Hidrelétrica de Tucuruí, localizada no rio Tocantins, tem 8.370 MW de potência é a segunda maior do país
Hidrelétrica de Tucuruí, localizada no rio Tocantins, tem 8.370 MW de potência é a segunda maior do país

Geração e armazenamento

‘Baterias do sistema’, hídricas podem ser ampliadas e ter novos usos com reversíveis

Sem novos projetos para grandes hidrelétricas, Brasil pode dar novos usos às plantas existentes; fonte é a principal geradora na matriz elétrica do país

Hidrelétrica de Tucuruí, localizada no rio Tocantins, tem 8.370 MW de potência é a segunda maior do país
Hidrelétrica de Tucuruí, localizada no rio Tocantins, tem 8.370 MW de potência é a segunda maior do país | Foto: Museu virtual Tucuruí

As hidrelétricas reversíveis, tecnologia usada amplamente em outros mercados, mas não no Brasil, podem ajudar o Sistema Interligado Nacional (SIN) em períodos de hidrologia ruim e alta do consumo, mas para isso é preciso um aprimoramento da regulamentação, de acordo com especialistas ouvidos pela MegaWhat.

A solução fica no meio entre as hidrelétricas de grande porte, capazes de reter água por meses, e as baterias para armazenamento de energia, que podem equilibrar a oferta por algumas horas. Compostas por dois reservatórios, as usinas reversíveis geram energia com a queda d’água, como as hídricas tradicionais. A diferença é que, quando  o preço está mais baixo, um sistema bombeia a água do reservatório inferior para o superior.

Hidrelétrica reversível La Muela, da Iberdrola, na Espanha.
Hidrelétrica reversível La Muela, da Iberdrola, na Espanha. | Crédito: Iberdrola

Há consumo de energia neste processo, mas o benefício se explica porque o déficit ocorre quando há mais oferta, possibilitando a geração a menor custo em momentos de suprimento limitado. “Ela tem a capacidade de gerar quando o sistema precisa. Ainda que o saldo de energia seja negativo, o saldo de custo para o sistema é positivo”, diz a diretora técnica da PSR Angela Gomes.

“A gente tem chamado essas usinas de baterias de água. Porque, basicamente, elas fazem a mesma função e têm o mesmo caráter da bateria, de não gerar a energia. O que elas fazem é guardar e, depois, soltar aquela energia. Há um caráter de modularidade”

Jairo Terra, líder em Assuntos Regulatórios na PSR

Falta de regras

As hidrelétricas reversíveis fizeram parte da Consulta Pública nº 39/2023 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que buscou contribuições para a regulamentação para o armazenamento de energia elétrica. Entretanto, ainda não há regulação a respeito.

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Outro entrave para as hídricas reversíveis é a precificação. O diretor de Hidráulica e Offshore da Neoenergia, Marcelo Lopes, explica que estas plantas são comuns em mercados em que os preços são definidos pela relação de oferta e demanda, com ajustes periódicos ao longo do dia.

“Para o Brasil, como o preço spot [preço de liquidação de diferenças, o PLD] é definido pela CCEE [Câmara de Comercialização de Energia Elétrica], seria necessária outra alternativa para remunerar os empreendimentos”, avalia. Para o executivo, um dos possíveis caminhos seriam os leilões de reserva de capacidade, em que as usinas teriam uma remuneração fixa, parecida com uma Receita Anual Permitida (RAP) das transmissoras, para que estejam disponíveis para bombear ou turbinar quando requeridas pelo SIN.

Expansão das hidrelétricas existentes

Enquanto a regulação para armazenamento não sai no Brasil, as hidrelétricas clássicas e térmicas devem continuar dando suporte ao atendimento em momentos de maior demanda. Na fonte hídrica, há formas de aumentar a capacidade com as usinas já existentes.

Em março, o Ministério de Minas e Energia (MME) abriu a Consulta Pública nº 160, que trata do leilão de reserva de capacidade na forma de potência, com previsão para ampliação das hidrelétricas existentes. Ainda não houve definição das regras do leilão nem da sua data, mas as empresas donas de usinas que poderão ser expandidas seguem de olho na oportunidade.

Marcelo Lopes, da Neoenergia, explica que a repotencialização pode ser feita de diversas formas. As máquinas podem ser repotencializadas ou substituídas por turbinas de maior flexibilidade, que possam trabalhar em faixas operativas mais flexíveis de vazões e condições de menor queda d’água, com níveis mais baixos.

A ampliação das casas de força é outro caminho, seja com motorização dos poços vazios de casas de força existentes, seja com a instalação de mais turbinas, ou ainda ampliando a capacidade da usina com a instalação de máquinas adicionais, por meio de um leilão de reserva de capacidade (potência).

Turbina UHE Baixo Iguaçu | Crédito Neoenergia
Turbina UHE Baixo Iguaçu. Usinas existentes podem ser repotencializadas, conta Marcelo Lopes, diretor de Hidráulica e Offshore da Neoenergia | Crédito da imagem: Neoenergia

Lopes também menciona a gestão eficiente do reservatório como forma de ampliar o uso das hídricas existentes no país. Para ele, esta é uma oportunidade com custo operacional de operação e manutenção baixo, pois as usinas já são existentes. 

Caminhos para a regulação e remuneração

Entretanto, diversos agentes do setor apontam que a flexibilidade, potência e tensão que as hidrelétricas oferecem ao sistema ainda não são bem remuneradas.

Angela Gomes, da PSR, pondera que o modelo ainda vigente foi pensado para um sistema hidrotérmico e que, atualmente, o momento seria de transição nos padrões regulatórios. “A gente tem ativos que tiveram retornos precificados num modelo de setor que não tinha essa participação das fontes intermitentes. Eles [hidrelétricas] passaram a trabalhar muito mais, a oferecer muito mais esse serviço do que antes seria necessário”, diz.

Precificar o serviço, entretanto, é um desafio. A PSR elabora um cenário do setor caso não existissem as hidrelétricas, partindo da ideia de que uma forma de estimar o valor do serviço é calcular o custo do sistema sem ele. “A diferença seria o valor agregado desses reservatórios”, diz Angela. Mas fazer estes cálculos e escolher as premissas não é simples. Por isso, a PSR aponta que outra forma para chegar ao valor do serviço é abrir um processo competitivo – de preferência, com diversidade de proponentes.

“Existem todas as tecnologias e elas têm os seus atributos, mas o ideal não é que a gente escolha um ‘campeão’ para receber os investimentos, mas que se crie a viabilidade regulatória. Você cria a viabilidade regulatória, fala qual é a necessidade do sistema e aí, então, as próprias tecnologias vão mostrar do que elas são capazes”, diz Jairo Terra, da PSR.

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