Leilões

'Pass through' do gás pode viabilizar térmicas dos 'jabutis' e novos gasodutos

Gás
Transporte do gás é um dos custos mais altos na composição da tarifa das termelétricas.

A inclusão de cláusulas de “pass through” nos contratos de termelétricas, discutida inicialmente para o leilão de reserva de capacidade (LRCap), poderá viabilizar os 8 GW em termelétricas regionais previstos pela Lei 14.182/2021, da privatização da Eletrobras, mesmo sem a derrubada de vetos ainda não apreciados nos “jabutis” de outra lei, a 15.0967, que criou um marco legal para a geração eólica offshore.

Um dos principais itens na composição do custo da energia das termelétricas, o custo do transporte do gás virou tema de discussão na elaboração das regras do LRCap, prometido pelo governo para contratação de termelétricas flexíveis e hidrelétricas, mas que pode nem acontecer, devido à contratação compulsória de usinas criada pelas leis em questão.

Transportadores de gás defendem o “pass through” da tarifa de transporte, repassada diretamente para o custo final da energia, sem afetar o ranqueamento das ofertas no certame, sob o argumento de que a medida vai dar segurança e tarifas mais competitivas aos usuários finais da rede de gasodutos.

O mesmo mecanismo pode ser usado nos leilões que cumprem a lei de privatização da Eletrobras. Desde a sua aprovação, apenas um leilão aconteceu, mas não chegou a ter oferta suficiente para a demanda prevista na legislação, justamente por causa do preço elevado do desenvolvimento de gasodutos em regiões sem a infraestrutura.

Por isso, o segmento de gás se mobilizou para viabilizar essa contratação por meio de novos jabutis, inseridos desta vez no marco da geração eólica offshore, mas vetados pelo presidente Lula. O texto reduziu o volume de geração a 4,25 GW, mas criou uma forma de precificação o valor da molécula de gás entregue na central de geração, que será obtido mediante chamada pública a ser realizada pelos governos estaduais, por meio de sua distribuidora de gás local. Assim, a tarifa iria bancar o custo do transporte, destravando a contratação das usinas.

Esta emenda não foi apreciada, mas o Congresso derrubou na semana passada o veto ao trecho que dizia que o governo precisa continuar fazendo leilões para garantir a contratação das termelétricas até que toda a capacidade prevista seja garantida.

A saída para custear o transporte de gás

Segundo fontes ouvidas pela MegaWhat, o MME entende que o pass through, que tem defensores dentro da própria pasta, poderá ser a saída para que os leilões dos 8 GW tenham sucesso, sem depender de novos jabutis. A cobrança do transporte diretamente dos consumidores, porém, é polêmica e vista como subsídio cruzado por especialistas. O debate, no caso do LRCap, dividiu lideranças do MME e é um dos motivos para o certame não ter sido retomado desde o seu cancelamento, em abril.

Se o mecanismo for, de fato, usado para garantir as térmicas da lei da Eletrobras, as consequências devem ir além da alta dos custos suportados pela conta de luz, estimados inicialmente em R$ 20,6 bilhões pelo MME, sem considerar o preço do transporte do gás.

Desafios adicionais: inflexibilidade

Como a lei diz que essas usinas teriam 70% de inflexibilidade, ou seja, teriam que gerar 70% do tempo, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) ganha um desafio adicional em relação à operação, já que o sistema precisa de geração despachável, e não na base. As contratações devem pressionar o curtailment e o GSF, que mede o risco hidrológico.

No caso dos cortes de geração, conhecidos pelo termo em inglês curtailment, o impacto vem da necessidade de manter as térmicas em operação mesmo quando há sobra de energia no sistema, como nos períodos de forte geração solar e eólica durante o dia.

Já no GSF, o problema é que as usinas hidrelétricas acabam tendo que reduzir sua geração para dar lugar às térmicas, o que distorce a lógica do Mecanismo de Realocação de Energia (MRE) e eleva os custos dos geradores participantes.

Além das térmicas, a possível contratação de PCHs como reserva de capacidade também contribui para o aumento dos encargos do setor. O Congresso derrubou um veto a um trecho que previa a contratação dessas usinas como reserva de capacidade, aumentando os encargos e criando custos estimados pelo governo em R$ 12,6 bilhões por ano.

Todo esse cenário aponta para uma redução progressiva da necessidade de realização de LRCAPs no futuro, já que a própria operação das usinas contratadas de forma inflexível contribuirá com o atendimento da demanda máxima de potência. Nos horários de demanda reduzida,

A longo prazo, a sobreposição de contratos inflexíveis, subsídios diretos e encargos não gerenciáveis compromete a sustentabilidade financeira do setor e limita o espaço para expansão da geração renovável, além de enfraquecer a lógica de sinalização de preços do mercado livre de energia. O cenário contribui ainda para a pressão sobre os preços de energia elétrica, dada a sofreoferta adicional.