Coluna Abragel

Sistemas de Água de Uso Múltiplo com Energia Hidrelétrica - PCHS

Daniel Araujo Carneiro. MegaWhat (Divulgação)
Daniel Araujo Carneiro. MegaWhat (Divulgação)

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**Por: Daniel Araujo Carneiro

No atual cenário mundial de mudanças climáticas, a gestão de recursos hídricos constitui quesito fundamental para o desenvolvimento equilibrado e para a preservação do meio ambiente. Um dos princípios de gestão das águas é o seu uso múltiplo, evitando a escassez e a poluição dos cursos de água, assegurando, assim, sua preservação para as futuras gerações.  

Os sistemas de água de uso múltiplo fornecem água para consumo doméstico e atividades produtivas, como irrigação, pecuária e pequenos negócios. Sua flexibilidade é ideal para comunidades rurais, promovendo desenvolvimento sustentável, melhorando a qualidade de vida e criando oportunidades econômicas. 

A energia hidrelétrica, fonte renovável relevante e com baixos custos operacionais integra-se perfeitamente a esses sistemas de uso múltiplo, pois fornece energia limpa e confiável, impulsionando o desenvolvimento rural sustentável. 

A combinação de pequenas usinas hidrelétricas com sistemas multifuncionais, embora ainda limitada, apresenta potencial significativo, como demonstrado pela Suíça. Diretrizes do país destacam a viabilidade dessa integração, que pode servir de modelo para beneficiar regiões em desenvolvimento, ao favorecer a eletrificação rural, irrigação e abastecimento de água potável. 

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Sistemas hidroagrícolas oferecem grande potencial para a geração de energia em pequena escala, com aplicações que incluem operação de mini moinhos, secagem agrícola e fornecimento de energia para centros comunitários. 

Os benefícios da integração incluem diversificação de renda, com a venda de energia, segurança energética ao reduzir a dependência de fontes instáveis, sustentabilidade ambiental com a redução de emissões de carbono e, primordialmente, o impulso ao desenvolvimento local, porque estimula atividades produtivas e crescimento econômico. 

Para o sucesso desses sistemas de água de uso múltiplo com energia hidrelétrica, é essencial avaliar as características locais, envolver a comunidade no planejamento e garantir distribuição equitativa dos benefícios, promovendo a sustentabilidade a longo prazo. 

Reservatórios hidrelétricos multiuso enfrentam o desafio de equilibrar as demandas de usuários concorrentes. O conceito compartilhado, SHARE1, propõe princípios essenciais para a gestão sustentável desses sistemas, orientando desde o planejamento até a operação. 

Os princípios incluem: visão compartilhada, uso conjunto dos recursos, divisão de responsabilidades, direitos e riscos compartilhados, além de custos e benefícios equitativos. Esse compartilhamento entre stakeholders é fundamental para o sucesso de reservatórios hidrelétricos multiuso. 

Dados econômicos e ferramentas financeiras inovadoras são essenciais para um compartilhamento justo e eficiente dos benefícios entre usuários de água. Um desafio central é a falta de reconhecimento e mensuração monetária de muitos benefícios adicionais gerados pelos reservatórios hidrelétricos. Atribuir valor econômico a esses benefícios facilita negociações entre usuários, preenche a lacuna entre viabilidade financeira e econômica e ajuda a encontrar soluções mais eficientes para atrair investimentos. 

Embora alguns usos adicionais dos reservatórios não sejam financeiramente atrativos no curto prazo, eles podem gerar benefícios equitativos de longo prazo que não aparecem na análise financeira, além de criar renda marginal e incrementar o resultado final de um projeto. Avaliar o valor econômico de todos os serviços é crucial tanto para investidores quanto para promover o diálogo entre partes interessadas, permitindo uma estimativa coletiva do valor da água e da energia. 

Mecanismos financeiros inovadores são fundamentais para superar a disparidade entre viabilidade financeira e econômica, especialmente devido aos altos custos iniciais de infraestrutura hidrelétrica. É necessário desenvolver estratégias de longo prazo, garantir fontes de financiamento estáveis e protegê-las de restrições de curto prazo. 

Nos países em desenvolvimento, bancos de desenvolvimento bilaterais ou multilaterais desempenham um papel vital, oferecendo financiamento acessível a longo prazo e atraindo outros investidores. Fundos de pensão, com suas perspectivas de longo prazo, também podem mobilizar capitais privados para projetos de infraestrutura sustentável, como barragens hidrelétricas multiuso. 

O engajamento das partes interessadas é essencial para garantir a sustentabilidade e eficiência na gestão de reservatórios multiuso. Identificar, desde o início, os grupos que podem ser impactados, promovendo sua participação voluntária e ativa no diálogo assegura maior eficiência e legitimidade ao processo. Para isso, as partes precisam compreender que seu envolvimento pode influenciar decisões e contribuir para gerar resultados melhores do que os seriam alcançados sem sua participação. 

