Geração

Aneel derruba liminar do curtailment no STJ

Eólicas no Ceará - Crédito: Ricardo Botelho (MME)
Geração eólica tem sofrido com cortes de geração determinados pelo ONS, conhecidos pelo termo em inglês curtailment | Foto: Ricardo Botelho (MME)

O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Herman Benjamin, julgou procedente o pedido da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e suspendeu a liminar obtida por geradores eólicos e solares determinando ressarcimento dos cortes de geração centralizada, conhecidos pelo nome em inglês curtailment, que foi concedida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) no fim de 2024.

A decisão foi publicada na tarde desta quarta-feira, 22 de janeiro, poucos dias depois que a Aneel ajuizou o recurso, em que argumentou que os consumidores de energia podem ter que arcar com mais de R$ 1 bilhão por meio da conta de luz.

O ministro Benjamin escreveu na decisão que os prejuízos aos geradores não poderiam ser transferidos aos consumidores, por meio da cobrança do encargo potencialmente bilionário, sem “exame mais aprofundado a respeito da tese relativa aos riscos inerentes da atividade empresarial”.

Como a liminar caiu antes da liquidação das operações do mercado de curto prazo (MCP) de dezembro, que acontece no início de fevereiro, os geradores não chegaram a ser ressarcidos pelos cortes de geração realizados desde então.

Prejuizo aos geradores

A liminar tinha sido concedida pela quinta turma do TRF1, que acolheu os argumentos da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica) e Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), que alegam que a Aneel extrapolou sua competência ao restringir as compensações financeiras pelos cortes de geração.

Os geradores alegam que os cortes geram impacto negativo nas suas operações, já que ficam expostos ao mercado de curto prazo e têm seus fluxos de caixa e a capacidade de cumprimento de obrigações financeiras e contratuais afetada.

>> Entrevista: Luiz Barroso, da PSR, explica tudo sobre curtailment

Na decisão de dezembro, o TRF1 determinou que os cortes futuros de geração fossem ressarcidos aos geradores por meio do Encargo de Serviços do Sistema (ESS), que é pago por todos os consumidores de energia. Segundo a Aneel, contudo, o pagamento representaria “o deslocamento de um risco do negócio dos empreendimentos de geração para os consumidores de energia elétrica do país”.

Ao pedir o cancelamento da liminar no STJ, a Procuradoria Federal junto à Aneel argumentou que a decisão subverteu as regras setoriais de apuração de geração das fontes eólica e solar fotovoltaica, além de “perturbar o ambiente institucional do setor elétrico, transferindo riscos empresariais dos agentes de geração para os consumidores de energia, o que acarreta nefasta instabilidade regulatória”.

Impacto da liminar na conta de luz

A Aneel solicitou à Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), responsável pela operacionalização dos encargos setoriais, que simulasse o impacto do afastamento das regras sobre curtailment. A CCEE considerou os dados disponíveis das usinas eólicas a partir de outubro de 2021, e no caso da solar a partir de abril de 2024, época em que começaram a ser feitas as medições solarimétricas desses empreendimentos.

Foram apurados os montantes de cortes de geração apontados pelo ONS, independentemente da razão da restrição, e a energia não gerada foi valorada ao PLD de cada hora e submercado de restrição. O resultado, até novembro de 2024, foi um saldo de R$ 1,1 bilhão, sendo R$ 904 milhões da fonte eólica e R$ 199 milhões da solar.

Considerando apenas o período de julho a novembro de 2024, ou seja, o segundo semestre do ano, menos os dados de dezembro que ainda não foram contabilizados, são cerca de R$ 680 milhões nas eólicas e R$ 180 milhões nas solares.

A Aneel fez então uma comparação desses valores com a estimativa oficial da CCEE para o ESS de 2025, de R$ 253 milhões, para argumentar que o ressarcimento do curtailment teria impacto relevante sobre a conta de luz paga pelos consumidores brasileiros.

Esses não são os valores que serão pagos na operacionalização da liminar, que só tem efeitos futuros, mas foram usados como referência pela Aneel para mensurar à Justiça o impacto da decisão. “O fato é que os consumidores de energia elétrica começarão a pagar, já em janeiro de 2025, uma despesa adicional no ESS, absolutamente indevida. Uma despesa que, como visto, pode superar a casa de R$ 1 bilhão em curto espaço de tempo”, diz o documento.

Implementação da decisão

Se a liminar não fosse revertida até o início de fevereiro, a CCEE operacionalizaria a cobrança do ESS na próxima liquidação financeira do mercado de curto prazo de energia. A liquidação das operações de dezembro do ano passado acontece no dia 7 de fevereiro.

Considerando os dados do ONS, o Itaú BBA calculou que os cortes representaram 9,5% da geração eólica em dezembro, quando chegaram a 17,8% da geração solar fotovoltaica.

Essa não foi a primeira decisão judicial favorável aos geradores. Em dezembro de 2023, um juiz convocado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) aceitou o argumento das associações e determinou que a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) fizesse os pagamentos das compensações aos geradores na liquidação do mercado livre seguinte.

A decisão liminar não chegou a ser cumprida. Inicialmente, a CCEE alegou que a Aneel precisava definir as regras do pagamento para que fosse aplicado. Em julho, antes disso acontecer, a Aneel conseguiu derrubar a decisão, ao alegar que não havia urgência para justificar uma liminar.