A Âmbar Energia concluiu a implantação das termelétricas contratadas no Procedimento Competitivo Simplificado (PCS) movidas a gás natural. Segundo informações prestadas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) ao Tribunal de Contas da União, as plantas foram efetivamente instaladas e têm a capacidade técnica necessária para suprir as condições operativas exigidas nos contratos de energia de reserva do leilão emergencial de outubro de 2021.
O questionamento à Aneel foi feito pelo ministro do TCU Benjamin Zymler, que é relator de uma proposta de solução consensual para encerrar o impasse que se arrasta sobre esses contratos pelos últimos dois anos. A Âmbar alega que concluiu a construção dos projetos dentro do prazo previsto pelo edital, cujo limite era agosto de 2022. Na época, contudo, a Aneel rescindiu os contratos porque entendeu que a empresa não tinha concluído as obras. A empresa entrou com recurso, mas este nunca foi analisado, assim como um pedido de readequação do projeto que não chegou a ser pautado. Originalmente, foram contratadas quatro termelétricas, mas foram construídas três, que somadas cumprem a potência requisitada, de cerca de 344 MW de potência.
Ao assumir o Ministério de Minas e Energia no início de 2023, o ministro Alexandre Silveira solicitou ao TCU que inaugurasse a Câmara de Solução Consensual com os contratos do PCS, já que havia muitos conflitos devido ao atraso da conclusão dos projetos. A Karpowership do Brasil, por exemplo, foi à Justiça para iniciar a operação das usinas, e já fechou acordo no âmbito do TCU flexibilizando a geração. A negociação da Âmbar ainda está sendo conduzida, e o último capítulo foi o questionamento do ministro Zymler à Aneel, uma vez que para o acordo ser viável, as usinas precisam estar prontas, e elas nunca chegaram a entrar em operação comercial.
Três usinas, não quatro
Segundo fontes, o impasse sobre o início da operação das usinas, que foram compradas pela empresa do grupo J&F no início de maio de 2022, tem a ver com a mudança nas suas características técnicas. Foram concluídas as obras das usinas UTE Edlux X, Epp II e Rio de Janeiro I, e não da EPP IV. A MegaWhat apurou que quando a Âmbar comprou os ativos, a Evolution Power Partners, dona original, havia encomendado máquinas considerando a potência total, e não o número de turbinas. Por isso, decidiram avançar com as obras com apenas três usinas, mas a potência delas combinada é suficiente para cumprir os contratos.
Foi feito um pleito de adequação das características técnicas, com base no próprio edital do PCS que previa isso, mas a Aneel não chegou a deliberar o processo. Como as usinas não entraram em operação, nem em testes, a Âmbar precisou contratar um banco de baterias para fazer o comissionamento das usinas desconectado do grid.
A conclusão das obras era uma condição para que a Âmbar pudesse cumprir o contrato por meio da usina Mário Covas, conhecida como Cuiabá, que tem 480 MW. O pedido, que foi atendido pela Aneel, alegava que essa usina era mais eficiente e teria um custo menor repassado aos consumidores. Como as novas usinas seriam construídas, a condição do edital de expandir a oferta de energia ao sistema seria cumprida.
No contexto da tentativa de solução consensual mediada pelo TCU, o ministro Benjamin Zymler pediu no início deste ano que a Aneel se manifestasse sobre a capacidade de três das quatro usinas suprirem as condições operativas exigidas nos contratos do PCS. Uma semana após o pedido, o diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, encaminhou à área técnica da agência uma solicitação para a verificação da efetiva implantação das UTE Edlux X, EPP II e Rio de Janeiro I.
“Conforme o Relatório de Fiscalização – Análise, já encaminhado à Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos (SecexConsenso) do TCU, foi comprovada que foram concluídas as obras de implantação de três dos quatro empreendimentos (UTEs EPP II, Edlux X e Rio de Janeiro I), sendo que, por decisão do agente de geração, a UTE EPP IV não foi implantada. [Além disso], conforme os ensaios de comissionamento, acompanhados pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), houve geração máxima, em blocos individuais de unidades geradoras, que somados totalizaram 344,67 MW, montante superior aos 343,82 MW contratados no PCS”, disse o relatório de fiscalização da agência.
Foi esse relatório que justificou a decisão de Feitosa, que enviou ao TCU o despacho informando que as UTEs Edlux X, EPP II e Rio de Janeiro I foram efetivamente implantadas e teriam capacidade técnica necessária para suprirem as condições operativas exigidas nos Contratos de Energia de Reserva (CERs) advindos do certame.
Fontes ligadas à Âmbar apontam que o despacho da Aneel mostra que a companhia cumpriu suas obrigações e atendeu a capacidade técnica necessária para suprir as condições operacionais exigidas para o cumprimento dos contratos do PCS. Procurada, a companhia não respondeu até a publicação desta reportagem.
O acordo
Segundo fontes, a confirmação da geração pelas usinas não garante que o acordo da solução consensual vai ser efetivado. Caberá ao ministro Zymler avançar com o tema internamente, ou mesmo levar diretamente a proposta de acordo ao plenário da corte.
A MegaWhat apurou que, no acordo, a usina passará a ter um contrato de flexibilidade, recebendo uma receita fixa pela sua disponibilidade, mas só vai gerar quando necessário. O contrato será ainda alongado dos 44 meses previstos no PCS para sete anos, mantendo a mesma receita total a ser recebida pela companhia, o que vai diluir o custo pago pelos consumidores a cada mês.
Originalmente, as usinas contratadas no PCS tinham inflexibilidade operativa de 100%, ou seja, gerariam energia mesmo sem a necessidade de despacho. A remuneração dessas usinas é feita por meio do encargo de energia de reserva (ERR), pago por quase todos os consumidores.
Outra condição colocada no acordo é que a Âmbar pagará a totalidade das multas devidas à Aneel pelos atrasos na entrada em operação das termelétricas, um valor superior a R$ 1 bilhão, segundo uma fonte ouvida pela MegaWhat, que afirma que será a maior multa já cobrada pelo regulador desde sua criação.
Em contrapartida, a Âmbar terá direito a receber a receita fixa pela disponibilidade da termelétrica Mario Covas, conhecida no mercado como Cuiabá. A receita mensal será da ordem de R$ 120 milhões ao longo de sete anos, chegando a um total de R$ 10 bilhões no período. Embora o valor seja expressivo, é inferior aos R$ 17 bilhões em receita a que as usinas teriam direito no cumprimento das condições originais do PCS, montante que previa também a compra do gás para geração inflexível das usinas.
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Multas do PCS
Das 17 usinas vencedoras do PCS, apenas uma entrou em operação dentro do prazo. Em abril de 2023, o TCU iniciou oficialmente a solução consensual com os vencedores do certame emergencial de 2021, com foco em cinco contratos. Já foi aprovado um acordo com a turca Karpowership do Brasil (KPS), que judicializou o tema, e outro referente às usinas Linhares, Termelétrica Viana e Povoação Energia, todas do BTG Pactual.
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Entre janeiro e agosto de 2023, as usinas vencedoras do PCS receberam R$ 3,7 bilhões em encargos de reserva, segundo dados da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).
Mais um aval
A agência restabeleceu, até 31 de dezembro de 2024, a operação comercial da UTE Uruguaiana, de 639,9 MW, localizada no município de Uruguaiana, no Rio Grande do Sul. De titularidade da Âmbar e sem contratos de venda de energia, a térmica é integrada às reservas de gás da Argentina.