Compreender os interesses e dinâmicas de poder entre os grupos é crucial, pois muitas partes podem não conhecer ou entender plenamente as perspectivas umas das outras. Conscientizá-las sobre essas diferenças e promover liderança comunitária são fatores fundamentais para o sucesso. Princípios como equidade, transparência e responsabilidade devem guiar as soluções propostas. 

Os diferentes pontos de vista das partes interessadas geram prioridades e desafios variados, tornando necessária a coordenação para gerenciar os usos múltiplos da água de forma eficiente. Formuladores de políticas devem fortalecer o diálogo com todos os envolvidos, promovendo entendimento mútuo, transparência e comunicação eficaz para informar decisões. 

Além disso, é essencial criar um ambiente propício para o engajamento orientado a resultados, incorporando as contribuições das partes interessadas ao processo decisório. A acessibilidade e qualidade das informações, muitas vezes desiguais entre os níveis local e estadual, devem ser aprimoradas, tornando os dados mais disponíveis, compreensíveis e úteis. 

Como exemplo internacional, a bacia dos rios Durance–Verdon, no sul da França, destaca-se pela gestão integrada de seus recursos hídricos, fundamentais para energia renovável, abastecimento de água e desenvolvimento territorial. A EDF, responsável pela gestão dos reservatórios, coordena ações com todas as partes interessadas para equilibrar demandas e garantir segurança hídrica e ambiental. 

Frente aos desafios climáticos e à evolução demográfica e socioeconômica, a região desenvolveu estratégias como o projeto R2D2 205022, acordos de economia de água e metodologias de criação de valor. Esse modelo colaborativo é um exemplo de gestão sustentável da água diante de desafios climáticos e sociais, sustentado por infraestruturas robustas e parcerias eficazes. 

As mudanças climáticas estão intensificando eventos climáticos extremos, como secas e inundações, com graves consequências humanas, econômicas e ambientais. 

Nos últimos 20 anos, 1,43 bilhão de pessoas sofreram com secas, que reduziram em até 6% o crescimento econômico em alguns países. Já as inundações afetaram 1,65 bilhão de pessoas, com projeções indicando mais 180 milhões de afetados até 2030. 

O armazenamento de água é essencial para enfrentar esses desafios, pois contribui para a segurança hídrica, energética e ambiental. Ele não apenas melhora a disponibilidade de água em períodos de escassez, como também mitiga impactos de inundações e regula fluxos para setores como energia e transporte. Além disso, tecnologias como o sistema de armazenamento por bombeamento podem fornecer energia limpa e oferecer maior estabilidade ao sistema elétrico, apoiando a transição para uma economia de baixo carbono. 

A crescente demanda por água, impulsionada pelo aumento populacional, contrasta com a diminuição do armazenamento natural, causada pelo derretimento de geleiras e degradação de ecossistemas. Paralelamente, reservatórios construídos também enfrentam desafios, como o acúmulo de sedimentos e o envelhecimento de estruturas, agravando a lacuna global entre oferta e demanda por armazenamento hídrico, essencial para garantir a resiliência frente às mudanças climáticas e a segurança de recursos para as futuras gerações. 

Uma gestão integrada é fundamental para superar os desafios hídricos. As principais ações incluem: preservar aquíferos, pântanos e geleiras, adotar ferramentas de tomada de decisão em cenários de incertezas e implementar métodos de gestão integrados. Além disso, é crucial envolver diferentes atores na formulação, gerenciamento e financiamentos em soluções eficazes, reavaliar e modernizar infraestruturas existentes, investir em novas tecnologias e fortalecer a governança e a eficiência na gestão hídrica. 

Para enfrentar os impactos das mudanças climáticas, é urgente adotar estratégias integradas e sustentáveis para o armazenamento de água.  

A combinação de proteção de recursos naturais, planejamento inovador e colaboração pode garantir soluções resilientes para as gerações futuras. 

Por fim, o fortalecimento de parcerias e a mobilização de recursos permanecem fundamentais para alcançar uma gestão eficaz e integrada dos reservatórios multiuso, ampliando os benefícios para sociedade e meio ambiente. 


  1. Compartilhando os usos da água de reservatórios hidrelétricos multiuso: o conceito SHARE 7º Fórum Mundial da Água, Daegu, República da Coreia (abril de 2015), p. 130 ↩︎
  2. O programa R2D2 2050 é uma parceria que avalia os impactos das mudanças climáticas na água, biodiversidade e usos na bacia Durance–Verdon até 2050. O projeto envolveu partes interessadas na co-construção de cenários de demanda futura e na disseminação dos resultados, promovendo engajamento e apropriação das descobertas. ↩︎

** Daniel Araújo Carneiro é diretor da DAC Energia