Alvo de grande parte dos investimentos da italiana Enel nos próximos anos, o Brasil deve despontar como um dos mais importantes mercados do grupo em todo o mundo, principalmente devido à sua vocação para energias renováveis e ao crescimento contínuo da demanda por energia. O grupo tem 4,7 GW em geração renovável no país, sendo quase a metade na fonte eólica, e lidera o segmento de distribuição brasileiro em números de clientes. É nesse ativo – a demanda – que está sua aposta para crescer. As novas tecnologias, como baterias, devem ter participação importante nisso, a despeito da sua falta de interesse em alternativas consideradas menos atrativas no mercado, como a eólica offshore.
O Brasil vai receber cerca de metade dos quase 10 bilhões de euros que a Enel pretende investir na América Latina até 2024. Segundo Francesco Starace, que comanda o grupo desde 2014, como o mercado brasileiro está em franco crescimento, até pela expansão demográfica da população, o país deve ganhar mais importância ao longo dos anos, com a proporção dos investimentos ficando cada vez maior.
“Alguns países vão chegar em seus limites de crescimento nos próximos três anos, e aí vão desacelerar. Não vemos esse limite no Brasil. Daqui 10 anos, o país vai representar mais de 50% dos nossos investimentos [em renováveis], por causa da dimensão do país e sua necessidade de crescimento”, disse Starace, que participou nessa quinta-feira, 14 de abril, de um evento realizado pela companhia em São Paulo.
No total, a Enel vai investir 45 bilhões de euros entre 2022 e 2024, considerando suas operações em todo o mundo. Cerca de 19 bilhões de euros serão alocados no segmento de renováveis, especialmente em países em que o grupo tem uma cadeia integrada com consumidores finais – o caso do Brasil.
Na América Latina, os investimentos previstos no período somam 9,8 bilhões de euros, e metade deles virã para o Brasil. Os recursos serão divididos entre geração renovável e gestão das redes de distribuição da companhia, que também atua em serviços e tem ganhado espaço em segmentos novos, como o de iluminação pública.
Novas tecnologias
O mote da Enel é a descarbonização, e aproveitar as oportunidades de crescimento que vêm com a transição energética. “A tecnologia tornou possível substituir economicamente a geração fóssil existente por nova geração renovável”, disse Starace, para quem “descarbonizar é a esperança”.
No evento, estavam presentes André Iasi, presidente da Estapar Estacionamentos, com quem a Enel tem uma parceria na Ecovagas, empresa de carregamento de veículos elétricos e híbridos; Dimas Covas, diretor do Instituto Butantan, que tem uma parceria de eficiência energética e instalação de painéis solares fotovoltaicos com a companhia italiana; e Ricardo Nunes (MDB-SP), prefeito de São Paulo, que assinou com a companhia um procolo de intenções para cooperação visando programas e projetos que ampliem a adoção de projetos de energia limpa no município.
“Nossas tecnologias de transição são criadoras de igualdade, e nosso esforço é descarbonizar de forma sustentável, explicando para a sociedade que há uma forma diferente de se fazer as coisas, e uma forma muito melhor. Todos podemos juntos progredir”, disse Starace.
Para o executivo, a guerra entre Rússia e Ucrânia, e suas consequências nos mercados globais de combustíveis fósseis, podem até levar a um retrocesso no curtíssimo prazo, com alguns países esgotando reservas de carvão, por exemplo, para não ficarem sem energia. “Mas em três a quatro anos vai acontecer rapidamente a mudança e a saída do gás, inclusive de países que deveriam ter feito isso antes”, afirmou. Isso vai acontecer até pela necessidade de se reduzir a dependência de determinados países, como a Rússia, que concentram grande parte dos recursos fósseis do mundo.
Baterias sim, hidrogênio talvez, offshore não
A mobilidade elétrica é um dos focos da companhia para o futuro, inclusive no Brasil, mercado na qual a Enel tem investido nos carregadores elétricos. “Os carros a bateria elétrica são mais competitivos no fim do dia, desde que você produza milhões, e não centenas”, disse. Para Starace, o Brasil seguirá essa rota, e poderá inclusive ter um papel na fabricação das baterias, devido ao porte do mercado local em comparação com o restante da América Latina. “São tecnologias completamente disponíveis para um país como o Brasil, que poderá escalar de uma forma importante”, disse.
A companhia também tem investido no desenvolvimento do hidrogênio verde, por meio de parcerias que estudam como viabilizar a tecnologia em países como Itália, Espanha, Estados Unidos e Chile. “Não sei se isso vai acontecer, acho que há uma boa chance, mas pode levar anos”, disse.
Já a eólica offshore é uma tecnologia na qual a Enel não pretende investir, ao menos por enquanto. “O mesmo MW em terra custa mais que o dobro no offshore”, disse Starace. Além disso, o prazo de desenvolvimento dos empreendimentos é longo, enquanto a italiana foca seus esforços em projetos que possam ficar de pé em até três anos, e os custos de operação e manutenção chegam a ser três vezes maiores. “Não precisamos disso”, afirmou Starace.