Óleo e Gás

Para mercado de gás, revisão de regras de transporte vai melhorar segurança jurídica dos contratos

A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) está em fase de conclusão de duas consultas públicas sobre transporte de gás natural, que devem aprimorar a contratação de transporte em gasodutos existentes, além de estipular as tarifas dos próximos anos. As potenciais novas regras devem aprimorar a segurança jurídica dos contratos e dar celeridade aos processos de contratação dos gasodutos, mas ainda há melhorias fora do radar, como a integração entre as transportadoras.

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A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) está em fase de conclusão de duas consultas públicas sobre transporte de gás natural, que devem aprimorar a contratação de transporte em gasodutos existentes, além de estipular as tarifas dos próximos anos. As potenciais novas regras devem aprimorar a segurança jurídica dos contratos e dar celeridade aos processos de contratação dos gasodutos, mas ainda há melhorias fora do radar, como a integração entre as transportadoras.

A consulta pública nº 12/2023 (CP 12) tem como objetivo revisar as regras para transporte firme em capacidade existente, e a consulta pública nº 15/2023 (CP 15) busca estabelecer novo arcabouço tarifário. Os prazos de contribuição já foram encerrados, mas a agência reguladora ainda não deliberou sobre os resultados.

Agentes ouvidos pela MegaWhat consideram o movimento positivo e, no geral, adequado ao atual nível de amadurecimento do mercado brasileiro de gás natural, que ainda se adapta à condição de mercado aberto após a promulgação da Nova Lei do Gás (Lei 14.134/2021). “A cada ano, a gente vai aprendendo mais. E os carregadores também vão aprendendo a usar mais o sistema”, diz Cristina Sayão, gerente de assuntos regulatórios da Transportadora Associada de Gás (TAG), sobre o modelo de contratação de entrada e saída.

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A CP 12 estuda retirar a obrigatoriedade de chamada pública para a contratação de transporte na modalidade firme em gasodutos existentes. Na prática, a contratação sem chamada pública já vem ocorrendo desde 2022, mas para contratos na modalidade de extraordinários. A inovação foi aprovada pela ANP para dar mais dinamismo ao mercado já que, segundo a agência, uma chamada pública leva cerca de sete meses até ser concluída.

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[No contrato extraordinário] a qualidade do serviço é uma qualidade de base firme mas, pela regulação atual, caso existisse uma chamada pública e alguém solicitasse serviço de transporte firme, haveria uma condição resolutiva, ou seja, esses contratos cairiam”, explica Sayão.

Outra inovação da CP 12 é a possibilidade de contratação em um prazo de cinco anos, contra um ano dos atuais contratos extraordinários. Sayão explica que os contratos continuariam com a duração de 12 meses, mas a proposta é que seja possível acertar o início do serviço para até cinco anos à frente. Na opinião da especialista, a nova formatação proporciona melhor continuidade e previsibilidade dos serviços, mais segurança jurídica aos agentes e mais celeridade ao processo de contratação.

Para a sócia do escritório Veirano Advogados Lívia Amorim, estes benefícios poderão ser alcançados com segurança, pois a regulação garante a isonomia na contratação mesmo sem as chamadas públicas. “O transportador já tem a obrigação de não ser discriminatório e tem preços regulados”, avalia Amorim. “Estamos falando de gasodutos já construídos, uma capacidade que já está regulada”, concorda o sócio do escritório Vieira Rezende, Thiago Silva.

Novas tarifas, mesma receita

Já a consulta pública nº 15 pretende estipular as tarifas para o ciclo 2024-2028 da pelas empresas TAG, Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil (TBG) e Transportadora Sulbrasileira de Gás (TSB). A Nova Transportadora do Sudeste (NTS) está fora do processo porque teve sua proposta tarifária considerada inadequada pela ANP. A Gasocidente do Mato Grosso (GOM) não enviou proposta tarifária dentro do prazo solicitado pela agência.

Procurada, a NTS informou que “já entregou toda documentação necessária para a ANP. A empresa cumpriu todos os prazos estabelecidos com o envio das informações para proposta tarifária, como consta na nota técnica da ANP”.

O uso de consulta pública para revisão tarifária só ocorreu anteriormente para a TBG, em contexto de três contratos legados em vias de expiração. Segundo explica o diretor comercial e regulatório da TAG, Ovídio Quintana, o processo não foi semelhante ao que ocorre agora, pois os contratos legados continuam vigentes.

