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Com conversão de motores, térmicas buscam competitividade no leilão de capacidade

Empreendedores também avaliam novos empreendimentos, inclusive a biocombustíveis; facilidade de suprimento é fator importante

UTE Camaçari, movida a óleo
UTE Camaçari, movida a óleo. Empreendedores estudam conversão para biocombustível ou gás natural para participarem do leilão de reserva de capacidade.

O leilão de reserva de capacidade na forma de potência que deve ocorrer em junho deste ano movimenta o mercado de conversão de usinas. Com nove produtos para termelétricas, todos eles admitindo apenas gás natural ou biocombustíveis, empreendedores calcularam os custos e riscos de garantia do volume de combustível para geração plena durante toda a duração do contrato.

O prazo para cadastrar os projetos na Empresa de Pesquisa Energética (EPE) terminou na última sexta-feira, 14 de fevereiro. A MegaWhat apurou que empresas avaliam que não há produção suficiente de biodiesel hoje, e estudam junto a fabricantes a conversão de motores temendo uma alta do preço.

Do total de produtos para térmicas, seis são exclusivamente para usinas existentes, mas muitas das plantas atuais usam fontes como óleo combustível ou diesel e precisarão se adequar para atender às diretrizes do certame.

Conversão de motores

O diretor de Projetos da Wärtsilä, Gabriel Cavados, explica que converter uma usina a combustível líquido é tecnicamente possível e custa menos do que uma nova planta. “Converter uma térmica a óleo para gás, que é a conversão mais cara que a gente tem, é cerca de 30% a 40% do custo de uma usina nova”, exemplifica.

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A conversão para biocombustível tende a ser ainda menos custosa, segundo o executivo. No geral, o biocombustível para térmica é biodiesel, mas o uso de etanol também é estudado pois já há motores de navio a etanol.

A possibilidade de usar biocombustíveis permitiria que usinas a óleo contratadas em certames anteriores continuem competindo. “Todos os nossos clientes que são proprietários de usinas a combustível líquido estão bastante otimistas com a relação ao leilão. Abriu uma fronteira para eles continuarem com esse ativo, que é útil para o setor elétrico”, diz Cavados, apontando que os ativos já foram pagos.

O esforço da conversão também está sendo avaliado “criteriosamente” pelos associados da Associação Brasileira Geradoras Termelétricas (Abraget), que espera que o movimento seja reconhecido de forma adequada no certame.

Além do custo da conversão, fatores como localização da planta e facilidade de suprimento também podem impactar a competitividade dos empreendimentos. “Eu diria que o combustível primário [para projetos existentes] seria gás. Se o gás não for competitivo aí é que eles partiriam para outra opção. Tem projetos existentes que não têm acesso a gás e que estão avaliando combustíveis renováveis”, diz Gabriel Cavados, da Wärtsilä.

Segundo o executivo, há até mesmo estudos de projetos novos a biocombustível. “Não são a maioria, mas a gente já vê esse movimento de alguns clientes”, diz.  

Biocombustíveis e gás natural: oportunidades de conversão

As duas possibilidades para conversão de usinas existentes podem se mostrar vantajosas, a depender de características do empreendimento. Enquanto a conversão para biocombustível tende a ser mais barata do que para gás natural, esta economia pode ser compensada pelo preço do combustível, por exemplo.

Entram no cálculo dos empreendedores fatores como localização da planta e o preço do insumo, além da capacidade e velocidade de suprimento, uma vez que o certame não prevê inflexibilidade ou despacho antecipado.

Dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) indicam que, na semana de 27 e janeiro a 2 de fevereiro de 2025, o litro do biodiesel B100 custava, em média, R$ 6,08 (sem ICMS).

O preço do gás natural depende de negociações bilaterais e é, geralmente, atrelado como fração do preço do petróleo. No fim de janeiro, a Petrobras, que responde pela maior parte do mercado, reduziu os preços de gás natural, repassando a queda no preço do brent e descontando efeitos de desvalorização cambial.

Há, ainda, o gás liquefeito de petróleo (GNL), que pode ser importado. A entrega pode ocorrer por gasodutos, caso a usina esteja perto da malha. Para abastecimento em áreas distantes dos dutos, há a solução de GNL small scale, que chega por caminhões, mas exige uma estação de regaseificação na própria usina.

