Apagão

Ministro responsabiliza Aneel e dá três dias para Enel restabelecer energia em SP

Silveira aproveitou para subir o tom das críticas à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e citou uma possível modernização da Lei Geral das Agências Reguladoras.

Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia (direita), e o diretor-geral Sandoval Feitosa, da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel)
Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia (direita), e o diretor-geral Sandoval Feitosa, da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) | Michel de Jesus, Aneel

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, deu três dias para Enel restabelecer a energia de uma parte substancial de São Paulo, que sofreu com uma tempestade  na sexta-feira, 11 de outubro, deixando 2,1 milhões de clientes na área de concessão da distribuidora sem luz. Em coletiva de imprensa para tratar de ações para socorrer as áreas ainda atingidas, Silveira aproveitou para subir o tom das críticas à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e citou uma possível modernização da Lei Geral das Agências Reguladoras.

Para o ministro, a autarquia tem falhado na fiscalização da distribuidora de energia, uma vez que o histórico de problemas da Enel ocorre “reiteradamente” em São Paulo e em outras áreas de concessão da empresa.  Como exemplo, ele citou um ofício encaminhado à Aneel, em novembro de 2023, quando ocorreu apagão semelhante no estado, pedindo a análise de uma possível ruptura no contrato da empresa, porém, até o momento, “a agência reguladora não deu andamento no processo”.

“Nada foi feito até então, pelo menos que eu tenha conhecimento ou que eu tenha recebido uma resposta da agência. Esse é o ponto. […] Ficou arcaica a criação do modelo de agências reguladoras. Sempre defendi as agências reguladoras, continuo defendendo, mas acho que elas têm que se adaptarem do ponto de vista, inclusive, da sua autonomia, que não quer dizer soberania, ter prerrogativa de fazer ou não fazer algo”, disse o ministro nesta segunda-feira, 14 de outubro, na coletiva que sucedeu uma reunião de autoridades na sede da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).

Em fevereiro deste ano, a Aneel estabeleceu multa de R$ 165,8 milhões à Enel São Paulo devido ao apagão que atingiu o estado em novembro de 2023, e que se prolongou por quase uma semana. A penalidade foi aplicada após análise da área técnica da autarquia concluir que houve falhas por parte da distribuidora no restabelecimento da energia em questão. De acordo com a Aneel, a multa administrativa foi a maior penalidade já aplicada no seguimento de distribuição até o momento.

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O ministro ainda voltou a falar que a Aneel é responsável por aplicar políticas públicas e criticou o não comparecimento do diretor-geral da agência, Sandoval Feitosa, na coletiva realizada hoje, afirmando que é um “ato de covardia”.

“A prova disso é a omissão do seu diretor-geral, que está ausente. Há uma convocação do ministro, num ato de covardia. Cabe aos órgãos de controle, seja o Tribunal de Conta da União ou o Ministério Público, estarem mais atentos ao cumprimento das responsabilidades da Aneel. Mudou o governo e não mudou a Aneel, por quê? Porque a lei das agências prevê mandato.  Os diretores da Aneel foram indicados pelo governo anterior e todos têm padrinho. Nós ficamos à mercê da vontade deles de cumprir a sua obrigação, de implementar decretos presidenciais e medidas provisórias com força de lei”, disse o ministro.

Silveira já sinalizou sua insatisfação com o modelo atual da agência em outros momentos. Em meados de agosto, ele negou uma possível intervenção na Aneel depois de reclamar da demora do cumprimento de prazos normativos, mas destacou que, caso seja necessário, a pasta pode “fazer valer” as políticas públicas determinadas pelo executivo em situações de descumprimento de prazo pelas agências reguladoras.

“É uma controvérsia chamar de interferência, até porque quem envia um ofício citando e cobrando o cumprimento de prazos não está interferindo. O artigo nº 200 permite ao governo federal, ao Executivo, em caso de descumprimento pelas agências reguladoras dos prazos das políticas públicas, ele [pode] usar o artigo para poder fazer valer as políticas públicas implementadas”, falou o ministro na ocasião.