Mesmo assim, a empresa considera o diálogo positivo. “Acho que é muito saudável e muito importante que a consulta da proposta tarifária tenha sido iniciada, ainda que transportadoras como a NTS e TAG não estejam no momento de reavaliar a sua base regulatória de ativos”, diz Sayão.

Como a receita máxima permitida (RMP) para as transportadoras é calculada a partir dos contratos legados, a proposta tarifária para empresas como TAG e NTS, que não têm contratos legados em expiração, deve sempre observar a RMP. “O que hoje acontece é que, ao invés de receber 100% dessa receita da Petrobras, tudo que a gente recebe desses novos contratos, a gente abate do que a Petrobras tem a pagar para a gente. Então a gente recebe a mesma coisa, sendo uma parte paga pelos novos clientes e o restante pago pela Petrobras”, explica Cristina Sayão.

Receita de penalidades reduz em até 19% a proposta tarifária da TAG

Para formular as tarifas propostas à ANP, a TAG considerou fatores como a capacidade liberada pela Petrobras na malha e expectativa de novos contratos, calculada com base no histórico. Entra também outro fator que é uma antiga queixa de carregadores e consumidores: as penalidades, excedentes e múltiplos, que são consideradas demasiadamente complexos por quem está nas pontas da cadeia.

“Enquanto o mercado amadurece, as penalidades podem ser vistas sim como algo complexo e um risco, talvez, muito grande para ser tomado por quem não domina. Mas eu vejo que é algo que vai naturalmente deixar de ser um problema à medida que o mercado de gás brasileiro amadureça”, avalia Thiago Silva, do Vieira Rezende.

Cristina Sayão, da TAG, explica que estas cobranças têm como objetivo orientar o comportamento dos agentes em um mercado recém-aberto e não representam receita para as transportadoras, que precisam obedecer a RMP. Assim, os valores recebidos desta forma são calculados ao fim do ano fiscal e voltam ao mercado no próximo ano, como desconto na tarifa. Com base nas penalidades, excedentes e múltiplos recebidos em 2022, por exemplo, a TAG propõe uma redução de 11% nas tarifas para 2024. E, para 2025, o desconto pode chegar a 19%.

Entretanto, talvez ainda seja preciso reduzir mais. “As penalidades são bastante leoninas e elas se somam [quando há necessidade de passar por mais de uma transportadora]. Então, você tem um desconto na tarifa básica, mas na penalidade pode ser que não fique tão atrativo”, diz o Diretor de Comercialização e Novos Negócios da PetroReconcavo, João Vitor Moreira.

Ele avalia que a tarifa de transporte ainda responde por “um percentual bastante elevado” do custo do gás para o consumidor, o que acaba reduzindo a competitividade da molécula. Para tentar equilibrar os custos, a PetroReconcavo tem enxugado outros elos da cadeia, mas ainda é preciso reduzir o preço do transporte. “As propostas [de mudanças na regulação] vêm no bom sentido, mas a gente não pode se conformar em métricas parecidas com as atuais”.

Integração entre transportadoras

Entre os aspectos que poderiam avançar mais, também está uma maior integração entre todas as transportadoras. “Para ter interoperabilidade, é preciso ter padronização das regras”, diz Lívia Amorim, do Veirano Advogados.

As empresas estão trabalhando nesse sentido. “Se o carregador tem que negociar contratos com três empresas, é muito difícil comparar e o processo de contratação fica muito lento”, reconhece a gerente de assuntos jurídicos e regulatórios da Associação de Empresas de Transporte de Gás Natural por Gasoduto (ATGás), Marina Cyrino. “Existe um grande desejo das transportadoras de que a gente consiga trazer um contrato unificado para o mercado. A gente já está trabalhando, isso não é um movimento que está vindo do regulador”, finaliza.

Tendência já consolidada no mercado são os contratos master, que definem antecipadamente questões como penalidades e pagamento. Assim, é possível contratar rapidamente por meio do Portal de Oferta de Capacidade (POC) de acordo com a disponibilidade das transportadoras. João Vitor Moreira conta que a PetroReconcavo já tem contratos master com a TBG e NTS. “Como eu tenho um contrato master eu só vou entrar num termo final, que é o termo de contratação por aquele período, aquela vazão e o preço pré-definido”, diz.