A redistribuição dos custos da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), prevista na Medida Provisória (MP) 1.300, pode elevar em até 20% a tarifa de energia para consumidores da alta tensão até 2038, segundo projeções da Envol Energy Consulting. O impacto considera a mudança gradual no rateio do encargo setorial e a redução do desconto na tarifa fio para fonte incentivada aos consumidores.
“Se o desconto no fio cair, esse player que hoje teria um impacto de 16% na tarifa vai para 20%. A gente chamou de ‘vinte mágico’ porque esse é o número que está virando referência no mercado, e ele é bem plausível nesse cenário”, afirma Alexandre Viana, CEO da Envol.
A análise da Envol Consulting considera diferentes cenários e mudanças criadas pela MP 1.300. No curto prazo, a expansão da tarifa social para baixa renda, com gratuidade até 80 kWh de consumo mensal, vai aumentar a CDE, com pressão tarifária.
Alta na conta de luz mesmo com desconto na tarifa fio
Mesmo se os descontos na tarifa fio para fonte incentivada forem mantidos, por esta razão, o consumidor industrial, de alta tensão, deve ter um aumento de 5,1% na conta de luz. Outro motivo para essa alta é a mudança no rateio da tarifa de Angra 1 e 2, hoje paga apenas pelo consumidor cativo, mas que deve passar a ser paga por todos os consumidores a partir do ano que vem.
Em 2038, a Envol vê um aumento de até 16% na tarifa da indústria no cenário em que o desconto pelo uso da rede é mantido. Neste caso, o aumento está relacionado à mudança no rateio da própria CDE.
Entre 2017 e 2023, após mudança promovida pela Lei nº 13.360/2016, o rateio da CDE passou a onerar mais os consumidores de baixa tensão, sob a justificativa de que essa classe consome mais serviços da rede elétrica e, portanto, deveria arcar com maior parte dos encargos do setor. A transição ainda estava em curso, com previsão de chegar a 2030 com 2/3 da CDE alocada no consumidor da baixa tensão e 1/3 do encargo na alta tensão.
A MP 1.300 interrompe essa trajetória, e prevê ainda em 2030 tenha início um retorno gradual à divisão proporcional ao consumo, sem distinção por nível de tensão. A convergência completa entre alta e baixa tensão deve ocorrer até 2038.
“O que está sendo feito agora é aplicar uma lógica de justiça social. Em vez de cobrar mais de quem custa mais para ser atendido, como era na regra anterior, o peso está sendo redistribuído, e isso recai sobre a classe média e a indústria”, explicou William Kay, gerente de estudos de mercado e regulação da Envol.
A consultoria estima que, mantendo o cenário atual, preservando o desconto no uso do fio, a tarifa da alta tensão sobe 16% até 2038.
Sem desconto no fio: alta maior ainda
Mas se esse desconto for retirado, como prevê a própria MP 1.300, o impacto chega a 20% em 2038, com efeito mais acentuado sobre consumidores que não conseguirem migrar para autoprodução.
No curto prazo, já em 2026, a alta sentida pelo consumidor industrial deve ser de 6,1%, maior que os 5,1% do cenário em que é mantido integral o desconto na tarifa fio.
Os especialistas apontaram ainda que na baixa tensão os efeitos são ambíguos. Os consumidores beneficiados pela isenção para quem consome até 80 kWh mensais terão redução na conta. Mas a ampliação da tarifa social tende a pressionar a CDE como um todo, o que também pode encarecer a conta de luz, ainda que a MP reduza outros subsídios e aloque mais custos no consumidor de alta tensão.
Apesar de já estar em vigor, a MP ainda precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional, onde recebeu quase 600 emendas. O texto ainda pode ser substancialmente alterado durante a tramitação.