
Executivos do setor de energia e infraestrutura defenderam acelerar a implementação de projetos de data centers e hidrogênio verde no Brasil, destacando os desafios de conexão de grandes cargas, modelos contratuais mais flexíveis e a urgência para aproveitar janelas de oportunidade para consolidar o país como polo competitivo.
Em painel durante o evento MinutoMega Talks, promovido pela MegaWhat, representantes de empresas com foco em cliente ultraeletrointensivos ressaltaram que os data centers ganharam prioridade frente ao hidrogênio verde, mas alertaram que o Brasil precisa avançar em infraestrutura, contratos e políticas públicas para não perder espaço em mercados estratégicos como o de combustíveis verdes.
Data centers ultrapassaram o hidrogênio verde
A Casa dos Ventos tem avançado com o projeto de data center no município de Caucaia, no Ceará, embora o local tenha sido inicialmente planejado para receber um empreendimento de hidrogênio verde. Segundo Fernando Elias, diretor de Relações Institucionais da Casa dos Ventos, as discussões sobre a instalação começaram em 2021, com foco no combustível, mas a crescente demanda por centros de dados levou a companhia a mudar a estratégia.
O data center será desenvolvido em duas fases e já possui Contrato de Uso do Sistema de Transmissão (Cust) assinado, com garantia de R$ 300 milhões aportada para o acesso. Paralelamente, a companhia mantém o projeto de hidrogênio verde, que deve levar mais tempo para amadurecer e já conta com um offtaker.
“O data center é mais ágil e a demanda, impulsionada pela onda da inteligência artificial, cresceu muito rápido. Já o setor de hidrogênio ainda não dispõe de recursos e só deve avançar em mercados que ofereçam incentivos. Mas existem desafios para a conexão de cargas de grande porte como essas”, afirmou Elias.
A Renova Energia também assinou recentemente Contrato de Uso do Sistema de Transmissão e tem 97,8 MW esperando para iniciar a energização dos primeiros contêineres em um prazo estimado de 40 dias. A empresa decidiu aproveitar a infraestrutura do Complexo Eólico Alto Sertão III, na Bahia, para acelerar o processo e desenvolver sua própria “solução tecnológica” voltada a grandes consumidores de energia elétrica.
“Com essa solução, o ONS [Operador Nacional do Sistema Elétrico] não vai reconhecer a conexão de toda a geração do parque, porque boa parte dela será destinada ao consumo do complexo de data centers voltado ao processamento de blockchain. Ontem, fechamos o contrato de conectividade, que foi a etapa mais trabalhosa”, explicou Sandro Yamamoto, diretor de Novos Negócios, Regulação e Relações Institucionais da Renova Energia.
Yamamoto destacou ainda as falas de Alexandre Zucarato, diretor de Planejamento do ONS, em um dos painéis do evento, sobre o aumento dos cortes de geração. Para ele, a solução desenvolvida pela Renova pode ser replicada por outras companhias, mas exige inteligência na elaboração dos contratos, que são mais curtos que os convencionais e permitem maior flexibilidade, disponibilidade e até resposta da demanda.
O executivo da Renova Energia também comentou as dificuldades em explicar modelos contratuais, precificação e questões tributárias do Brasil a clientes do setor de data centers, majoritariamente internacionais.
Atraso do Brasil
Do ponto de vista do estruturador de projetos, Mauro Andrade, diretor de Desenvolvimento de Negócios da Prumo, destacou que o Porto do Açu busca atrair empreendimentos em data centers e combustíveis, como e-metanol, amônia verde e SAF. Localizado no Rio de Janeiro, o porto abriga as termelétricas GNA I e II, que somam 3 GW de capacidade instalada.
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“Pela localização no Sudeste, não vemos, no curto prazo, problemas de limitação. Pelo contrário, enxergamos grande atratividade no local. Atualmente, avaliamos três pedidos de parceria em projetos de data center, e-metanol e amônia verde e esperamos anunciar até o fim deste ano o investimento em um deles”, afirmou Andrade.
O executivo também ressaltou que o Brasil ainda não possui nenhum projeto de amônia verde em operação. Ele lembrou que, recentemente, a Alemanha anunciou a compra de seu primeiro lote de amônia verde, com a Índia como fornecedora, ao preço de US$ 570 por tonelada.
“Seja qual for o caminho escolhido, é fundamental agir rápido para não perdermos espaço. Esse trem vai deixar a estação. Hoje, amônia verde, e-metanol e SAF são nichos de mercado e já existem projetos comercialmente viáveis, sem subsídios. Esse mercado precisa ser ocupado”, concluiu Andrade.
Fernando Elias, da Casa dos Ventos, também destacou a importância de aproveitar a janela de oportunidade do hidrogênio verde e mencionou que o governo tem estruturado uma solução para viabilizar a conexão de eletrointensivos a partir de 2029.
MP das ZPEs
Em relação à Medida Provisória 1.307/2025, Fernando Elias destacou que a proposta amplia os benefícios das Zonas de Processamento de Exportação (ZPEs) para empresas de serviços, embora não seja direcionada especificamente a data centers. Sobre a obrigatoriedade de uso de fontes renováveis prevista na MP, ele avaliou como uma contrapartida para esses empreendimentos.
“Eles não demandam capital humano em sua operação, porque são essencialmente computadores. A contrapartida prevista na MP é o investimento em energia adicional, já que a cada gigawatt de data center instalado são cerca de R$ 12 bilhões em investimentos em novas fontes, o que gera emprego”, afirmou Elias.
Para ele, o Plano Nacional de Data Centers (Redata) continua sendo necessário devido aos benefícios que pode trazer a empreendimento fora das ZPEs. A proposta já foi anunciada pelo governo, mas ainda não publicada.