Mercado Livre

Covid-19: Quando a cláusula de caso fortuito ou força maior é aplicável?

Mesa de comercialização de energia / Crédito: reprodução da internet
Mesa de comercialização de energia / Crédito: reprodução da internet

A redução do consumo de energia por conta da paralisação da economia, em meio aos esforços adotados para barrar a pandemia do coronavírus (covid-19), terá repercussão também no mercado livre. Pedidos de abertura de contratos, embasados em cláusulas de força maior e caso fortuito, estão circulando nos principais escritórios de advocacia do país.

Enquanto o governo prepara uma série de ações voltadas para o mercado regulado, como encontrar recursos para subsidiar os consumidores de baixa renda, o mesmo não deve ser feito no mercado livre. Os contratos devem ser negociados caso a caso.

Mas o que deve ser feito para que a cláusula de força maior possa ser aplicada a um contrato bilateral de compra ou venda de energia? Seria um “cheque em branco” para que uma das partes possa abrir mão do contrato assinado?

Especialistas ouvidos pela MegaWhat explicam que não é bem assim. Os contratos devem ser discutidos caso a caso. 

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Segundo Rodrigo Leite, sócio do escritório Leite, Roston Advogados, na análise, a parte afetada, que solicitar a aplicação da cláusula, precisa comprovar o impacto do fato na execução do contrato e a inequívoca falta de controle da situação. 

Ou seja, se um consumidor quer renegociar um contrato de compra de energia, precisa comprovar que não tem condições de cumpri-lo, e não apenas que não conseguirá utilizar a energia contratada.

Nas últimas semanas, circularam amplamente entre os agentes do setor comunicados emitidos pelas comercializadoras da Cemig e da Votorantim Energia notificando os clientes da ocorrência de caso fortuito e força maior por conta do estado de calamidade pública. Em ambos os casos, tratou-se de cumprimento dos ritos e prazos determinados nos contratos. Assim, se houver necessidade de renegociação no futuro, as empresas estarão protegidas.

“Na minha visão, a alegação de força maior será mais forte para contratos que sejam vinculados a entrega de determinado volume de energia para determinada unidade consumidora”, disse o advogado Fabiano de Brito, do do escritório Mattos Filho. “Num português claro, não é ‘a festa do caqui”, disse ele, lembrando que a situação aguda está afetando todos.

Caberá a quem questionar o contrato provar que a crise provocada pelo coronavírus (covid-19) está, de fato, prejudicando sua condição de caixa, por exemplo. Por isso, a tendência é que os contratos sejam discutidos em acordos a cada caso.

“Eu diria que os contratos teriam que ser cumpridos, não sou flexível de achar que é caso fortuito”, disse Rafael Janiques, sócio do ASBZ Advogados.

Para o especialista, nesse caso pode ser aplicada a hipótese de onerosidade excessiva, passível de negociação entre as partes, já que a crise afeta tanto consumidores quanto vendedores de energia. “É caso fortuito para os dois lados, não só um. Não foi só no segmento de comercialização ou de geração. Então não faz sentido alguém ficar com energia descontratada e ter que vender no curto prazo ao piso, assumindo o prejuízo sozinho”, disse Janiques.

Será importante, na análise dos pedidos, descartar aqueles “oportunistas” que buscam brechas para abrir contratos. 

“Na crise em 2016 houve várias situações assim. Consumidores que compravam mais do que precisavam querendo devolver. Nessas situações, os contratos sempre foram mantidos, já que o conceito do contrato é ser celebrado justamente para estabilizar demanda e preço. Aí quando você precisa da estabilidade, pedem negociação?”, disse Brito.

Atrasos em obras

Outros possíveis usos das cláusulas de caso fortuito e força maior no setor elétrico dizem respeito ao atraso de obras. Novamente, nesses casos, será necessário provar que os atrasos estão diretamente relacionados à crise do coronavírus.

Segundo Janiques, seria importante a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) se manifestar sobre possíveis excludentes de responsabilidade no caso de atrasos causados pela crise. “No passado, a Aneel emitiu uma decisão garantindo ao ONS a possibilidade de flexibilizar as fiscalizações, por causa da greve dos caminhoneiros”, disse ele.

Projetos de geração que tenham atraso também terão que negociar possíveis postergações de contratos. A ideia defendida por advogados é que toda a duração do contrato seja deslocada por alguns meses. Assim, a duração total do empreendimento é mantida, e a viabilidade econômica também.

Nota: Editada às 11h15 de 02 de abril de 2020.

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