Os efeitos da pandemia do coronavírus (covid-19), em si, não justificam acionamento de cláusulas de força maior e caso fortuito em contratos de compra e venda de energia no mercado livre, defende o advogado Julião Coelho, especialista no assunto.
Segundo ele, é necessário avaliar se há, de fato, um obstáculo intransponível ao cumprimento da obrigação contratual.
“A pandemia é generalizada, e afeta todas as partes. A rigor, se fosse assim, todos os contratos seriam desfeitos, compradores e vendedores, de todas as cadeias e de todas as indústrias”, disse Coelho, que aconselha muito diálogo entre as partes.
Hoje à tarde, a MegaWhat revelou que a administradora de shopping centers BR Malls conseguiu duas liminares na Justiça contra Engie e EDP para pagar apenas a energia faturada, e não a contratada, alegando força maior. As decisões, contudo, são vistas como frágeis, uma vez que as outras partes não chegaram a ser ouvidas e não houve análise real do mérito.
Os contratos são vinculados à cláusulas de arbitragem, e as liminares só podem ter a duração de 30 dias, prazo em que a BR Malls precisa requerer a instituição de arbitragens para os pleitos. Será necessário comprovar que a companhia não tem, de fato, os recursos para cumprir seus contratos.
Coelho disse não conhecer os casos a fundo, mas lembrou que nesse tipo de caso, em que é acionada a Justiça comum, os juízes não têm domínio do funcionamento do setor elétrico. Quando os vendedores de energia puderem explorar o contrato e explicar a situação, as chances de reversão dessas liminares aumentam.
Segundo o advogado, a força maior nesses casos é questionável porque se o consumidor não for utilizar a energia contratada, ele pode ceder à outra parte ou liquidar no mercado de curto prazo. “Todas essas discussões, ao final, se resumem à diferença entre o valor de venda do contrato e o PLD”, disse ele. “Se o PLD estivesse alto, nenhum consumidor ia falar em caso fortuito e força maior”, completou.
A tese de que o contrato confere onerosidade excessiva ao consumidor também foi rebatida por Coelho. Segundo ele, para isso, o comprador de energia deveria mostrar que o vendedor está obtendo “vantagem extrema”, o que não existe, já que ocorre o cumprimento de um contrato. “Ele assumiu pagar um preço pela energia e deixou a flutuação do PLD como risco do vendedor, que ‘perde’ quando o PLD está maior e ‘ganha’ quando está menor”, disse.