A ineficiência e o viés otimista do modelo computacional utilizado para a determinação da operação de usinas no sistema elétrico brasileiro geram um custo adicional ao consumidor brasileiro na casa de bilhões de reais por ano, com o acionamento de termelétricas fora da ordem de mérito, de acordo com a opinião de Alexandre Street, professor do Departamento de Engenharia Elétrica do Centro Técnico Científico (CTC) e pesquisador do Laboratório de Programação Matemática Aplicada e Estatística (Lamps), da PUC-Rio.
Segundo o especialista, os recursos que estão sendo despendidos de forma ineficiente no setor elétrico poderiam estar sendo utilizados para outras finalidades relevantes do país. “Estamos criando uma PEC dos Precatórios a cada ano com isso. Os custos fora da ordem de mérito são postos da ordem do que a gente discute no Congresso para resolver problemas importantes no Brasil. São coisas de bilhões”, afirmou Street, em entrevista à Megawhat.
Aprovada no fim do ano passado pelo Congresso, a PEC dos Precatórios abre espaço fiscal de R$ 67 bilhões, de acordo com a consultoria de orçamento da Câmara dos Deputados. Esse valor pode chegar ainda a R$ 110 bilhões.
De acordo com dados da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), o valor do ESS acumulado entre janeiro e novembro de 2021 somou R$ 23,2 bilhões. Em outubro e novembro, período crítico da crise hídrica, o ESS superou os R$ 5,3 bilhões por mês.
“Estamos falando de coisas que afetam de verdade a vida de muita gente. A energia é responsável por grande parte da inflação que estamos vendo”, completou Street.
De acordo com o especialista, o newave – modelo computacional de planejamento da operação do sistema que estima o custo futuro da energia – considera, em geral, um viés otimista com relação às afluências. Isso porque, na prática, o modelo é influenciado fortemente por afluências recentes, em detrimento do nível dos reservatórios hidrelétricos.
“Esse viés otimista cria a sistemática que vemos de esvaziamento dos reservatórios e coloca o sistema em risco”, afirmou o especialista, acrescentando que os cálculos do custo marginal de operação (CMO) e, consequentemente, do preço de liquidação das diferenças (PLD) acabam incorporando esse viés otimista. Dessa forma, mais usinas são despachadas fora da ordem de mérito, gerando custos adicionais.
No fim do ano passado, a CCEE defendeu o aprimoramento dos mecanismos de aversão ao risco da formação do PLD previsto para ser implementado neste ano.
Para Street, a solução precisa se dar no âmbito da governança do setor elétrico, e não apenas com ajustes pontuais no newave, determinados pela Comissão Permanente para Análise de Metodologias e Programas Computacionais do Setor Elétrico (CPAMP).
“Não sou muito crítico ao newave. Sou muito crítico do desenho de como as instituições regem os modelos, da escolha dos modelos e da utilização dos modelos”, completou o pesquisador.
(Foto: Gabriel Campos Neto)
