
O Ministério Público Federal (MPF) solicitou, em caráter de urgência, a suspensão imediata das licenças ambientais e a interrupção das obras da planta de hidrogênio verde (H₂V) da Solatio, localizada em Parnaíba, no Piauí. O pedido inclui multa diária de R$ 1 milhão em caso de descumprimento.
Segundo o órgão, há oito irregularidades no processo de licenciamento ambiental, especialmente relacionadas ao uso da água no processo de eletrólise.
O projeto da usina prevê cerca de R$ 27 bilhões em investimentos e uma produção anual estimada de 2,22 milhões de toneladas de amônia verde, 400 mil toneladas de hidrogênio verde e 1,82 milhão de toneladas de nitrogênio. Para viabilizar essa produção, será necessária a captação de 3.800 m³ de água por hora e o consumo de 3 GW de energia renovável, conforme informações constantes no processo de licenciamento.
O MPF alega que o licenciamento ambiental atual não abrange todo o escopo do empreendimento, deixando de fora a captação da água, a linha de transmissão, o transporte da amônia e seu armazenamento no terminal portuário, localizado a cerca de 25 quilômetros da planta industrial, limitando-se à planta de produção de hidrogênio verde e amônia.
O que diz a Solatio?
Em nota, a empresa destacou que segue as normas técnicas, regulatórias e legais aplicáveis para este modelo de projeto, visto por ela como crucial para a transição energética.
“Reconhecemos a importância do diálogo construtivo e transparente com a sociedade e com as autoridades competentes e estamos prontos para esclarecer todas as questões levantadas, de forma diligente, transparente, responsável e dentro dos prazos. Estamos confiantes que as incertezas apontadas serão esclarecidas e disponíveis para corrigir eventuais incorreções”, disse a empresa.
Área de conservação e licenciamento ambiental
O órgão questiona a competência da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Semarh) para conceder as licenças. Segundo a ação, a licença prévia foi emitida em novembro de 2023 sem a apresentação do Estudo de Impacto Ambiental (EIA), que só foi produzido posteriormente, em março de 2025, para obtenção da licença de instalação.
Para o MPF, a atribuição do licenciamento deveria ser do Ibama, já que o projeto se encontra nas proximidades de uma Área de Proteção Ambiental (APA) e de uma Reserva Extrativista Marinha. Outro ponto é a ausência de participação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), responsável pelas unidades, foi convidado para audiência pública sobre o ativo, mas não autorizou o empreendimento.
Ainda segundo o MPF, a captação massiva de água do rio Parnaíba poderá comprometer o regime fluvial, impactando negativamente a fauna aquática, os ecossistemas associados e as atividades produtivas das comunidades tradicionais. A petição afirma que, por dividir os estados do Piauí e do Maranhão, e por se tratar de um bem público da União, o uso do rio Parnaíba reforça a necessidade de licenciamento federal conduzido pelo Ibama.
Outro ponto citado é a ausência de outorga prévia da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) para o uso dos recursos hídricos, o que o MPF classifica como uma falha grave, considerando especialmente o volume elevado de captação.
A petição ainda aponta ausência de consulta prévia, livre e informada às comunidades tradicionais afetadas, além de irregularidades formais no trâmite do licenciamento ambiental e falhas na análise dos impactos ambientais do projeto.
O MPF também critica o fracionamento do processo de licenciamento, dividido entre captação de água, produção, armazenamento e transporte de hidrogênio verde. Para o órgão, esse fracionamento compromete a avaliação global dos impactos ambientais e subdimensiona os riscos associados ao projeto.
O projeto teve o parecer negado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em abril deste ano, o que também é usado como argumento na petição. No entanto, em maio, a autarquia determinou a paralisação de outros pedidos de acesso que possam prejudicar as solicitações da Solatio enquanto a empresa puder recorrer na esfera administrativa.