Distribuição

Mercado aposta em convergência de interesses na renovação das concessões das distribuidoras

A proposta do Ministério de Minas e Energia (MME) para a prorrogação das concessões das distribuidoras que vencem nos próximos anos gerou incertezas em um primeiro momento, principalmente por conta de um debate sobre a transferência dos excedentes econômicos das empresas aos consumidores. No entanto, as linhas gerais foram bem recebidas e especialistas ouvidos pela MegaWhat apontam que há tempo para que os "pontos sensíveis" sejam revertidos para chegar a um acordo satisfatório a todas as partes.

Handshake Business Men Concept
Handshake Business Men Concept

A proposta do Ministério de Minas e Energia (MME) para a prorrogação das concessões das distribuidoras que vencem nos próximos anos gerou incertezas em um primeiro momento, principalmente por conta de um debate sobre a transferência dos excedentes econômicos das empresas aos consumidores. No entanto, as linhas gerais foram bem recebidas e especialistas ouvidos pela MegaWhat apontam que há tempo para que os “pontos sensíveis” sejam revertidos para chegar a um acordo satisfatório a todas as partes.

A nota técnica que acompanhou a abertura da consulta propõe uma metodologia para que seja verificada a existência de “excedentes econômicos”, mas deixa as premissas em aberto, o que dá margem para simulações cujos resultados variam de um extremo ao outro – de um grande excedente até mesmo a um déficit.

“A metodologia para captura de potencial excedente econômico pode levar a enganos. Nós acreditamos que o indicador proposto é muito simplista, e que o resultado da fórmula pode ser enganador. Parte dos ganhos excessivos apurados pelas distribuidoras resultam do IGP-M alto dos últimos anos, o que não deveria ser visto como algo recorrente”, diz um relatório do Itaú BBA, assinado pelos analistas Marcelo Sá, Fillipe Andrade, Luiza Candiota, Matheus Botelho Marques e Victor Cunha.

Segundo a nota técnica, a ideia envolve comparar os retornos aos acionistas estimados pela regulação tarifária e aqueles efetivamente auferidos. Uma das formas de calcular isso seria entre a relação presente do fluxo de caixa ao acionista e a remuneração regulatória do capital próprio. Os resultados encontrados seriam agregados em um “indicador de referência”, único para todas as distribuidoras, considerando os dados prévios e não projeções futuras.

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Como não foi definido um horizonte de tempo passado, as simulações (feitas) apontam para indicadores que variam muito, dependendo do histórico utilizado. “Dependendo de como o indicador for calculado, o resultado pode ser completamente diferente”, concluíram os analistas do Itaú BBA.

“O ministério está no papel dele em colocar o tema para discussão, mas a resposta para essa pergunta está associada ao modelo regulatório escolhido pelo Brasil, que é capturar os ganhos não associados da eficiência para a modicidade tarifária, e compartilhar com o consumidor os ganhos associados com a eficiência”, disse Angela Gomes, consultora de temas estratégicos da PSR.

A especialista explicou que a metodologia atual já cumpre esse papel de calcular o excedente por eficiência e compartilhar com o consumidor, mas uma parte fica com a distribuidora como incentivo para que continue investindo nos próximos anos. “Se o consumidor capturar tudo, o concessionário será desincentivado a ser mais eficiente”, disse.

O indicador proposto seria ainda menos preciso que a regulação atual, que foi aprimorada ao longo dos anos, explicou Gomes. É o caso do Fator X, que mede a produtividade das empresas, e é parametrizado para que regiões com mercado em crescimento não sejam vistas como mais eficientes que aquelas com mercados estagnados.

Para Marcos Madureira, presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), a proposta não é um problema pois o Ministério de Minas e Energia não afirmou que existe um excedente econômico, mas abriu uma proposta de avaliação. “Usando aquela metodologia, podemos falar que não existe excedente”, disse, afirmando que para fazer a conta, a entidade usou dados da própria Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

Essa será uma das contribuições da Abradee na consulta pública, que ficará aberta por 30 dias contados a partir da sua abertura, que aconteceu no dia 22 de junho.

