Estiagem

ANA reduz vazão mínima de Belo Monte e declara escassez do rio Xingu

Baixas vazões afluentes aliado às demandas energéticas do SIN tem provocado redução do reservatório

UHE Belo Monte - Ibama (Divulgação)
UHE Belo Monte - Crédito: Ibama (Divulgação)

A Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) declarou situação crítica de escassez quantitativa dos recursos hídricos no trecho do rio Xingu e no seu afluente federal, o rio Iriri, durante reunião da sua diretoria colegiada desta segunda-feira, 30 de setembro. A declaração é válida até 30 de novembro.

O afluente abrange os estados do Mato Grosso e Pará, sendo responsável, entre outros usos, pela geração da usina hidrelétrica de Belo Monte (11.233 MW), que corresponde a 11% da carga do Sistema Interligado Nacional (SIN). A planta opera à fio d’água, aproveitando a força da correnteza dos rios para gerar energia elétrica, sem a necessidade de grandes reservatórios de água.

Patrick Thadeu Thomas, superintendente adjunto de Regulação de Usos de Recurso Hídricos da ANA, disse na reunião que o cenário de baixas vazões afluentes aliado às demandas energéticas do SIN tem provocado redução do reservatório intermediário da planta, com impacto na redução da energia gerada.

No momento, as vazões afluentes que chegam a UHE Belo Monte são da ordem de 600 m³/s, inferiores à soma da vazão mínima defluente exigida pela ANA no reservatório intermediário, com a mínima média mensal estabelecida para o trecho de vazão reduzida para o mês de setembro, de 750 m³/s.

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“Diante da situação extraordinária de estiagem no rio, a ANA emitiu um ofício informando que não se vislumbra óbices à flexibilização temporária e excepcional até 30 de novembro da vazão mínima a ser mantida no reservatório intermediário de 300 m³/s para 100 m³/s. A redução é uma medida de mitigação, ou seja, uma regra excepcional de operação, com base nesta situação extraordinária de estiagem, o que pode permitir a redução do ritmo de deplecionamento do reservatório e prolongar a manutenção dos volumes”, afirmou Thomas.

Situação no Xingu

As premissas da autarquia consideraram dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), analisados pela superintendência da ANA. Os levantamentos dos institutos indicam que a precipitação acumulada na bacia hidrográfica do rio Xingu de outubro de 2023 a setembro de 2024 foi caracterizada por chuvas abaixo da média, tendência que continua no atual período seco.

“De outubro de 2023 a setembro de 2024, a precipitação acumulada foi de 1.371 mm, enquanto a média histórica nesse período é de 1,747 mm, caracterizando um déficit de 376 mm (22%) no período chuvoso de 2023/2024”, disse o superintendente.

As anomalias negativas de chuva afetaram os níveis na bacia do Xingu, especialmente no trecho de Altamira, que estão abaixo dos valores mínimos já observados para essa época do ano.

“O acompanhamento realizado pelo Monitor de Secas corrobora a constatação de anomalia negativa persistente. Houve agravamento da situação de seca nos últimos 12 meses na região ao Norte do Mato Grosso e no estado do Pará, na região da bacia do rio Xingu”, pontou Thomas.

Para a ANA, os cenários hidrometeorológicos para este ano indicam a possibilidade de serem atingidos níveis ainda mais críticos em outubro e novembro com impacto sobre os usos.

Por isso, a declaração no trecho do Xingu e do rio Iriri visa a aumentar a segurança hídrica da região e mitigar os impactos dos baixos níveis dos rios sobre os usos da água, além de comunicar à população a gravidade da situação de seca na região, permitindo que instituições gestoras e diferentes usuários de recursos hídricos no rio Xingu adotem medidas preventivas para mitigar os impactos. A ANA, se necessário, também poderá alterar regras de uso da água e adotar outras medidas.

Declarações de 2024

Além do rio Xingu, a ANA declarou escassez hídrica na região hidrográfica do Paraguai, nos rios Madeira, Purus e seus afluentes e no trecho baixo do rio Tapajós.

As decisões foram aprovadas visando aumentar a segurança hídrica das regiões e mitigar os impactos dos baixos níveis dos rios sobre os usos da água. 

Seca no Brasil

Na maior parte da Bacia do Amazonas, os rios estão abaixo da faixa da normalidade para o período e, em algumas delas, as cotas já chegaram aos níveis mais baixos da história.

Dados do Serviço Geológico do Brasil, divulgados na última semana, indicam que o rio Negro atingiu 13,73 metros, em Manaus, no Amazonas – essa é a 4ª menor cota da série histórica, iniciada em 1902. 

Também foi registrada mínima histórica de 37 cm no rio Solimões, no município de Itapéua (AM); de 7,38 m no Solimões, em Fonte Boa (AM); e de 4 m no Rio Purus, em Beruri (AM). O rio Solimões, em Manacapuru (AM), pode também registrar a mínima histórica nos próximos dias. A cota atual é de 3,47 m – a 2ª menor da história, atrás da marca de 3,11 m em 2023.

“As chuvas abaixo da média em setembro devem se refletir nos níveis dos rios em outubro e vamos continuar a verificar cotas mais baixas ao longo do próximo mês”, disse o pesquisador em geociências Artur Matos, coordenador nacional dos Sistemas de Alerta Hidrológico do SGB. 

Nos rios Madeira e Tabatinga, as cotas devem ter pequena elevação, influenciada por chuvas nas regiões de cabeceiras. No entanto, a SGB afirma que o volume previsto não é suficiente para uma recuperação.

Na quarta-feira, 25 de setembro, o rio Paraguai reduziu 11 centímetros em Porto Murtinho, no Mato Grosso do Sul, e atingiu 73 cm – marca que se igualou à mínima histórica observada em 1971. 

Um dia antes, a Bacia do Rio Madeira bateu novo recorde histórico em Porto Velho, Rondônia, e chegou a 25 cm – a marca mais baixa desde o início da série histórica, em 1967.

De acordo com as projeções do SGB, não há tendência de recuperação do Rio Madeira para os próximos dias.

“As previsões de chuva só indicam melhorias após o dia 1º de outubro. Até essa chuva chegar à estação de Porto Velho, os níveis podem continuar bem baixos por cerca de 20 dias. Na Bolívia, que é a cabeceira da bacia, as vazões continuam reduzindo”, afirmou Marcus Suassuna, pesquisador em geociências do SGB, Marcus Suassuna.

Para o boletim de secas do G20, Ana Paula Cunha, pesquisadora de secas do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), disse que entre 2023 e 2024 foram registradas secas mais intensa e extensa desde que o órgão começou a monitorar.

Segundo a pesquisadora, a seca não é apenas um fenômeno local, mas têm impactos transfronteiriços.

“Se olharmos para o mapa da seca na América do Sul, vemos que países vizinhos, como Paraguai e Bolívia, também estão enfrentando crises hídricas. Os rios ultrapassam fronteiras, e quando uma seca atinge a cabeceira de um rio em outro país, nós também somos impactados”, afirmou.