De olho na “demanda reprimida” por soluções no mercado de energia, o Bradesco, terceiro maior banco comercial do país, deu um passo esperado há muito tempo e montou sua operação própria de comercialização de energia elétrica.
A aposta do mercado financeiro no mundo da comercialização de energia elétrica começou em 2010 com o BTG Pactual, mas demorou para atrair casas mais atuantes no varejo. Foi em 2019 que o Santander entrou no mercado, seguido um ano depois pelo Itaú BBA. O mercado também atraiu outros players financeiros, como a Genial, que comprou a Celer em 2017, o Banco ABC Brasil, que iniciou as atividades na área em 2020, e a XP, que começou em 2021. Essa semana, foi a vez do Safra comprar a Give Energia, comercializadora da Ludfor.
O Bradesco passou um longo período avaliando qual a melhor alternativa para iniciar suas operações no mercado de energia elétrica. A compra de uma comercializadora acabou descartada, o banco decidiu começar do zero e, nos últimos meses, montou um time que será responsável pelo trading de energia, liderado por Ronaldo Torres, um dos responsáveis por montar a mesa do Banco ABC Brasil.
A comercializadora, que espera apenas o aval da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para começar a operar, ficará debaixo da tesouraria do banco, supervisionada por Bruno Cardoso, chefe de vendas, estruturação e negociação de crédito, e Nilton David, chefe trader da tesouraria.
Ronaldo Torres começou no banco em abril e, desde então, reforçou o time e atuou na elaboração do plano de negócios, que será voltado para a geração de valor para o cliente do Bradesco.
“Existe uma demanda reprimida por soluções de energia que possam resolver outras questões além do próprio risco de energia. Estamos conectados na tesouraria, temos acesso a todas as mesas, e isso permite que a gente ofereça produtos estruturados que resolvam as outras necessidades dos nossos clientes”, explicou Torres, em entrevista à MegaWhat.
Os clientes incluem geradores, consumidores e outras comercializadoras de energia. “Todos que forem clientes do banco, quando o banco entender que tem apetite por exposição a essas empresas, vamos oferecer soluções em energia”, explicou.
Análise de mercado e tomada de decisão
O retorno da volatilidade ao mercado livre de energia foi uma boa notícia para a equipe do Bradesco, já que aumenta as possibilidades de negócios e exige contrapartes com menor risco. “Seremos uma contraparte sólida para compra e venda de energia”, disse Torres.
As tratativas para a comercializadora, contudo, começaram antes desse movimento. Segundo Nilton David, quando os bancos começaram a apostar no trading de energia no país, a postura do Bradesco foi de entender melhor o mercado e os riscos envolvidos.
“Até que chegou o momento em que descobrimos que não poderíamos estar de fora. Aí a pergunta era: como vamos fazer? Vamos comprar uma comercializadora? Vamos comprar a estrutura, crescer organicamente? Esse processo levou mais ou menos um ano até entendermos o mercado, conhecermos as pessoas”, relatou.
Nesse período, o Bradesco colocou “todas as possibilidades na mesa”, mas entendeu que para sua estratégia o que melhor funcionaria seria começar do zero. “A gente entende de crédito, de relacionamento com o cliente, da necessidade do cliente, e dos tradings acessórios que podem vir com a energia, como de juros, de dólar, de opção”, explicou.
A ideia é que o banco absorva e faça a gestão de alguns riscos para os clientes, como cambial ou exposição ao reajuste em IGM-M e IPCA. “Se um gerador tiver disponibilidade para entrega futura, podemos comprar e pagar antecipadamente. Também podemos vender energia e dar prazo diferente pra pagar, por exemplo, adequando o fluxo de pagamento para a receita do cliente”, explicou Ronaldo Torres.
Próximos passos
Além do aval da Aneel, o Bradesco espera a autorização da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) e do Banco Central, que analisa os movimentos do banco enquanto instituição financeira.
Por enquanto, o banco fez a contratação de cinco profissionais, incluindo heads de cada área: jurídico, riscos, produtos e BackOffice. O processo incluiu até mesmo a abertura de uma conta na agência do Bradesco do Trianon, em São Paulo, exigência para todos os agentes da CCEE.
O orçamento contempla mais dez pessoas até junho do próximo ano, com vagas para middle e traders.
“Teremos mais fases de contratação em dezembro, março e em junho, quando esperamos ter o time completo. Enquanto os reguladores fazem a análise, seguimos definindo a governança interna e os produtos”, disse Torres.