No mesmo dia em que o Tribunal de Contas da União (TCU) adiou a análise das diretrizes para renovação das concessões das distribuidoras que vencem nos próximos anos, colocando em risco prazos importantes desse processo, teve avanço no Congresso um projeto de lei que tira o debate do Executivo e gera muita preocupação no setor.
O deputado federal Icaro de Valmir (PL-SE) foi designado relator do Projeto de Lei 4.831 de 2023, de autoria do deputado Bacelar (PV-BA), apresentado em outubro e que cria novos obstáculos para a continuidade do serviço de distribuição pelas empresas concessionárias.
A partir de amanhã, 15 de dezembro, vai correr um prazo de cinco sessões para apresentação de emendas ao texto.
Políticas públicas no bolso das distribuidoras
O PL permite a renovação das concessões por 15 anos – e não 30, como previsto atualmente nos contratos -, desde que com a autorização do Congresso Nacional. Como contrapartidas, as distribuidoras precisariam assumir custos de políticas públicas do governo, como investimentos na universalização do sistema de distribuição até 2030, sem repasse para a conta de luz. As empresas também assumiriam custos de perdas não técnicas e o risco hidrológico, repassado hoje aos consumidores.
O texto de Bacelar prevê ainda uma garantia às distribuidoras de 70% no mínimo do mercado em que atuam, colocando, dessa forma, um teto para o mercado livre de energia. Os contratos dos consumidores livres não poderiam mais ser renovados a partir deste limite, e os consumidores precisariam retornar ao mercado das distribuidoras.
Além disso, o PL limita em 10% a inserção de geração distribuída na área de atuação das empresas. Depois disso, as concessionárias não seriam mais obrigadas a conectar consumidores com GD na rede.
Garantia contratual
Os contratos das 20 distribuidoras cujas concessões vencem entre 2025 e 2031 contêm cláusulas de prorrogação por 30 anos, direito esse garantido também pela Constituição Federal e pelas leis 8.987/95 e 9.074/95, segundo a Abradee, associação que representa essas empresas.
Pela regra vigente, as distribuidoras precisam se manifestar 36 meses antes sobre a intenção de prorrogar as concessões, e o Executivo precisa se manifestar 18 meses antes com as diretrizes propostas. A primeira distribuidora a ter a concessão vencendo é a EDP Espírito Santo, em julho de 2025, e aguardava que o governo publicasse o decreto com as condições até meados de janeiro, cumprindo as regras do contrato.
O governo realizou uma consulta pública sobre o tema e encaminhou ao TCU as diretrizes propostas, mas o tribunal retirou o assunto da pauta da sessão extraordinária de ontem, 13 de dezembro, atendendo pedidos de parlamentares ligados ao texto de Bacelar e também o ministro da Casa Civil, Rui Costa.
>> Rui Costa pede e TCU adia para 2024 diretrizes da renovação das concessões das distribuidoras
A notícia foi muito mal recebida no setor e no mercado financeiro, já que o prazo de 18 meses precisará ser flexibilizado. A ameaça do PL que leva a discussão para o Congresso, por sua vez, piora a perspectiva dessas empresas.
Perspectivas ruins
Em relatório, o Itaú BBA avaliou que as notícias são negativas para as empresas expostas à distribuição, como Energisa, Equatorial, Neoenergia e CPFL, sendo que a pior situação é a da Energisa.
O UBS BB também fez alertas para os riscos que se desenham para essas empresas, já que as pressões só cresceram desde o apagão em São Paulo que levou muitos parlamentares a pedirem a cassação da concessão da Enel São Paulo – uma das distribuidoras cujo contrato deve ser prorrogado nos próximos anos.
Segundo os analistas Giuliano Ajeje, Gustavo Cunha e Henrique Simões, do UBS BB, há dois pontos de atenção em relação ao PL de Bacelar. O primeiro envolve condições impostas para a renovação dos contratos, como a exigência de que 20% dos membros dos conselhos das empresas seja indicado pelo governo.
“Em segundo lugar, as leis em deliberação no Congresso são potencialmente suscetíveis a emendas que poderiam ir contra a modernização do setor”, escreveram os analistas, lembrando do PL aprovado recentemente pela Câmara para regulamentar a geração eólica offshore, mas que recebeu diversas emendas não relacionadas ao tema criando subsídios que atendem de renováveis ao carvão mineral.