A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) rescindiu os Contratos de Comercialização de Energia Elétrica no Ambiente Regulado por disponibilidade (CCEAR-D) da UTE Palmeiras de Goiás, firmados no âmbito do leilão de energia nova A-5 de 2006, e determinou à Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) que calcule os valores de multa por rescisão contratual e informe às respectivas distribuidoras.
Depois dos cálculos da CCEE, as distribuidoras, contrapartes dos CCEARs da termelétrica, devem efetuar a cobrança do valor de multa e informar o eventual recebimento à agência. Posteriormente, os valores pagos pela rescisão contratual podem ser usados favor de modicidade tarifária.
Com 175,56 MW, a planta é de titularidade da Central Energética Palmeiras (Cepasa), subsidiário do grupo Bolognesi, e está localizada na cidade de Palmeiras de Goiás (GO). A usina opera à óleo diesel e tem operação autorizada até setembro de 2042.
Consagrada uma das vencedoras do certame, a usina iniciou o suprimento em janeiro de 2011, com previsão de término em 31 de dezembro de 2025. Segundo o relator do processo na Aneel, diretor Fernando Mosna, a planta descumpriu subcláusulas dos CCEARs firmados no certame, o que enseja a rescisão desses contratos, bem como a aplicação da multa a ser apurada pela CCEE.
Como a decisão de rescisão foi tomada?
Em junho de 2020, a Aneel pediu para a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) encaminhar uma lista com as usinas que apresentaram três ou mais ocorrências de indisponibilidade por três anos consecutivos durante a vigência dos CCEARs.
Depois do envio e da análise pelas áreas técnicas da autarquia, em 2022, a Aneel verificou que a UTE Palmeiras de Goiás descumpriu cláusulas dos contratos firmados no âmbito do leilão A-5, pontos que poderiam levar a rescisão desses contratos.
No argumento para recisão dos contratos, Mosna pontuou que a primeira subcláusula define os critérios de rescisões contratuais motivados por indisponibilidade e abrange, em um dos seus itens, quebras de contratos em casos de três ou mais ocorrências de indisponibilidade, na forma prevista em regulamentação da Aneel, em valores superiores aos de referência utilizados no cálculo da garantia física da usina.
“Em janeiro de 2017, o valor verificado foi mais de 20% inferior ao valor de referência, e essa taxa foi gradativamente se degradando ao longo do tempo. Em maio de 2021, a disponibilidade média foi superior a 30%”, explicou o relator.
Além disso, ele afirmou que disponibilização da potência contratada de 140 MW ficou disponível por cinco meses, somente entre abril e setembro de 2020.
“Em 2020, os montantes crescentes de disponibilidade declarados até setembro se deram sem que houvesse necessidade de despacho integral da central pelo ONS. Quando isso se tornou necessário, em outubro, a disponibilidade declarada pela Cepasa se aproximou de zero”, disse.
Na cláusula 15, que define as obrigações das partes de contrato, que devem e cumprir rigorosamente toda legislação aplicável aos seus negócios sociais e às atividades a serem desempenhadas nos termos do contrato, Mosna apontou que a UTE Palmeiras de Goiás, desde 2015, foi objeto de quatro autos de infração, da suspensão de operação comercial e oficiada frequentemente pelo descumprimento de diversos dispositivos legais e regulatórios.
Análises da autarquia
Segundo a Aneel, ao longo dos anos de funcionamento da UTE Palmeiras de Goiás, foram registradas diversas irregularidades (indisponibilidades e qualidade da operação e manutenção da usina), nas quais resultaram na aplicação de sanções.
“A falta de investimento em O&M, os sinistros e o considerável baixo desempenho da UTE Palmeiras de Goiás, [foram] constadas em várias fiscalizações, especialmente a partir de 2014, [quando] teriam sido causados pelo despacho excessivo e pelo suposto descumprimento das regras do leilão de energia de que se sagrou vencedora”, diz o relator.
Mosna diz ainda que, segundo a companhia, os custos incorridos sob esse regime de despacho contínuo e prolongado teria produzido grave desequilíbrio econômico-financeiro, “supostamente impossibilitando a realização de ajustes necessários nas instalações e na equipe de O&M”.
A situação apontada pela empresa teria prejudicado a entrega da disponibilidade contratada em níveis aceitáveis, a aquisição de unidades geradoras para substituir sinistradas e avariadas, bem como o reparo daquelas UGs desgastadas pelo excessivo número de horas em operação e que já necessitam de manutenções pesadas.
“Vale ressaltar o entendimento da Cepasa de que as não conformidades constatadas não se inseririam na seara de sua responsabilidade, pois, quando da assinatura dos CCEARs na modalidade “Disponibilidade”, supostamente não tinha como cenário o regime de despacho verificado e os elevados custos de O&M da usina a ele associados”, destacou o relator.
Defesa da empresa e rebate da Aneel
Conforme voto do relator, a Cepasa apresentou manifestação contra a rescisão, argumentando a ilegitimidade da Aneel para suscitar a quebra dos CCEARs, já que os acordos são privados e “questão exclusiva entre as partes do contrato”. Tal decisão, geraria uma inobservância ao rito contratual de rescisão, além de levar a uma competência arbitral para a decisão final sobre a rescisão.
“Tais contratos não são puramente privados, mas sim fortemente regulados e mais se assemelham a estatutos, visto que possuem o conteúdo estabelecido normativamente. Assim, se a distribuidora não suscitar a aplicação da cláusula, a Aneel tem o dever de instruir sua aplicação, haja vista seu papel na defesa do consumidor de energia elétrica e em prol da modicidade tarifária”, argumentou Mosna.
A empresa também pontuou inocorrência da hipótese de rescisão dos CCEARs, dado que o período objeto de decisão judicial não pode ser computado.
A companhia possui decisão judicial liminar que suspende a exigibilidade de cobranças de penalidades no período de setembro de 2016 a novembro de 2019, porém, Mosna ressaltou que, independentemente da eventual existência da tutela judicial, a UTE Palmeiras de Goiás descumpriu a cláusula 10ª do CCEAR também em outros períodos.
A Cepasa também diz que o despacho pelo Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) não pode ser computado como indisponibilidade contratual.
“Neste ponto, a Cepsa alega que foi considerada indevidamente pela Aneel, na análise da rescisão, indisponibilidades decorrentes do não atendimento aos despachos fora da ordem de mérito por decisão do CMSE. Entretanto, é importante esclarecer que a geração termelétrica fora da ordem de mérito de custo está prevista oficialmente pela administração pública anteriormente à contratação da UTE Palmeiras de Goiás no 3º leilão de energia nova de 2006”, rebateu Mosna.
A inaplicabilidade da cláusula 10.1 dos CCEARS, a impossibilidade de emprego de analogia para restringir direitos, a violação aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade e a inexistência de inadimplemento contratual também foram usados como argumento pela empresa.
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