Glossário

Medida Provisória 579

O que é: a Medida Provisória 579/2012 (transformada na Lei 12.783/2013) propôs a prorrogação antecipada e onerosa das concessões de geração de energia que venceriam entre 2015 e 2017. A garantia física dessas usinas foi convertida em cotas de energia e repassadas, de forma compulsória, às distribuidoras e incluídas na tarifa dos consumidores finais de todo o país.

A MP também deu novas condições para renovação de nove contratos de concessões de linhas de transmissão, que correspondiam a uma extensão de 85,3 mil quilômetros, e para 44 distribuidoras de energia elétrica que correspondiam a 35% do mercado nacional. A renovação proposta pelo governo teve como objetivo uma redução média nas tarifas de energia de 20%.

Como funciona: diversos ativos de geração e transmissão encerrariam a concessão em 2015 e com a MP, as empresas com usinas e linhas de transmissão nesta condição poderiam antecipar a renovação do prazo, desde que acatando requisitos que resultariam na redução do preço da energia. Caso empresas não aderissem à renovação antecipada, as usinas teriam a concessão encerrada no fim do contrato e seria relicitada.

Para a geração, o preço da energia na forma de cota foi composto pela Receita Anual de Geração (RAG), definida pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), e o Custo da Gestão dos Ativos de Geração (GAG), que incluiu os custos regulatórios de operação, manutenção e administração dos ativos. Como a energia passou a ser negociada em cotas, o risco hidrológico das usinas foi transferido para o consumidor cativo.

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Os ativos de transmissão tiveram que se enquadrar à remuneração por receita calculada pela Aneel e aos padrões de qualidade do serviço estabelecidos pela agência. As distribuidoras tiveram a concessão renovada pelo Poder Concedente – neste caso, o Ministério de Minas e Energia (MME) – por uma única vez, pelo prazo de 30 anos. Neste caso, um dos critérios para a prorrogação foi o cumprimento de metas de qualidade no fornecimento de energia.

Histórico: com a primeira grande reformulação do setor elétrico em décadas, a partir das Leis 8.987/1995 e 9.074/1995, o governo estabeleceu regime de concessões para as usinas hidrelétricas, que até então não tinham regramento próprio. Com a vigência das leis, as hidrelétricas não licitadas que existiam e estavam com a concessão vencida até então tiveram prorrogação por 20 anos, a contar a partir de 8 de julho de 1995. As usinas que não tinham a concessão encerrada poderiam ter o prazo estendido a partir do término da concessão. Com isso, aproximadamente 20 usinas tiveram concessão encerrando entre 2015 e 2017 – grande parte delas em 2015, entre elas as do complexo de Paulo Afonso, da Chesf, usinas de Furnas, da Cesp e Copel, entre outras.

Mas, considerado bem sucedido durante os primeiros anos de vigência, principalmente por ter retomado a construção de grandes empreendimentos de geração de energia e a contratação de longo prazo no mercado, o Novo Modelo do Setor Elétrico havia criado uma armadilha para si próprio: um bloco considerável de energia elétrica, de cerca de 9 mil MW médios, fruto do leilão de energia existente de 2005, ficaria descontratado a partir de 2013. No ano seguinte, seriam descontratados outros 6,8 mil MW médios.

Assim, a dúvida no setor era: como recontratar toda essa energia se o prazo de concessão das hidrelétricas se encerraria dentro de poucos anos? Em tese, a legislação vigente previa que as usinas poderiam ser revertidas para o governo e relicitadas ao fim do prazo de concessão. Entretanto, mesmo que o governo optasse por seguir o que estava previsto na legislação, ainda havia a necessidade de se definir o que fazer com a energia. Uma corrente de especialistas do setor indicava que essas usinas estavam com o investimento amortizado e o preço da energia poderia ser reduzido, independente da solução adotada.

Ao mesmo tempo que havia a preocupação quanto ao destino da energia e das concessões das hidrelétricas, de maneira geral, em 2012 o ambiente era de insegurança: os investidores estavam retraídos em todos os setores; havia dúvidas quanto ao comportamento da inflação e à capacidade de crescimento futuro da economia; e aumentavam os protestos de economistas e formadores de opinião quanto às “pedaladas fiscais” do governo, que teriam impacto no equilíbrio futuro das contas públicas.

Foi neste contexto, que em setembro de 2012 o governo de Dilma Rousseff editou a MP 579. De um lado, a presidente pretendia conter os índices de inflação, que ameaçavam superar as metas fixadas pelo Banco Central. De outro, atender aos pedidos do segmento industrial, que exigia aumento de competitividade global por meio da redução dos custos da energia.

