Enquanto o Tribunal de Contas da União (TCU) avalia dois processos relacionados ao Procedimento de Contratação Simplificado (PCS), um deles referente à autorização pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para que a Âmbar, da J&F, substituísse as usinas contratadas por uma termelétrica existente, a agência reguladora segue os trâmites reguladores dos pedidos de excludente de responsabilidade apresentados pelos agentes vencedores da disputa.
O leilão, realizado em outubro do ano passado, contratou 1.220 MW de potência, ou 778 MW médios de garantia física, ao preço médio de R$ 1.563,61/MWh. Na época, o preço elevado foi justificado pela urgência trazida pela crise hídrica. Em 2022, contudo, as chuvas vieram e os reservatórios das hidrelétricas se recuperaram, ao mesmo tempo em que quase todas as usinas vencedoras do leilão emergencial não entraram em operação até 1º de maio, prazo do edital.
Algumas usinas, como as termelétricas da própria Âmbar e da Karpowership (KPS), não entraram em operação até 1º de agosto, fazendo com que a Aneel abrisse processos para extinguir os contratos. Na próxima terça-feira, 11 de outubro, serão deliberados pedidos de excludente de responsabilidade apresentados por essas empresas – ou seja, elas afirmam que não são responsáveis pelos atrasos, e pedem que os contratos sejam mantidos.
“Vamos enfrentar os dois pleitos, de excludente e contra a revogação das concessões”, disse Ricardo Tili, diretor relator dos processos, durante evento da Aneel com jornalistas nesta sexta-feira, 7 de outubro.
A análise será “rigorosa”, já que as condições para participação eram duras, disse o diretor Hélvio Guerra. “A KPS alega que encontrou dificuldades no licenciamento ambiental. Ela acreditou que teria licenciamento para cumprir o prazo [do leilão] de sete meses, e isso não é alegação pertinente, todos conhecem as condições de licenciamento ambiental no Brasil”, disse Guerra.
Caso os pedidos de excludente de responsabilidade não sejam aceitos pela Aneel, os contratos serão extintos pois os projetos não entraram em operação no prazo limite. Isso vale inclusive para a Âmbar Energia, cuja autorização para substituir as quatro usinas vencedoras do certame pela termelétrica de Cuiabá estava condicionada à construção dos novos projetos.
O diretor Hélvio Guerra, que votou a favor da autorização, lembrou que sua decisão foi reflexo do entendimento de que haveria “vantajosidade” para o consumidor por haver redução do custo. “Mas, admito, é uma situação polêmica”, disse. “Eu entendo as preocupações, são válidas, mas defendo minha posição”, completou.
Se o TCU decidir que a transferência não poderia ter sido autorizada, a Aneel vai tomar as medidas cabíveis. “Nós defendemos a autonomia da agência nas matérias de competência estritamente regulatórias, previstas na nossa lei. As vezes, órgãos tomam decisões que podem conflitar com alguma questão da Aneel. Havendo alguma decisão do TCU que nós entendamos que está na competência do tribunal, vamos acatar de pronto”, disse Sandoval Feitosa, diretor-geral da Aneel.
O processo no TCU está na relatoria do ministro Benjamin Zymler, o mesmo responsável por um outro processo motivado por reclamações de consumidores sobre as contratações do PCS. Nesse caso, o ministro recomendou que o Ministério de Minas e Energia reanalise cada contrato.
“O julgamento do TCU é sobre a política pública. Pode haver desdobramentos, eventual renegociação dos contratos, mas neste momento estamos aguardando. Já lemos o acordão e não há recomendação paralela à agência”, disse Feitosa.
Segundo Tili, se o MME nesse processo entender que pode flexibilizar os contratos, a Aneel vai seguir o comando legal.
Leilão das termelétricas da Eletrobras
Outro leilão polêmico, realizado na semana passada, foi o primeiro para contratação de termelétricas imposto pela Lei 14.120, da privatização da Eletrobras.
A lei determinou a contratação pelo governo de 8 GW em termelétricas localizadas em regiões específicas do país para fomentar o setor de gás natural. O primeiro leilão poderia contratar até 2 GW divididos entre Norte e Nordeste, mas só teve a oferta de cerca de 700 MW divididos em três termelétricas no Amazonas.
Questionados sobre o resultado do leilão, os diretores da Aneel o classificaram como um sucesso. “Pode parecer um contrassenso, mas no caso, ao que competia a Aneel, fizemos o leilão, antecipamos ele, não houve problema nenhum regulatório ou na sua formatação”, disse Sandoval Feitosa.
Segundo Hélvio Guerra, os próximos passos dependem de uma interpretação jurídica. “Na minha visão, o poder concedente terá que definir quando será realizado o leilão da parte não licitada agora pela Aneel”, disse, lembrando que é preciso “cumprir o que está na lei.”