Conta de luz

Tarifa Social é insuficiente para reduzir impacto da conta de luz para 57% dos brasileiros

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Painel solar em Comunidade / Crédito: Ricardo Botelho (MME)

A Tarifa Social de Energia Elétrica (TSEE) tem sido insuficiente para diminuir o impacto da conta de luz no orçamento das famílias de baixa renda no Brasil. Essa é a realidade para 57% dos participantes de pesquisa da Inteligência em Pesquisa e Consultoria (IPEC), encomendada pelo Instituto Pólis.  

Segundo o levantamento, os gastos com a conta de luz comprometem principalmente o orçamento financeiro de 52% e 65% das famílias do Nordeste e do Norte, respectivamente.

No Norte, a energia é o item que mais compromete a renda das famílias, saindo na frente de gastos com saúde (26%), alimentação (36%) e gás de cozinha (37%). No Nordeste, a conta de luz empata com a alimentação, seguida por saúde (31%) e gás de cozinha (36%).

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Na análise do instituto de pesquisa, as tarifas de energia dessas regiões tendem a ser mais elevadas principalmente pelo contexto de baixa densidade populacional, que pode resultar em custos de distribuição e transmissão mais elevados por unidade de energia consumida.

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Além disso, a infraestrutura de transmissão de energia elétrica nessas áreas, muitas vezes, enfrenta desafios logísticos e geográficos significativos como a extensão territorial e as condições climáticas adversas, o que pode aumentar os custos de manutenção e operação, conforme dados do estudo.

Nas regiões Centro-Oeste e Sul, o custo com energia é o segundo colocado do ranking de gastos, respondendo a 45%. Já no Sudeste, a conta de luz corresponde a 46%. Nas três regiões a alimentação é o maior custo.

Tarifa Social de Energia Elétrica beneficia os consumidores enquadrados na subclasse residencial baixa renda com a isenção do custeio da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) e do custeio do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa). Além dessas isenções, no restante da tarifa residencial são aplicados os descontos, proporcional a faixa de consumo.

Até julho deste, a tarifa social respondeu por R$ 1,5 bilhão dos subsídios do setor, ficando atrás das fontes incentivadas ( R$ 5,9 bilhões); da geração distribuída (R$ 5,3 bilhões); e da Conta de Consumo de Combustível (R$ 4,3 bilhões).

O levantamento do Ipec foi realizado entre 22 e 26 de julho de 2023, contou com duas mil respostas, e seu resultado foi apresentado nesta quinta-feira, 11 de julho, em seminário na Câmara dos Deputados.

A conta e as fontes de energia das áreas

O Brasil possui capacidade instalada de geração de 206,5 GW, sendo que o maior destaque corresponde às hidrelétricas (incluindo PCHs e CGHs), com 53,2%.

Apesar de ter 30% dessas usinas instaladas na região, o Norte possui a tarifa média mais cara do Brasil — 0,849 R$/kWh, significando uma conta de luz 24% mais cara que a região com menor tarifa, a Sul — 0,642 R$/kWh.

Com contas mais elevadas, o Norte também lidera a lista de inadimplentes, com 22% dos entrevistados afirmando que têm contas em atraso. No Centro-Oeste, Nordeste, Sudeste e Sul, a taxa varia de 9% a 18%.

O que é cobrado na conta de luz?

Quando perguntados quanto à implementação de uma política tarifária complementar à tarifa social, 2/5 dos entrevistados concordam com a solução como forma de justiça tarifária. Para 44% dos respondentes, os impostos/tributos federais, estaduais e/ou municipais são os principais fatores para o aumento da tarifa de energia elétrica.

A pesquisa ainda identificou uma parcela expressiva da população que não sabe opinar sobre o assunto. Na análise do Ipec, isso sinaliza um desconhecimento dos brasileiros sobre a composição e destino da tributação, assim como o seu reflexo no cálculo da conta de luz.

Alimentação e a solução da tarifa de energia

pesquisa aponta que caso a conta de luz fosse reduzida pela metade, a maioria das famílias questionadas utilizaria o dinheiro não comprometido para alimentação, sendo que 50% usaria o recurso liberado para a compra de alimentos básicos.

De acordo com o estudo, para 84% dos brasileiros, a energia elétrica deveria ser um direito fundamental garantido pelo Estado. Além disso, os entrevistados defendem que a falta de capacidade de pagamento da conta de luz não deve sujeitar as famílias inadimplentes a cortes de fornecimento, visto que o acesso à energia elétrica deveria ser assegurado como direito inviolável.

Justa para quem?

Carla Achão, superintendente de Estudos Econômicos e Energéticos da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), destacou que para o debate sobre a transição energética justa e inclusiva no país é preciso entender quem são esses grupos.

“É um esforço imenso, no sentido de, não só ter os dados e informações para a entendermos a realidade e termos uma base de indicadores de pobreza energética, mas de olhar a realidades dos diferentes segmentos para fazer políticas e aprimorar as existentes. Nós [EPE] e o Ministério de Minas e Energia estamos elaborando um estudo para buscar o desenvolvimento energético e a erradicação da pobreza”, disse Achão.

Do lado dos consumidores, Leonardo Araújo, consultor de Comunicação e Relações Institucionais da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, apontou que o consumidor paga a conta de luz duas vezes, via tarifa de energia e no preço de produtos de serviço, já que cerca de 30% do custo de alguns itens é energia elétrica. 

“Hoje, temos a participação do Congresso e do Poder Executivo e percebemos que, apesar da narrativa ser preponderante a favor do consumidor, na prática, projetos de lei, políticas públicas e preposições em geral acabam levando na direção contrária. Alguns projetos do Congresso, na verdade, acabam aumentando os custos de energia do consumidor”, falou Araújo, complementando que para alcançar a transição energética justa no Brasil é preciso resolver o problema de pobreza energética.

Alessandra Matias, analista de conservação da WWF, concordou com o representante da Frente e acrescentou que os consumidores do Sistema Isolado e de comunidades quilombolas, ribeirinhas e indígenas ainda gastam antes de ter acesso à energia, já que muitos precisam se deslocar de suas residências para comprar combustível. 

Outros representantes de entidades ligadas às favelas, ao clima, de estudos de políticas sociais também falaram no debate e defendem que os consumidores, principalmente de baixa renda, precisam ter acesso à energia de forma barata como forma de ter dignidade e garantir sua segurança alimentar