Por: Bianca Wolf, Marvin Menezes, Nathalia Moraes e Patricia Dayrell*
À medida que se encerra o primeiro trimestre de 2025, o momento é propício para avaliar os desdobramentos das expectativas traçadas no início do ano e os impactos das discussões em curso no setor. Mais do que nos basearmos apenas em projeções, é fundamental ancorar as análises nos eventos concretos que vêm moldando o presente e definindo os rumos do mercado.
No final de 2024, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) aprovou a Agenda Regulatória 2025-2026, estruturando um plano para debater temas técnicos que exigem soluções objetivas no curto prazo. Essa agenda abrange diversos eixos temáticos que dialogam diretamente com os desafios do setor, destacando-se:
A resiliência do sistema elétrico diante de eventos climáticos extremos tem se tornado um tema de crescente relevância devido aos impactos das mudanças climáticas, que tornam interrupções no fornecimento de energia mais frequentes e graves. O aprimoramento regulatório das redes de transmissão e distribuição é indispensável para mitigar os prejuízos enfrentados pelos consumidores, que acabam arcando com as consequências financeiras e sociais dessas falhas. Nesse sentido, a recente aprovação pela ANEEL do termo aditivo aos contratos de concessão de distribuição reforça a necessidade de ajustes regulatórios que garantam maior segurança ao sistema e melhores condições para a prestação do serviço.
Nesse contexto, a Consulta Pública nº 32/2024 surgiu como um esforço complementar, ao propor medidas para aumentar a resiliência das redes elétricas. Segundo a programação da Agenda Regulatória, a Análise de Impacto Regulatório (AIR) deverá ser elaborada ainda no primeiro semestre de 2025. No entanto, embora as iniciativas da ANEEL representem um avanço, o custo de implementação dessas medidas tem gerado debates acirrados, sobretudo porque as distribuidoras apontam um impacto financeiro significativo, estimando gastos de até R$ 2 bilhões apenas com compensações aos consumidores por apagões. A disponibilização da minuta do termo aditivo nos contratos de concessão reforça esse cenário, ao estabelecer novas diretrizes que ampliam as responsabilidades das distribuidoras, evidenciando a necessidade de um equilíbrio entre resiliência do sistema e viabilidade econômica.
Outro tema relevante é o incentivo à inovação regulatória, com destaque para os programas de sandbox tarifário. Essa iniciativa busca fomentar a experimentação de novas modalidades tarifárias e formas de faturamento da conta de energia elétrica em ambientes controlados (sandboxes), permitindo a aplicação de soluções inovadoras voltadas aos consumidores de Baixa Tensão (consumo residencial).
Atualmente, há cerca de nove projetos-pilotos em execução, embora em diferentes estágios de desenvolvimento, todos com prazo para apresentação do relatório conclusivo até julho de 2027. Por essa razão, a ANEEL lançou a Tomada de Subsídios nº 27/2024 com o objetivo de consolidar informações sobre os projetos em andamento e ampliar a transparência do processo. Além disso, a consulta visa colher contribuições da sociedade sobre a condução, o acompanhamento e a divulgação dos resultados parciais e finais dessas iniciativas. Essa ação demonstra um esforço da agência reguladora em alinhar inovação e participação social, promovendo um diálogo mais inclusivo e colaborativo sobre o futuro das tarifas de energia.
Dentre os projetos-pilotos, destacam-se:
- Conta inteligente – Projeto desenvolvido pela Energisa que vai experimentar três novas modalidades: Tarifa melhor hora com valores diferentes para consumo ao longo do dia; dinâmica trimestral com ajustes a cada três meses sem impactos de bandeiras tarifárias e o Plano pré-pago que permite ao usuário o melhor controle de seus gastos.
- Abertura do mercado para Baixa Tensão – Projeto está sendo testado por quatro distribuidoras de pequeno porte (CERTEL, CERTEKA, COPREL e CERBRANORTE) nos Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Os testes iniciaram em janeiro de 2025.
- TARIFA-HORO-SAZONAL-LOCACIONAL (HSL) – Projeto desenvolvido pela Equatorial que vai testar tarifas que variam ao longo do dia e ao longo dos meses do ano com o objetivo de ajustar os preços com o volume de utilização do sistema de distribuição em diferentes períodos do ano.
