O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, voltou a defender a ação direta de inconstitucionalidade que questiona o limite de 10% no direito a voto de todos os acionistas da Eletrobras, incluindo a União. Segundo ele, a ideia é que a União possa indicar quatro conselheiros de administração para a companhia, refletindo sua participação de 43%, e isso não significa uma reestatização da empresa, assunto que é pauta superada no governo.
Uma reestatização da Eletrobras era a prioridade do governo, num primeiro debate interno. “Eu compreendo, até então, que o debate foi vencido e o governo decidiu pelo segundo caminho, por ter uma participação efetiva”, disse Silveira, durante participação no Seminário Brasil Hoje, organizado pelo grupo Esfera, nesta segunda-feira, 15 de maio.
“Ela vai continuar, a não ser que tenha uma mudança legislativa, sendo uma empresa privada”, disse Silveira. Para ele, uma participação “mais substancial” da União na Eletrobras não vai mudar sua natureza jurídica.
Inicialmente, era prevista a presença do presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Junior, no mesmo painel de Silveira, mas este não compareceu, e o debate aconteceu com a participação do presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas, o procurador-geral da República, Augusto Aras, e o presidente do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires.
“O mercado enxerga que essa é uma situação muito ruim, porque você acaba assustando o investidor no início do governo”, disse Pires. Segundo ele, o governo tem o direito de colocar suas ideias em prática, mas o problema está em “olhar para trás e contestar o que foi aprovado no Congresso” com uma proposta que iria “macular o modelo de corporation”, permitido pela Lei 6.404, conhecida como Lei das S.A. e também pela Lei 14.182, que autorizou a privatização da Eletrobras.
O ministro Silveira, contudo, disse entender que não há contradição entre o discurso do governo sobre respeito aos contratos e a ação que questiona o limite no poder de voto da Eletrobras. Para ele, a judicialização para questionar “os direitos políticos” do governo na Eletrobras converge com a posição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva desde as eleições.
“O presidente nunca escondeu de ninguém e ganhou as eleições com esse discurso, e desde o princípio houve o pedido dele para que fosse estudado o processo que pudesse reestabelecer e reestatizar a empresa”, disse.
Caso o Supremo Tribunal Federal (STF) dê razão à União, permitindo o direito de voto correspondente à sua participação de 43% na empresa, o modelo de corporation será garantido, segundo o ministro, pelas imposições da golden share e da poison pill do estatuto da empresa.
A golden share é uma ação especial que garante ao governo poder de veto em questões estratégicas da companhia, como por exemplo possível mudança de sede ou de nome. Já a poison pill, jargão do mercado financeiro que se traduz como ‘pílula de veneno’, é uma cláusula que obriga um investidor que queira comprar o controle da companhia e pagar um prêmio significativo em relação ao valor das ações no mercado. Se for uma oferta da União para recomprar o controle, o prêmio é maior ainda.
Além disso, Silveira disse que a judicialização dessa questão não significa uma ruptura de qualquer regra jurídica ou contrato, “pois o governo está usando meios que lhe são facultados pelo estado democrático de direito”.
“Precisamos pensar em, daqui para a frente, conseguir construir alguma coisa positiva, esse ambiente não está saudável. Temos que trazer um ambiente mais saudável para discutir a questão da Eletrobras, sempre preservando a questão da segurança jurídica, a estabilidade regulatória, e o respeito aos contratos. Acho que o governo não foi feliz, está incomodando sim, poderia ser de outra forma. Está na hora de uma conversa maior para se chegar a uma solução palatável para os acionistas da Eletrobras, o governo e todo mundo”, disse Adriano Pires.
Embora a percepção do mercado, transmitida por Pires, seja negativa sobre a iniciativa da União, o governo poderia interferir, de fato, caso buscasse outras ferramentas, como interferir na outorga ou cassar a concessão das hidrelétricas da companhia, disse o ministro Bruno Dantas, presidente do TCU.
“O sentimento que eu tenho é que quando uma ilegalidade flagrante é identificada, o Supremo se manifesta rápido”, disse Dantas, destacando que isso não significa que ele tenha conhecimento sobre o caso, mas sim que sobre ser alguém “que conhece a cena do judiciário”.
Já o procurador Augusto Aras disse que não poderia se manifestar sobre o mérito da ação, já que pode ser necessária manifestação da PGR no caso. “Mas, preciso registrar que nós teremos um país melhor e mais seguro na medida em que respeitemos princípios como autocontenção, a segurança jurídica que promove estabilidade econômica e política”, disse, se referindo ao termo jurídico para quando o Judiciário busca reduzir sua interferência nas ações dos outros Poderes.