A MegaWhat entrou em contato com a assessoria do MME para questionar qual seria o “artigo 200”, mas não obteve retorno. Na carta enviada por Silveira ao diretor-geral da Aneel para reclamar dos atrasos, contudo, ele citou o Decreto-Lei 200, de 1967, que dispõe sobre a organização da administração pública. 

Resposta da Aneel

Minutos após a coletiva, a Aneel divulgou um ofício, no qual pontuou que o diretor-geral conduziu reunião no domingo, 13 de outubro, com as distribuidoras, e que consta em sua agenda o trabalho de inspeção das áreas atingidas pela tempestade e o acompanhamento de ações de recuperação de circuitos. Para a reunião solicitada pelo ministério que antecedeu a coletiva de imprensa, a diretora-geral substituta, Agnes da Costa, participou junto com o superintendente de fiscalização da Aneel, Giácomo Bassi.

“O diretor-geral realizará inspeções in loco em áreas da concessão da Enel SP atingidas pelo evento climático, para avaliar a extensão dos danos e estratégias de atendimento a serem adotadas pelas empresas e, nesse sentido, a Aneel será representada por sua diretoria na reunião agendada para hoje, na sede da CCEE”, diz trecho da nota.

Uma nota também foi publicada no site da agência reguladora sobre a sua atuação para ajudar a solucionar a crise energética em São Paulo. Além do plano, a Aneel reforçou sua autonomia, afirmando que segue as normas da Lei Geral das Agências Reguladoras, e que o seu “papel de regulador e fiscalizador é garantir que os consumidores brasileiros tenham acesso a um serviço de energia elétrica de qualidade, contínuo e seguro, e que qualquer tentativa de intervenção ou tutela indevida na atuação da agência não contribui para a verdadeira solução do problema”. 

Mais de 530 mil consumidores sem energia

Após um forte vendaval que deixou cerca de 2,6 milhões de clientes sem energia na cidade de São Paulo, Região Metropolitana e Grande São Paulo, na sexta-feira, 11 de outubro, mais de 535 mil clientes continuam sem o fornecimento nesta segunda.

Dos 2,6 milhões de consumidores, 2,1 milhões estavam localizados na área de concessão da Enel SP.

Na coletiva, Silveira deu à Enel o prazo de três dias para restabelecimento da energia elétrica na maior parte do estado, e destacou que a empresa “cometeu um grave erro e que descumpria o contrato por não dar uma previsão objetiva de retomada.

“Depois disso, o máximo que ela poderá justificar é não ter conseguido resolver locais pontuais, onde não tem acesso por motivo superveniente”, afirmou.

Para ajudar a Enel, serão enviadas equipes de seis distribuidoras de energia: Neoenergia, Light, Energisa, Equatorial, EDP e CPFL. As empresas de transmissão ISA Cteep e Eletrobras Furnas também auxiliarão.  De acordo com o ministro de Minas e Energia, a força-tarefa aumentará de 1.400 profissionais em campo contratados pela Enel para 2.900 eletricistas. As empresas de fora de São Paulo também enviaram cerca de 200 caminhões de reparo.

Já a Aneel informou que está conduzindo uma apuração rigorosa e técnica sobre a atuação da distribuidora durante o período crítico, dentre elas o acompanhamento diário das operações com equipe técnica dedicada, articulação com outras concessionárias de serviço público de distribuição e transmissão que atuam no estado.

“No plano administrativo, será encaminhada intimação formal à Enel SP como parte integrante do relatório de falhas e transgressões para apreciação da diretoria colegiada para fins de avaliação da continuidade do contrato de concessão. Caso sejam constatadas falhas graves ou negligência na prestação do serviço, a agência não hesitará em adotar as medidas sancionatórias previstas em lei, que podem incluir desde multas severas, intervenção administrativa na empresa e abertura de processo de caducidade da concessão da empresa”, destacou a autarquia.

Ruptura de contrato

Questionado sobre o fim do contrato da empresa, Silveira disse que, como o setor elétrico nunca teve essa experiência, é difícil mensurar as consequências, já que a empresa tem um contrato válido até junho de 2028.

“Eu determinei a abertura de um processo disciplinar e administrativo que pode chegar a uma decisão qualquer da cidade, que passa naturalmente por uma intervenção. Isso é um processo”, pontou.