(com Natália Bezutti)
Matéria atualizada em 24/07, às 9h57, para inclusão de Comunicado ao Mercado da Compass Gás & Energia
A recente alta do Preço da Liquidação das Diferenças (PLD) e as perspectivas incertas para os próximos meses, em meio à crise hídrica, acendeu um sinal de alerta no setor elétrico. Segundo fontes ouvidas pela MegaWhat, já há comercializadoras enfrentando problemas para honrar seus contratos, e algumas já estão notificando as contrapartes.
A Compass, da Cosan, é uma dessas comercializadoras com problemas financeiros. Fontes ouvidas pela reportagem apontam que a situação chegou em tal ponto que a empresa decidiu encerrar a atividade de trading de energia. Após a publicação da matéria pela MegaWhat, a Compass divulgou Comunicado ao Mercado confirmando que reduziu significativamente o trading de energia.
A comercializadora foi adquirida pela Cosan em 2019 com a intenção de se destacar no trading de energia, e a Compass Gás & Energia – braço que controla vários negócios, inclusive a comercialização de energia – chegou a ensaiar uma oferta pública de ações (IPO) que não avançou por condições de mercado adversas.
Procurada pela MegaWhat, a Compass Gás & Energia informou que a operação da comercializadora se mantém com “foco maior” nas operações de venda de gás e energia para clientes finais. A empresa não comentou sobre as informações de que estaria encerrando a atividade de trading.
“A empresa afirma ainda que passou por capitalização recentemente e seus acionistas avaliam continuamente alternativas de financiamento aos seus projetos, incluindo, mas não se limitando, uma possível listagem da Compass Gás & Energia por meio de uma oferta pública inicial de ações, conforme amplamente divulgado em outras ocasiões”, diz a nota enviada à reportagem.
Na noite desta sexta-feira, a empresa publicou o comunicado em que confirmou a “continuidade de suas operações com foco na venda de gás e energia para clientes finais, tendo, no entanto, reduzido substancialmente a atividade de trading direcional de energia elétrica”.
Ainda conforme o comunicado, a empresa “segue executando seu plano de negócios e investimentos, com foco no desenvolvimento do setor de gás e energia no país, reforçando sua responsabilidade com a diversificação, evolução e segurança da matriz energética brasileira”.
Neste momento, as atenções da Cosan encontram-se no processo de IPO da Raízen, cujo prazo para reserva de ações teve início na quarta-feira, 21 de julho. A Raízen também tem uma atividade de comercialização de energia, mas que opera de forma separada da Compass, voltada para negociação da energia gerada em suas próprias atividades.
Uma das fontes ouvidas pela MegaWhat, afirmou que a Compass estava contando com alguns incentivos, que não aconteceram e nem devem se concretizar no curto prazo. O IPO da Compass era previsto para 2020, mas pelas condições de mercado, a operação acabou se tornando inviável. Em entrevista coletiva realizada em março, o CFO da Cosan, Marcelo Martins, reforçou que a prioridade da empresa seria a negociação das ações da Raízen, para depois iniciar a estruturação da oferta da Compass.
No entanto, segundo apurou a reportagem, um IPO da Compass também estaria descartado, por ora, para 2022. Dessa forma, a empresa optou por encerrar suas atividades de trading, uma vez que contava com o retorno da oferta para manutenção das atividades.
Desequilíbrio no mercado
A virada de preços que aconteceu entre junho e julho deixou o mercado em alerta. Desde então, o PLD tem permanecido no teto de R$ 583,88/MWh, sendo que o preço horário muitas vezes ultrapassa esse teto de forma significativa.
Com a crise hídrica e toda a imprevisibilidade dos preços para os próximos meses, principalmente a partir de setembro, o mercado se fechou e a liquidez despencou, segundo relatos de agentes ouvidos sob condição de anonimato.
Comercializadoras que fizeram apostas erradas passaram a ter dificuldade em recompor os contratos, já que toda energia disponível no mercado está em patamares muito elevados.
Desde a semana passada, circula no mercado uma nova “lista de credores” que remete à crise enfrentada no início de 2019, quando a virada de preços pegou alguns agentes de surpresa e vários contratos foram abertos. Desta vez, as comercializadoras Brasil e Argon estão sendo apontadas como casas que potencialmente não honrarão os contratos na próxima liquidação, no início de agosto.
Fontes ouvidas pela reportagem informam que as comercializadoras começaram a notificar as contrapartes de que não conseguirão honrar com a totalidade dos contratos, mas as notificações ainda estariam sendo feitas de forma informal, por ligação e mensagem.
A lista de credores aponta para uma quantia de cerca de R$ 500 milhões, mas os agentes dizem que o rombo pode chegar a R$ 600 milhões. A principal credora, segundo as fontes, é a Delta Energia, que teria R$ 170 milhões a receber das empresas em crise.
Procurada pela reportagem, a Delta informou em nota que a Brasil e Argon estão adimplentes com a companhia. Além disso, destacou que “possui rígidos controles de riscos e que a exposição com qualquer comercializadora de energia, sem ativos de geração ou distribuição, nunca ultrapassa 20% do valor mencionado”.
Segundo a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), até o momento, não há registro de descumprimento de obrigações financeiras por agentes. A entidade informou ainda que monitora a atuação das empresas no mercado multilateral.
“A instituição segue atenta ao cenário atual, de elevação de preços, e ressalta que os agentes que identificarem alguma conduta atípica ou irregular de suas contrapartes podem reportar à CCEE via Central de Monitoramento.”