Os geradores renováveis pretendem entrar com recurso no Superior Tribunal de Justiça (STJ) contra a decisão do presidente do órgão, ministro Herman Benjamin, de suspender a liminar que determinava o ressarcimento dos cortes de geração determinados pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS).
“Vamos entrar com o agravo, naturalmente, contra a suspensão dessa liminar. Vamos continuar a discussão na Justiça enquanto buscamos uma discussão com o próprio regulador para mostrar e defender nossos pontos e ver se conseguimos melhorar um pouco a situação”, disse Élbia Gannoum, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica).
A Abeeólica e a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), autoras do processo em questão, terão a opção de direcionar o recurso ao próprio presidente do STJ, ou à corte especial composta de 15 magistrados do tribunal.
Em paralelo, o mérito do processo continua em discussão na instância inferior, ao mesmo tempo em que no âmbito administrativo a própria Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que é alvo da judicialização, discute um aprimoramento da regulamentação dos cortes das renováveis.
Para associações, responsabilidade não é do gerador
As associações defendem que os cortes resultam de limitações na infraestrutura do sistema e não por responsabilidade das empresas. “Quando fizemos nossos contratos, vendemos energia com base na disponibilidade esperada. Não cabe às empresas gerenciar a geração, mas apenas a comercialização”, explicou Gannoum.
”O ano de 2024 foi realmente um ano dramático para nós, e o ano de 2025 não se mostra diferente, a despeito do crescimento da carga. Esperamos um ano muito ruim e as empresas não suportam mais”, disse a executiva, que ressaltou que alguns geradores renováveis tiveram corte de mais de 60% da geração.
A consequência econômico-financeira disso, segundo Gannoum, é prejudicar investimentos futuros. “O impacto é insustentável, temos empresas que indicaram a possibilidade de falência”, afirmou.
A Abeeólica afirmou ainda que o impacto tarifário do ressarcimento dos cortes aos geradores renováveis seria pequeno quando considerado na tarifa. A entidade calcula que se todos os cortes de eólica tivessem direito a compensação, sem a limitação de franquias, o impacto seria de 0,21% na tarifa em média. A inflação de 2025, por sua vez, teria elevação de 0,008%. Considerando também a fonte solar fotovoltaica, o aumento na tarifa seria de 0,38% e o impacto inflacionário de 0,015%.
“O impacto tarifário disso é muito baixo com relação a outros impactos de segurança que a gente tem no sistema”, disse Gannoum.
Judicialização, liminar e mérito
Os geradores renováveis entraram na Justiça em 2023 contra a regulamentação dos cortes, alegando que a Aneel, quando limitou os casos de ressarcimento, extrapolou sua função e infringiu a legislação vigente.
A liminar revertida essa semana tinha sido deferida em dezembro pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), e obrigava a Aneel a calcular o ressarcimento da energia não gerada por meio do Encargo de Serviços do Sistema (ESS), repassando o custo aos consumidores.
No entanto, o STJ acolheu o argumento da Aneel de que o impacto tarifário para os consumidores seria uma transferência de risco empresarial, considerando o montante de R$ 1,1 bilhão estimados pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica como custo potencial entre 2021 e 2024.
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Âmbito regulatório: aprimoramento das regras
Apesar de entender que a regulamentação vigente cumpre a lei, a Aneel está discutindo um aprimoramento nas regras dos cortes de renováveis, incluindo a instituição de um mecanismo de rateio entre os geradores da mesma fonte ou submercado, à exemplo do Mecanismo de Realocação de Energia (MRE), “condomínio” do qual fazem parte as hidrelétricas.
O assunto está sendo discutido na terceira fase da consulta pública 45/2019, aberta em dezembro com duração de 60 dias.
A abordagem em discussão pelo regulador busca distribuir os custos de maneira proporcional às garantias físicas dos empreendimentos, reduzindo o impacto em um único grupo de agentes
Segundo a diretoria da Aneel, a medida pretende aprimorar o equilíbrio regulatório no setor. “Não estamos tratando o fenômeno físico do corte, mas sim os critérios para fazer seu rateio, considerando que a geração renovável cresce de forma exponencial e exige ajustes nas regras,” afirmou o diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, na ocasião da abertura da consulta pública.