, o Conjunto Fotovoltaico Assú Sol contava com quatro das 16 centrais fotovoltaicas operando comercialmente e oito em fase de teste, totalizando 552,7 MW em operação.

De acordo com ele, os estudos exigidos para esses ativos estão em andamento e devem avançar em breve.

Participação no leilão do GSF

Ferrari também foi questionado sobre a não participação da empresa no leilão do GSF. Segundo ele, a companhia fez análise, mas “incertezas começaram a aflorar” em função de riscos regulatórios.

“Houve questionamento de um dos diretores da Aneel e do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União sobre a legalidade e adequação da taxa de desconto (WACC) fixada para o certame. Também algumas questões do próprio leilão tinham margens de interpretação”, comentou.

Venda de energia e liquidez

A quantidade de energia vendida pela Engie no período, sem considerar as operações de trading, foi de 9.290 GWh (4.254 MW médios), volume 4,8% superior ao comercializado na mesma etapa do ano anterior. Enquanto isso, o preço médio dos contratos de venda de energia, líquido dos tributos sobre a receita e das operações de trading, foi de R$ 217/MWh no período, redução de 1,6%.

De acordo com Marcos Keller, diretor de Gestão e Comercialização de Energia, o trimestre foi marcado por preços mais baixos, e a geradora tem pouca energia para venda.

“Estamos mais criteriosos em preço e focamos mais em contratos de longo prazo. Há liquidez, mas não é grande, e é principalmente para agentes como nós, que têm uma mesa de clientes robusta. Nós temos vendas para os anos de 2028 e 2029”, afirmou Keller.

Engie 2T2025

A Engie contabilizou lucro líquido ajustado de R$ 564 milhões no segundo trimestre de 2025, redução de 34% frente ao registrado na mesma fase do ano anterior.

O lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda, na sigla em inglês) ajustado fechou em R$ 1,87 bilhão, queda de 4,4%.

Por outro lado, a receita operacional líquida ficou em R$ 3,1 bilhões, alta de 10,1%, justificada, principalmente, pela evolução da receita de construção dos ativos de transmissão e pela entrada em operação de novos ativos renováveis, como o Conjunto Eólico Serra do Assuruá, com maior volume de vendas de energia no mercado livre.

Também houve crescimento de 24,3% na dívida líquida da companhia, que ficou em R$ 21,5 bilhões. Entre os destaques do período está a emissão de R$ 2,2 bilhões em debêntures verdes, a primeira operação nessa categoria pela empresa. Os recursos serão usados para modernização de ativos e ampliação da capacidade renovável.

Outros destaques da Engie

A base de clientes no mercado livre cresceu 21,7% no trimestre, e o número de unidades consumidoras aumentou 15% frente ao segundo trimestre de 2024.

Outro destaque foi a aprovação, pelo conselho de administração, da distribuição de R$ 719,2 milhões em dividendos intercalares, equivalentes a R$ 0,8814 por ação.

No momento, a Engie conta com 9.992,2 MW de capacidade instalada, operando um parque gerador de 11.702,0 MW, composto por 129 usinas, sendo 11 hidrelétricas e 118 de fontes renováveis complementares — centrais a biomassa, PCHs, eólicas e solares —, das quais 125 pertencem integralmente à companhia e quatro (as hidrelétricas Itá, Machadinho e Estreito e a usina de cogeração a biomassa Ibitiúva Bioenergética) são exploradas comercialmente por meio de parcerias com outras empresas.

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