Além da agenda setorial, destacam-se os leilões de energia. O Ministério de Minas e Energia (MME) publicou diretrizes para o leilão de energia nova A-5, previsto para julho, com foco em hidrelétricas de pequeno porte. No entanto, sem sombra de dúvidas, a Portaria Normativa nº 97 foi a mais aguardada pelo setor. Com a sua publicação em janeiro, a norma regulamentou o Leilão de Reserva de Capacidade em Potência (LRCAP), marcado para 27 de junho, incluindo térmicas a gás, biocombustíveis e, pela primeira vez, hidrelétricas. A ANEEL, por sua vez, abriu a Consulta Pública nº 010/2025 para discutir o edital desse leilão, permitindo a participação de agentes do setor na definição dos critérios do certame.
Há também um leilão para os sistemas isolados, visando à descarbonização desses sistemas, que ainda dependem fortemente da geração a diesel, o que impacta a Conta de Consumo de Combustíveis (CCC), custeada pela Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Por fim, a Portaria Normativa nº 85, de setembro de 2024, prevê três leilões de transmissão até 2026, com um certame esperado para 2025.
Além disso, a expectativa para 2025 veio indicando que a energia solar seguirá como um dos pilares da transição energética no Brasil, impulsionada pela Micro e Minigeração Distribuída (MMGD). Desde a promulgação da Lei nº 14.300/2022, esse modelo tem se beneficiado de subsídios e sido alvo de intensos debates regulatórios. Exemplo disso foi a Tomada de Subsídio nº 18/2023, que analisou a suposta comercialização de energia elétrica no âmbito da MMGD. Paralelamente, a disputa pela manutenção de incentivos também se reflete em outros temas do setor elétrico. Como exemplo, cita-se a Consulta Pública nº 28/2024, que discute o tratamento regulatório de empreendimentos abrangidos pela Medida Provisória nº 1.212/2024, focando, entre outros pontos, na postergação dos Contratos de Uso do Sistema de Transmissão (CUSTs) por período superior a 12 meses, em meio à corrida gerada pelos incentivos da Lei nº 14.120/2021. Em um cenário de forte disputa por benefícios, fica claro que a busca pela preservação de subsídios seguirá como um dos principais temas do setor.
Embora a geração distribuída esteja consolidando-se como um dos pilares da transição energética no Brasil, seu crescimento acelerado traz desafios significativos para o Sistema Interligado Nacional (SIN). Segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), a MMGD pode alcançar 50 GW de capacidade instalada até 2029. No entanto, essa expansão também pode resultar em um aumento expressivo do curtailment, chegando a 40 GW. Isso significa que, em dias de sobreoferta de geração e de baixa demanda, pode ser necessário reduzir até 40 GW de geração intermitente centralizada para manter o equilíbrio do sistema elétrico.
Confirmando a expectativa de que o tema teria relevância em 2025, já em janeiro, a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de suspender a liminar anteriormente concedida pelo TRF-1, que determinava o ressarcimento dos geradores eólicos e solares por cortes de geração, trouxe novos desdobramentos ao debate sobre a compensação em decorrência do curtailment. A medida, que atendeu a um pedido da ANEEL, reverteu a determinação anterior que obrigava o ressarcimento integral às empresas afetadas.
Mais recentemente, já em março de 2025, a Agência também aprovou a inclusão da geração distribuída no cálculo das perdas não técnicas das distribuidoras, ampliando a discussão sobre a alocação de custos no setor elétrico. Paralelamente, geradores eólicos e solares passaram a defender que, em eventuais novos cortes de geração, as hidrelétricas sejam priorizadas, argumentando que as usinas renováveis intermitentes já enfrentam dificuldades operacionais e financeiras com as restrições. O tema voltou aos holofotes da imprensa, reacendendo discussões sobre a segurança regulatória e os impactos da decisão para os agentes do setor.
Está evidente que, como esperado e já verificado no primeiro trimestre, para o resto de 2025, o setor elétrico brasileiro seguirá enfrentando um cenário repleto de desafios e oportunidades, com ênfase na inovação regulatória e na adaptação às mudanças climáticas.
Portanto, em um contexto de constantes mudanças e evolução tecnológica, os próximos meses de 2025 serão cruciais para equilibrar a segurança energética, a sustentabilidade e a inovação, determinando o rumo do setor nos próximos anos.
*Bianca Wolf é coordenadora da área de Energia do TAGD Advogados.
*Marvin Menezes é sócio e titular da área de Energia do TAGD Advogados.
*Nathalia Moraes é estagiária da área de Energia do TAGD Advogados.
*Patricia Dayrell é associada da área de Energia do TAGD Advogados.
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