Novos serviços de GNL small scale, como a GNL Brasil, da Eneva e VirtuGNL, e GNLink, têm dado mais capilaridade à modalidade de pequena escala.

Oferta e preço de biodiesel

Ao contrário do gás natural, o biodiesel não pode ser importado e, independentemente do abastecimento a térmicas, tende a ver um aumento em sua demanda no país. A partir de 1º de março, a mistura de biodiesel no diesel deve aumentar 1 ponto percentual, passando a 15%.

Hoje, a capacidade instalada do país é de 14,9 bilhões de litros de biodiesel por ano, segundo Julio Cesar Minelli, diretor Superintendente da Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio), e ainda há projetos de expansões e novas plantas, que devem elevar a capacidade instalada anual para 17,3 bilhões de litros de biodiesel ainda em 2025.

Em 2024, Minelli aponta que o consumo brasileiro foi de 8,9 bilhões de litros, com projeções de atingir cerca de 9,7 bilhões de litros de biodiesel em 2025, considerando o aumento da mistura no diesel.

“Temos aí um excedente para ser consumido que já atende plenamente hoje”, disse o diretor da Aprobio. Ele também destaca a diversidade de localização das usinas, com 58 em 15 estados de todas as regiões do país, e mais sete plantas em construção.

“O setor responde muito rápido a essas demandas, portanto não vejo nenhum problema de essas usinas virem a ser convertidas para o biodiesel e terem oferta suficiente de produto para elas, assim como as novas que serão contratadas para 2028 e 2029 também poderem utilizar”, avalia Minelli.

Além da capacidade instalada, o país produz soja suficiente para dar suporte a um eventual aumento na demanda doméstica. O diretor da Aprobio explica que em torno de 70% do biodiesel no Brasil é feito a partir da soja, e cerca de dois terços da produção nacional do grão em 2024 foi exportado, o que permite aumentar os insumos de soja com menos exportações.

Outra possibilidade seria aumentar a recuperação de óleos vegetais usados, uma vez que a demanda da indústria alimentícia é de 3 bilhões de litros por ano e, ainda que haja perda de 50% nos próprios alimentos, o acréscimo na oferta para biodiesel poderia chegar a 1,5 bilhão de litro. Já outros insumos para o combustível, como sebo bovino, têm oferta menos elástica, na avaliação do executivo.

Em relação aos preços, Julio Cesar Minelli lembra que o óleo de soja é uma commodity e está sujeito a flutuações de preço no mercado internacional, e com uma perspectiva de aumento na produção de soja no mundo, os preços do óleo podem ter queda ainda neste ano. “Mas isso vai acontecer? Não tem como saber”, reconhece.

Para o leilão, a conta para biocombustíveis tende a ficar mais apertada com a redução de 40% no Custo Variável Unitário (CVU), que saiu de cerca de R$ 2.750/MWh para R$ 1.700/MWh, uma redução de quase 40%.

A redução aconteceu por meio da publicação da Portaria Normativa nº 100.  A mudança foi mal-recebida por empreendedores, especialmente aqueles que tentam viabilizar usinas a biodiesel.

Mesmo assim, Gabriel Cavados, da Wärtsilä, avalia que há competitividade. “A perspectiva era de um CVU mais elevado, mas, numa conta geral que a gente fez, não restringiu a participação de biocombustível”, avalia.

Outros fatores que influenciam na competitividade dos projetos

“Esse leilão está mais preparado para ser um leilão de flexibilidade, nas quais atributos tais como o tempo de partida e o número de partida das usinas são valorados”, avalia a Abraget.

Gabriel Cavados, da Wärtsilä, explica que cada tecnologia terá um parâmetro diferente para avaliação, a partir de suas características e flexibilidade. “Em vez de comparar tecnologias que são diferentes por um mesmo parâmetro, cada projeto vai ter um fator específico para cada tecnologia. Então você vai qualificar um pouquinho mais a fórmula de ranqueamento daqueles projetos que são mais competitivos”, avalia.

No entanto, o valor de 60 partidas e paradas estipulado nas diretrizes está baixo nas projeções da Wärtsilä, que projeta em torno de 120 paradas por ano.

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