“Hoje já temos dentro do modelo de regulação do setor mecanismos que capturam qualquer excedente, seja durante o reajuste, no Fator X, seja na revisão, com captação de ganhos de eficiência levados para a modicidade tarifária. Esse vai ser um momento de transparência em que vamos poder mostrar isso”, disse Madureira.

Fiscal e M&As

Enquanto a proposta sobre os “excedentes econômicos” não causou grandes surpresas no mercado, o mesmo não se pode dizer sobre a contrapartida resultante de excedentes do custo regulatório de capital em razão de benefícios fiscais concedidos em determinadas regiões do país, com aqueles realizados por meio das Superintendências de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e da Amazônia (Sudam).

A recepção desta proposta foi negativa, ainda mais porque a Aneel já tentou, na época do terceiro ciclo tarifário, em 2012, capturar esses ganhos para a modicidade tarifária, mas perdeu a disputa para as distribuidoras no Supremo Tribunal Federal (STF).

“Acreditamos que o item seja omitido da versão final a ser submetida ao TCU, já que não há jurisprudência que sustende incorporar isso na estrutura dos contratos”, escreveram os analistas do Itaú BBA.

Outro ponto polêmico diz respeito às penalidades por mudança no controle. A nota técnica propõe que o lucro do controlador que venda a distribuidora com a concessão renovada seja compartilhado com os consumidores.

Para Gomes, da PSR, essa exigência poderia ser um problema. “Essa parte está vaga, desse jeito não para em pé, pois ninguém vai renovar um ativo que não sabe se vai poder vender”, afirmou. Além disso, a restrição pode prejudicar que um investidor mais eficiente e capitalizado compre uma distribuidora em problemas financeiros ou operacionais, por exemplo.

Áreas de risco

A especialista da PSR sentiu falta de um tratamento a “áreas complexas” na proposta do MME, como no caso das concessões do Rio de Janeiro, Light e Enel Rio, que sofrem com um prejuízo anual na casa de R$ 800 milhões em perdas não técnicas não repassadas para a tarifa.

“Talvez aí, pegando esse gancho, poderia haver uma abertura para tratamento diferenciado das concessões do Rio. Me chama a atenção que o valor é muito alto para a gente imaginar que seja possível ter fôlego e atravessar o deserto”, disse Gomes. Para ela, um tratamento diferenciado para concessões como essas poderia ajudar a garantir os investimentos necessários, dando ainda atratividade para que os investidores queiram renovar as concessões. “O investidor precisa de algum conforto ali, de nada adianta não colocar nada e ninguém querer esse ativo, ele vai acabar com o poder concedente”, disse.

Modernização

Outro aprimoramento da regra proposta é a inclusão de elementos importantes para a abertura do mercado livre. Segundo Rodrigo Ferreira, presidente da Associação Brasileira de Comercializadores de Energia Elétrica (Abraceel), a palavra “concorrência” aparece em diversos momentos na nota técnica.

“A nota técnica também prepara o mercado para a separação de energia, que na nossa visão é um elemento muito relevante”, disse Ferreira, destacando ainda a importância dada pelo documento aos investimentos em digitalização da rede.

Para Madureira, da Abradee, essas questões, como a separação entre fio e energia, não são exclusivas das 20 distribuidoras que terão a concessão renovada nos próximos anos, e não precisam estar nos novos contratos.

A associação das distribuidoras defende que a separação entre fio e energia represente os custos que estão no sistema de distribuição, permitindo a remuneração desse serviço prestado pelas distribuidoras de forma “adequada”. “Não há necessidade de estar no contrato, os mecanismos poderiam ser feitos no ambiente regulatório. O contrato não pode ser muito restritivo”, disse.

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