O plenário do Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou, por unanimidade, um acordo consensual entre a turca Karpowership (KPS) e o Ministério de Minas e Energia e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), a fim de flexibilizar os contratos das termelétricas contratadas no Procedimento Competitivo Simplificado (PCS) de outubro de 2021.
O acordo terá validade até o fim de 2023, e deve resultar em uma economia de R$ 580 milhões em encargo de energia de reserva pago pelos consumidores. A conta, porém, ainda será significativa, já que as quatro termelétricas da KPS custam cerca de R$ 250 milhões ao mês em encargos, o que dá aproximadamente R$ 3 bilhões em todo o ano.
Esse foi o primeiro acordo mediado pela secretaria de Resolução de Conflitos do TCU, e inclui três das quatro termelétricas contratadas pela KPS no leilão emergencial. Elas terão a geração flexibilizada, ou seja, só serão acionadas caso haja necessidade no sistema, em momentos de escassez ou picos de potência, mas ainda receberão uma receita fixa para manutenção dos ativos.
Os processos administrativos referentes à KPS que tramitam na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) serão suspensos por esse período, mas poderão ser retomados a partir de janeiro de 2024, se o acordo não tiver novos desdobramentos ou for prorrogado.
O ministro do TCU Benjamin Zymler, relator do processo, afirmou em seu voto que há risco de que as liminares obtidas pela KPS garantindo recebimento integral da receita pela energia gerada se prolonguem durante toda a validade do contrato, até 2025, o que reforçou a oportunidade para um acordo que mitigasse os impactos nas contas de luz.
Segundo o ministro, a previsão de geração das usinas tinha sido concentrada nos meses de junho a outubro. Como existe um planejamento para compra do gás com um mês de antecedência, um acordo assinado agora passará a ter efeitos em julho, propiciando a redução no gasto do consumidor com energia de reserva.
Durante a vigência do acordo, a KPS não terá direito nem será obrigada a gerar 100% da energia das suas termelétricas, e terá preservação da eficácia das outorgas e da garantia física das usinas. Além disso, será encaminhado à Justiça um pedido para que as liminares percam eficácia.
Embora o acordo tenha sido celebrado pelos ministros do TCU durante a deliberação, representantes de consumidores de energia afirmam que ele é “desfavorável” aos consumidores. Em nota, a Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres (Abrace) destacou que, embora a redução na entrega do produto pela KPS seja de 85% no período do acordo, a redução da receita não será proporcional, e sim da ordem de 42%.
Assim, a empresa turca terá garantida uma “elevada” receita fixa para que as usinas permaneçam a disposição do sistema elétrico.
Segundo a Abrace, “a conciliação do TCU deveria ter se restringido às térmicas que honraram o contrato do PCS e cumpriram os prazos e que, portanto, teriam direitos em relação a venda de energia”. Já no caso de usinas que não cumpriram os contratos, como a KPS, a entidade defendeu que a Aneel conclua o processo decisório, parado há sete meses, “numa demora que tem permitido que algumas térmicas erem por meio de decisões judiciais e representam custo de R$ 255 milhões por mês aos consumidores brasileiros”.
É o caso das quatro usinas da KPS, que não entraram em operação no prazo devido pelo edital. A Aneel iniciou o processo de penalidade, que poderia levar à rescisão dos contratos, mas a empresa entrou com recurso administrativo pedindo excludente de responsabilidade, e o mérito do pedido não foi deliberado até o momento. Em paralelo, a empresa foi à Justiça e conseguiu as liminares que garantem sua geração e o recebimento integral do encargo pela energia, sem pagar nenhuma penalidade pelo atraso.
Apenas entre janeiro e abril, as usinas da Karpowership receberam cerca de R$ 980 milhões em encargo de energia de reserva, pagos pelos consumidores.
Segundo a Abrace, o descumprimento dos contratos do PCS deveria levar a aplicação de cláusulas contratuais para a descontratação da energia, a desobrigação de pagamento pelos consumidores, e ao pagamento de multas contratuais no âmbito da CCEE pelos agentes, “multas essas que chegam a R$ 13 bilhões e deveriam ser revertidas em favor dos consumidores”.
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