Em seminário realizado pela Folha de S. Paulo nesta quinta-feira, 10 de junho, representantes de associações, governo e da Câmara dos Deputados, debateram os números que a Medida Provisória (MP) 1.031, da privatização da Eletrobras, poderá acarretar aos consumidores finais e indústria. Cada lado reforçou a base de seus cálculos e os benefícios – ou custos – aos consumidores.
Na última semana, dez associações setoriais enviaram carta ao relator da MP no Senado Federal, senador Marcos Rogério (DEM-RO) declarando que dispositivos incluídos na MP 1.031 gerariam um custo adicional de R$ 41 bilhões nas contas dos consumidores. Ontem, o Ministério de Minas e Energia (MME) rebateu o documento, apontando um desconto médio nas tarifas de 6,34% como resultado do texto em discussão. A expectativa do governo é de que a MP seja votada pelo Senado no início da próxima semana.
Paulo Pedrosa, representante de uma das associações signatárias do estudo, a Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), declarou no evento de hoje que os números apresentados pelo governo não focam no custo específico para cada uma das mudanças incorporadas.
“De forma conceitual, podemos fazer uma disputa muito grande de números e estamos preparados para ela, para comprovar”, disse Pedrosa.
Pelo Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), Sylvie D’Apote, ainda apontou que a contratação compulsória de 6 GW de térmicas a gás natural licitadas pode levar ao deslocamento de outras térmicas, de usinas de fontes renováveis no Nordeste, a não utilização de gás natural do pré-sal, e a uma perda de R$ 600 milhões de reais por ano em royalties.
Por outro lado, o relator do projeto na Câmara, deputado Elmar Nascimento (DEM-BA), declarou que os números apresentados pelas associações são uma fake news. Ele apontou ainda que as térmicas colaborarão com a situação já crítica dos reservatórios da hidrelétricas e com o uso da água apenas para geração de energia, o que “sacrifica” turismo e outros usos múltiplos dos recursos hídricos. Foi de iniciativa do deputado incluir no relatório – que acabou sendo aprovado no plenário da Câmara – novos itens não relacionados à privatização da companhia, como a questão das termelétricas.
O governo, na visão de Pedrosa, precisa fazer as comparações adequadas no estudo da MP, e não justificar os erros do passado com ajustes em novas regras, cada um olhando para um segmento específico do setor, fazendo com que sejam criadas medidas e novas MPs e projetos de lei para que cada um defenda o seu interesse.
“Não justifica se os jabutis são bons para o consumidor, mas o sinal da governança ao setor. A cada MP ou projeto de lei ocorre uma minirreforma setorial, que vai gerar instabilidade para as indústrias e levar cada um buscar ter o se próprio jabuti”, contou Pedrosa. Além da contratação compulsória de termelétricas e Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH), o texto de Elmar Nascimento determina que os recursos que serão aportados pela Eletrobras na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) depois da sua privatização serão destinados apenas aos consumidores regulados, deixando os livres de fora do benefício.
De acordo com Pedrosa, é uma ilusão achar que aumentar o custo da energia da indústria vai beneficiar os consumidores residenciais de energia. “É um equívoco entender que reduzir a tarifa do consumidor pequeno é a melhor maneira de fazer as coisas. A família brasileira consome três vezes mais energia em seus produtos do que na conta de energia que ela paga. Energia é 40% do leite, do cimento, do aço, do vidro, do frango congelado no mercado, no emprego”, criticou.
Apesar dos argumentos, o deputado disse que permanecia tranquilo com a decisão que beneficia o consumidor e que fará com que o “pobre deixe de financiar a indústria”, sendo esse o seu papel na Câmara.
“Estou muito tranquilo e falando com o senador Marcos Rogério, para que ele faça como eu fiz, discutindo ponto a ponto, sobretudo com os especialistas do Ministério de Minas e Energia. Vamos continuar a fazer isso a quatro mãos, com a nossa participação, com a tinta na caneta do senador Marcos Rogério, ouvindo o governo, o ministério da Economia e de Minas e Energia, para ratificar que as mudanças sejam feitas no Senado. Até porque, a Câmara tem a última palavra, e vamos exercer, com toda a legitimidade, o nosso poder que a gente tem nesse sentido”.
Ainda segundo Nascimento, esse será o último “cheque em branco” assinado pelo Congresso ao governo, e que permite a opinião dos parlamentares sobre a política setorial. “Nós nunca mais seremos chamados a opinar sobre a política do setor. (…) Essa é a última janela de oportunidade que a Câmara dos Deputados e o Congresso como um todo têm de se fazer enxergar, de fazer uma intervenção positiva”, concluiu.