Geração

A MP 579 entrou em vigor em 11 de setembro de 2012, e estabeleceu que a Aneel deveria calcular o preço da energia, de modo que fosse capaz de cobrir custos de operação e manutenção dos empreendimentos de geração. Dos grupos que tinham usinas com contratos de concessão a vencer, porém, praticamente apenas a Eletrobras, controlada pelo governo federal, aderiu à proposta. Cesp, Copel e Cemig não aderiram à proposta e tiveram as usinas relicitadas no fim do prazo.

Ao abrir mão da receita dos contratos de concessão que venceriam até 2017 e prorrogar antecipadamente a concessão dos empreendimentos pelo regime de cotas, o grupo Eletrobras perdeu cerca de R$ 10 bilhões anuais de receita, o que se desdobrou em uma grave crise financeira. Por outro lado, perderam ativos considerados relevantes, a Cesp (Ilha Solteira, Jupiá, Três Irmãos) e Cemig (Jaguara, Miranda, São Simão e Volta Grande), relicitadas entre 2015 e 2017.

Transmissão

A MP 579 determinou, ainda, a prorrogação dos contratos de concessão das transmissoras de forma semelhante. Neste segmento, porém, um grupo elevado de empresas ainda tinha investimentos não amortizados. Os recursos para indenização das transmissoras era oriundo da Reserva Global de Reversão (RGR) e da CDE, mas os dois fundos ficaram sem dinheiro. Além disso, divergências entre valores a serem devolvidos resultaram em processos judiciais.

A Rede Básica passou a existir (regulatoriamente) a partir da Lei 9.074/1995, regulamentada pelo Decreto 1.717/1995. Em 2000, a Aneel editou duas resoluções: a Resolução 166, que relaciona as instalações de transmissão que compõem a Rede Básica e as Demais Instalações de Transmissão (DITs); e a Resolução 167, que homologou as receitas anuais permitidas (RAPs) dos ativos de transmissão.

A partir daí, as receitas passaram a ser reajustadas anualmente e “blindadas” contratualmente, sem previsão de revisões tarifárias periódicas até o fim das concessões (que ocorreria em julho de 2015). Ou seja, não houve avaliação dos ativos para calcular a RAP que seria arrecadada para remuneração inicial das concessões de transmissão.

A MP nº 579/2012 permitiu antecipar os efeitos da prorrogação das concessões de transmissão em até 60 meses do advento do termo contratual ou do ato de outorga. Naquele momento, não foram tratadas as eventuais indenizações das instalações de transmissão existentes no ano 2000; somente foi previsto o pagamento de indenizações associadas aos reforços autorizados e realizados após 2000. As instalações existentes em 2000 ficaram conhecidas pela sigla RBSE (Rede Básica do Setor Elétrico).

Só quando a MP 579 foi transformada na Lei 12.783/2013 é que foram estabelecidos os critérios gerais para o cálculo dos ativos de transmissão existentes no ano 2000, baseados na metodologia de valor novo de reposição. Para esse caso, o poder concedente (no caso, o MME) poderia pagar, na forma de regulamento, o valor relativo aos ativos considerados não depreciados. O ministério, então, definiu a competência da Aneel para realizar o cálculo, por meio da Portaria 267/2013.

A Aneel, então, realizou a audiência pública 101/2013, para estabelecer os critérios para elaboração dos laudos de avaliação dos ativos, que depois de fiscalizados e aprovados pela agência, se tornaram o principal subsídio para o cálculo do valor adicional à receita vigente.

Em fevereiro de 2016, o MME editou a Portaria 120/2016, na qual determinou à Aneel que calculasse o valor de indenização da RBSE, com prazo de até oito anos para pagamento.

A metodologia de cálculo entrou na audiência pública 68/2016 e em fevereiro do ano seguinte a Aneel divulgou o valor final, de R$ 62,2 bilhões, representando um adicional médio de 7,17% nas tarifas dos consumidores, pagos mensalmente por oito anos.

Distribuição

No caso das distribuidoras, o modelo de prorrogação das concessões foi definido posteriormente. Na prática, as empresas do segmento que aceitassem a proposta de prorrogação de seus respectivos contratos teriam um prazo de cinco anos para se adequarem às exigências de qualidade de serviço e de equilíbrio econômico-financeiro estipuladas pela Aneel. Distribuidoras que descumprissem metas anuais de qualidade correm o risco de perder a concessão. No caso de desequilíbrio econômico-financeiro, os acionistas podem ser obrigados a fazer aportes financeiros nas distribuidoras.

Devido à escassez das chuvas, o custo de operação do sistema tornou-se elevado e, com isso, a redução prevista das tarifas para o consumidor não se concretizou. O principal objetivo da MP 579, portanto, não foi atingido. Além disso, entre economistas e no mercado de uma maneira geral, a MP foi avaliada como mais um sinal do aumento da intervenção do governo na economia, o que afastou investidores privados, sendo mais um fator que contribuiu para o incremento da onda de oposição ao governo de Dilma Rousseff.