Uma intensa discussão sobre a aplicação da regra de transição para a tarifa de transmissão para geradores que participaram de leilões, objeto da Consulta Pública 67/2021, terminou sem desfecho na reunião desta terça-feira da diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
O diretor Hélvio Guerra pediu vista do processo, que tinha dois encaminhamentos possíveis, do diretor relator Sandoval Feitosa e um alternativo proposto por Efrain Cruz, que divergiram sobre a manutenção, ou não, de uma regra de transição imposta apenas quando os geradores forem beneficiados. Para Sandoval, o lado do consumidor também deve ser considerado na equação, o que justificaria o fim da regra de transição.
O processo teve origem em pedidos apresentados pelas usinas estruturantes do rio Madeira (RO), Santo Antonio e Jirau, que tiveram definido por seus respectivos editais que suas tarifas de uso do sistema de transmissão (Tust) seriam fixadas por 10 anos. A partir daí, passaram a ser calculadas de acordo com o sinal locacional, o que vai resultar numa redução significativa do custo de transmissão de energia aos empreendimentos.
O problema é que em 2013, a resolução normativa 559 da Aneel criou um período de transição de dois anos para alterações no cálculo da Tust. Para Jirau e Santo Antonio, isso significaria mais dois anos com uma Tust incompatível com o uso efetivo do sistema pelas usinas, com a possibilidade de uma tarifa ainda maior que a paga atualmente.
O pleito específico de Santo Antonio está com a relatoria da diretora Elisa Bastos, mas o pedido resultou na consulta pública que teve o desfecho discutido hoje, que deve culminar numa regra geral a ser seguida a partir de agora.
Nas contribuições da consulta, muitos geradores propuseram que a regra de transição só deveria ser aplicável em casos favoráveis ao empreendedor, citando jurisprudências do Supremo Tribunal Federal (STF). Houve também pedidos de que o regulador priorizasse a Consulta Pública 39/2021, de relatoria de Hélvio Guerra, que tem conteúdo mais abrangente e debate uma possível estabilização da tarifa de transmissão por toda a outorga dos projetos de geração.
O relator do processo, diretor Sandoval Feitosa, citou preocupação com a aplicação de uma regra de transição favorável apenas aos geradores, uma vez que a redução da cobrança da Tust dos geradores implica em maior tarifa aos consumidores de energia. “A Aneel sempre perseguiu equilíbrio entre geração e carga no custeio dos encargos de transmissão. Uma regra de transição apenas para benefício dos geradores significa desbalanceamento sem qualquer compensação”, disse o diretor.
Em seu voto, ele propôs o afastamento da regra de transição cuja Tust tenha sido estabelecida quando era vigente a resolução normativa 267/2007 – que ditou os editais dos leilões de Jirau e Santo Antonio -, ao mesmo tempo em que manteve a regra para os geradores que tiveram a Tust revisada até o ciclo 2021/2022.
Assim, a regra de transição deixaria de existir, e as exceções, como no caso das usinas do rio Madeira, seriam debatidos caso a caso pela agência reguladora.
O diretor Efrain Cruz se opôs ao entendimento. “O direito diz que não pode haver regra de transição, em ambiente jurídico ou regulatório, que tenha o condão de ser mais gravoso do que o que você já tem”, disse, se referindo aos pleitos das usinas que pediram a manutenção da regra de transição apenas nos casos em que isto for favorável a elas.
Efrain defendeu o cumprimento da regra dos editais que seguiram a resolução 267/2007, já que, segundo ele, a Tust estabilizada por 10 anos foi um dos componentes que justificou o lance dos empreendedores vencedores dos certames para concessão das hidrelétricas.
Por sugestão da diretora Elisa Bastos, o diretor Sandoval propôs retirar do seu voto o item que falava em manter a regra de transição para o ciclo 2021/2022, já que todos os diretores concordaram que a transição não deveria ser aplicável nos casos que seguiram exclusivamente a resolução 267.
Ainda assim, o diretor Efrain manteve o entendimento de que a resolução 559/2013 deve ser aplicada para casos em geral. “É algo que mantém a segurança jurídica e regulatória em nossos contratos. É uma regra bem elaborada e com a participação de todos os agentes públicos”, disse o diretor. “E afastamos a aplicabilidade dela para usinas em que ela opere em desfavor”, completou.
Com os dois encaminhamentos de voto abertos, o diretor Hélvio Guerra pediu vista para analisar o caso com profundidade. O diretor-geral, André Pepitone, estava ausente.