O diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Sandoval Feitosa, se comprometeu a propor em breve uma revisão do regimento da agência para dar celeridade à discussão dos processos, em um debate que pode limitar os prazos dos pedidos de vista que se arrastam na agência reguladora.
A promessa veio como resposta a uma provocação feita pelo diretor Fernando Mosna, que inovou ao pedir destaque de três processos do bloco da pauta da agência reguladora que se tratavam de prorrogações de pedidos de vista por outros diretores.
Eram de relatoria de Mosna um recurso da termelétrica Marlim Azul, para alteração de cronograma, que teve pedido de vista de Sandoval em outubro de 2023, e um dos dois processos que trata de questionamentos sobre o pagamento das indenizações de transmissão conhecidas pela sigla RBSE. A diretora Agnes da Costa pediu vista nesse caso em maio deste ano, quando também pediu vista de outro processo semelhante, que tinha como relator o diretor Hélvio Guerra.
Amparando-se nos princípios da colegialidade, os diretores sempre aprovam automaticamente as prorrogações dos pedidos de vista, renovados a cada oito semanas. Essa foi a primeira vez que o ato foi questionado numa reunião ordinária da diretoria da Aneel. O voto foi vencido já que os demais diretores aprovaram as prorrogações, mas suscitou um debate que poderá levar a um encurtamento dos prazos processuais na agência.
Em suas falas, os demais diretores da Aneel concordaram com o objetivo de aumentar a celeridade nas discussões na Aneel. O embate se deu sobre a forma como isso será feito, pois até então prevalece o entendimento de que durante a vigência de um período de vista, a análise deve ser profunda o quanto necessário, algo que pode levar mais que o prazo usual de oito semanas. Pesam ainda nesta análise o volume crescente de processos na fila dos diretores, assim como as prioridades que emergem de repente, como aconteceu no primeiro semestre, com o tratamento regulatório das medidas necessárias após as chuvas no Rio Grande do Sul.
AGU e os limites de prazos
Na pauta da reunião desta terça-feira, 14 dos 54 processos eram prorrogações de pedidos de vista, sendo nove de Sandoval, quatro da diretora Agnes e um do diretor Ricardo Tili. Segundo Mosna, atualmente há 30 processos parados na Aneel por pedidos de vista, 14 de Sandoval, nove de Agnes, cinco de Tili e dois dele próprio.
O motivo da provocação, segundo relatou Mosna, foi uma entrevista que o advogado-Geral da União (AGU), Jorge Messias, concedeu ao jornal O Globo no sábado, 2 de novembro. Questionado sobre a necessidade de supervisionar as agências reguladoras, Messias disse que ninguém avalia o desempenho dessas agências, e citou que há processos que ficam “dois, três anos com vista e não são devolvidos”.
“Eu acredito que nós devemos dar importância e relevância a essa manifestação do doutor Jorge Messias, advogado-Geral da União, grande advogado que a AGU tem, porque, efetivamente, se a prestação da agência regulatória não acontece a tempo e modo, efetivamente, pode ser questionado o porquê não foi apresentado qualquer tipo de encaminhamento”, disse Mosna.
Questão de ordem X regimento
Para mostrar o compromisso da Aneel com a celeridade dos processos, Mosna propôs que fosse discutida uma questão de ordem que limitasse os pedidos de vista a uma única prorrogação. Como os pedidos valem por oito sessões, seria o prazo máximo de 16 sessões para que os voto vista fossem apresentados na diretoria colegiada.
Uma “questão de ordem” é um instrumento para discutir uma interpretação do regimento, e poderia ser suscitada para a definição da limitação das prorrogações, a exemplo do que acontece em outros órgãos, como o próprio Supremo Tribunal Federal (STF), onde foi introduzida uma emenda no regimento em 2023 limitando os pedidos de vista ao prazo de 90 dias, a fim de dar celeridade a julgamentos parados há muito tempo.
Segundo a diretora Agnes da Costa, o objetivo do pedido de vista não é “sentar em cima dos processos”, mas o tratamento da proposta de mudança no regimento como uma questão de ordem não seria adequado. “Acho que isso é uma questão que temos que trabalhar numa reunião administrativa”, disse.
O diretor Ricardo Tili discordou por entender que, por serem pedidos de vista, são processos mais maduros que os ainda não instruídos, o que tornaria “bastante razoável” limitar o prazo total a 16 semanas. Mosna também disse que não deveriam ser prazos comparáveis, pois, caso contrário, os trâmites da agência para qualquer decisão seriam exageradamente longos.
Após a breve discussão, o diretor-geral manifestou-se alinhado com Mosna sobre os conceitos de eficiência e celeridade na atuação da agência, mas defendeu a mudança por uma reforma do regimento interno, até pela necessidade de concordância pelos quatro diretores, para haver quórum qualificado.
“Eu penso que jogar esse tema para qualquer tipo de tratativa no regimento é quase como pedir vista nesse tema, porque vai ficar suspenso por algum tempo”, disse Mosna, lembrando que desde dezembro de 2022 a diretoria não conseguiu aprovar uma mudança do tipo.
Como uma votação poderia terminar em empate, devido à quinta cadeira ainda vaga na diretoria da agência, Sandoval buscou um caminho pelo ponto de acordo entre os quatro diretores, e se comprometeu em trazer “já” a revisão do regimento especificamente sobre os aspectos da celeridade processual.