As legislações estaduais referentes à distribuição de gás canalizado têm gerado um embate entre as distribuidoras de gás e os grandes consumidores do insumo. De um lado, os consumidores questionam regras conflitantes com o arcabouço legal federal, discutido por muitos anos e consagrado na Lei 14.134 de 2021, conhecida como a Nova Lei do Gás. Os distribuidores de energia, por sua vez, defendem que os estados têm competência para dispor sobre essas matérias.
Um posicionamento conjunto elaborado pelas associações Abrace, Aba, ATGás, Abividro, IBP, ABPIP, Abraceel, Anace, Anfacer e Aspacer* – todas ligadas a consumidores – afirma que as legislações estaduais aprovadas ou em tramitação causam preocupação, por muitos pontos estarem desalinhados com a Nova Lei do Gás, o que, defendem, prejudica a abertura do mercado de gás e afeta negativamente o consumidor.
Os estados da Paraíba, Maranhão, Pernambuco, Piauí e Ceará já aprovaram legislações sobre o tema, e o Rio Grande do Norte está em fase final de tramitação.
Entre os pontos de preocupação, os consumidores destacam que as leis estaduais são conflitantes com a legislação federal quando introduzem uma definição de gasoduto de distribuição que se sobreponha ou seja conflitante com a definição de gasodutos de transporte – o que é de competência da União. Outro ponto está na atribuição das agências reguladoras estaduais ao papel de classificar novos dutos e reclassificar os existentes.
As legislações estaduais, segundo o posicionamento, também impõem requisitos que dificultam a migração de consumidores para o mercado livre, criam taxas e encargos que oneram as transações no mercado livre, e se sobrepõem à regulamentação da atividade de comercialização de gás, que é atribuição da Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP).
“A definição, no nível estadual, de regras de classificação dos gasodutos de distribuição em desalinho com a regulação federal coloca em risco um dos grandes benefícios pretendido pelo novo mercado de gás, que é o da construção de um amplo mercado nacional integrado por meio do sistema de transporte, promovendo assim uma maior segurança de suprimento, maior disponibilidade e competitividade do insumo para todos os consumidores do país”, diz o posicionamento dos consumidores.
Os consumidores defendem que os estados ampliem as discussões sobre os temas, evitando retrocessos e conflitos com a legislação federal, ou que tornem mais lentos os processos de migração de consumidores livres.
A Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás) rebateu o posicionamento conjunto dos consumidores, alegando que cada estado tem competência para dispor sobre essas matérias, por meio de leis estaduais, com “escrutínio absolutamente público”.
“Desse modo, é legítimo que os gasodutos de distribuição sejam classificados por finalidade, independentemente da sua origem, pois a finalidade desses dutos é a prestação de serviços locais de gás canalizado que se destinem ao atendimento das necessidades de usuários, cativos ou livres, de quaisquer segmentos”, defende a Abegás.
Segundo a Abegás, o problema do mercado livre de gás não está na regulação, e sim na falta de oferta competitiva do insumo. Por isso, alega, o estado de São Paulo, que concentra grande parte da indústria consumidora de gás do país, não tem um único consumidor livre, apesar de já ter o mercado livre regulado.
“Nos causa estranheza que entidades que deveriam defender seus associados venham colaborando para a criação de barreiras à abertura do mercado de gás natural”, diz a nota da Abegás. A entidade completa ainda que as distribuidoras estão cumprindo seu propósito de buscar a universalização do gás natural.
*Quais consumidores assinaram a carta conjunta:
Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace)
Associação de Empresas de Transporte de Gás Natural por Gasoduto (Atgás)
Associação Brasileira das Indústrias de Vidro (Abividro)
Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP)
Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Petróleo e Gás (Abpip)
Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel)
Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace)
Associação Nacional dos Fabricantes de Cerâmica para Revestimentos (Anfacer)
Associação Paulista das Cerâmicas de Revestimento(Aspacer)