Mercado livre

Gold consegue cautelar e suspende execução de dívida por credores

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Foto: Pexels

Passados meses após os primeiros rumores de que a Gold Energia enfrentava dificuldades para honrar os contratos no mercado livre de energia, a comercializadora obteve nesta quinta-feira, 20 de fevereiro, uma medida cautelar para suspender por até 60 dias a execução de dívida, a fim de assegurar e preservar as atividades empresariais.

Ainda que a cautelar tenha efeitos práticos em parte semelhantes aos de uma recuperação judicial, a empresa trabalha com o cenário de resolver os impasses com credores sem uma maior intervenção da Justiça. Uma alternativa seria uma recuperação extrajudicial, a depender das conversas com os detentores das dívidas neste primeiro momento.

No pedido, ajuizado em 18 de fevereiro, a Gold alegou que suas atividades empresariais estão ameaçadas pelo “iminente ajuizamento” de medidas de execução que superam R$ 188 milhões. A MegaWhat apurou que esta é a chamada “dívida confessa” da comercializadora, e não contempla contratos futuros que ainda não venceram e, portanto, não são líquidos hoje nem podem ter valor atribuído sem uma discussão entre as partes.

A Casa dos Ventos chegou a ingressar com o pedido de execução da dívida da empresa, e outros credores informaram que seguiriam o mesmo caminho, o que levou a Gold a buscar a proteção da cautelar antes de uma mediação.

O pedido foi analisado pelo juiz Leonardo Fernandes dos Santos, da 3ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da Justiça de São Paulo, que inicialmente deu prazo de 15 dias para que fossem juntados aos autos documentos comprovando a situação da empresa, como balanços patrimoniais e demonstrações de resultados dos últimos três anos, relação completa dos credores, empregados, bens particulares dos sócios e administradores e extratos de contas bancárias. Após a entrega dos documentos, o juiz deferiu a cautelar.

A Gold pediu ainda a instauração de um procedimento de mediação com seus principais credores na Aliar – Câmara Especial de Resolução de Conflitos Empresariais. A lista dos credores convidados inclui grandes empresas, como Alcoa, Arcelormittal, Auren, BTG Pactual, Enel, Casa dos Ventos, Statkraft, Vale, Tereos e Norsk Hydro.

Máxima, volatilidade de preços e baixa liquidez

No pedido de cautelar, assinado pelo escritório Thomaz Bastos, Waisberg, Kurzweil Advogados, a Gold alega dificuldades financeiras temporárias causadas pelas “drásticas condições climáticas” de 2024, quando o PLD sofreu intensa volatilidade.

A situação da Máxima Energia, que teve problemas para honrar os contratos antes da Gold e conseguiu uma cautelar, é ainda citada como responsável, porque causou um cenário de instabilidade que levou vários agentes a manifestarem interesse pela rescisão de contratos, agravando a crise.

“Igualmente, como tentativa de proteção de uma crise que sequer tinha começado, diversos credores deram início ao ajuizamento de demandas judiciais para pleitear a rescisão de seus contratos e a cobrança de valores. Foi assim que os meros ‘boatos’ se materializaram, acelerando – ou até mesmo a criando – a momentânea crise que hoje afeta as requerentes. De fato, a escalada desse ciclo culminou no atual e delicado cenário de risco às operações diárias da Gold Comercializadora”, diz o pedido à Justiça.

A crise da Gold se desenhou em meados de 2024, quando o PLD saiu do piso, na época de R$ 61,74/MWh, e chegou ao máximo de R$ 1.470,57/MWh com a intensa volatilidade durante os meses secos do ano.

Em setembro, a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) colocou a Máxima e a Mill Comercializadora na “operação balanceada”, com limitação no registro de novos contratos para evitar aumento da exposição ao mercado.

Afetada pelas negociações de “haircut” – jargão do mercado financeiro para desconto, ou calote, em parte da dívida -, a Gold sofreu com a piora nas condições de mercado, já que houve uma redução significativa da liquidez, dificultando operações via mercado para solucionar os problemas para honrar os contratos bilaterais.

No caso da Gold, o problema escalou porque a empresa atuava sem restrição de crédito com quase todas as contrapartes. Em julho de 2024, foi a quinta comercializadora do país em termos de vendas de energia, atrás apenas de Santander, Raízen Power, BTG e Auren.

Distratos e crise postergada da Gold

O mercado de energia ainda repercutia a crise da Máxima quando James Oliveira, sócio fundador da Vinland Capital e responsável por aportar recursos significativos na fundação da Gold, em 2020, exerceu uma cláusula contratual e saiu da comercializadora. Cassiano Agapito continuou no comando, e contratou a consultoria Alvarez & Marsal para viabilizar transações com as contrapartes envolvidas e ajudar nas negociações de distratos.

Na ocasião, muitos agentes iniciaram tratativas para executar a Gold judicialmente, mas a empresa conseguiu negociar distratos e evitar o pior cenário em termos de contaminação no mercado de energia. Entre o fim de outubro e meados de novembro, foram assinados mais de 70 distratos, totais ou parciais, com mais de 180 contrapartes, eliminando o risco de um problema em cascata contaminando o mercado, mas os desafios permaneceram.

É o caso da Casa dos Ventos, que, ao pedir a execução da comercializadora, cobrou valores decorrentes de 27 contratos de compra e venda de energia registrados na BBCE. No documento, alega que a Gold deixou de pagar R$ 80,7 mil em janeiro, o que levou ao vencimento antecipado dos contratos, que somam R$ 28,99 milhões, mais uma multa rescisória de R$ 18,3 milhões. O valor, contudo, deve ser contestado pela comercializadora na mediação que será instaurada.

Segundo fonte ouvida pela reportagem sob condição de anonimato, a Gold ainda avalia a estratégia a seguir durante a mediação. Em dezembro, Cassiano Agapito chegou a fazer um aporte de R$ 15 milhões na empresa, na forma de adiantamento para futuro aumento de capital (Afac).

Procurada, a Gold informou por meio da assessoria de imprensa que não daria entrevista.

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