*Atualizado em 11/12/2024, às 17h
O Projeto de Lei 576/2021, que estabelece um marco legal para geração eólica offshore, não só aloca nos consumidores custos bilionários de subsídios, como deve agravar o problema do curtailment e a falta de demanda para novos contratos de venda de energia para a fonte eólica, e coloca em risco inclusive a possibilidade de demanda por meio de um leilão de reserva.
A conclusão é do CEO da PSR, Luiz Barroso, a partir da análise do texto aprovado ontem, 10 de dezembro, na Comissão de Infraestrutura (CI) do Senado, e que deve passar pelo plenário da casa nesta quarta-feira, 11 de dezembro.
O projeto de lei ficou conhecido como PL dos “jabutis” por conta das emendas não relacionadas ao texto aprovadas na Câmara, incluindo subsídios a termelétricas a gás natural, pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), renováveis e carvão mineral. Na época, no fim de 2023, a PSR chegou a calcular que a aprovação do PL teria impacto de R$ 25 milhões por ano na conta de luz até 2050.
Com as alterações do Senado, que retirou, por exemplo, a prorrogação de subsídios à geração distribuída (GD), o impacto cai para ainda elevados R$ 17 bilhões por ano até 2050, um aumento de 7,5% na conta de luz.
“Não interessa se são R$ 2 bilhões ou R$ 17 bilhões. O Brasil vai precisar de muitos investimentos para adaptação às mudanças climáticas, em aumentar a resiliência, e os investimentos precisam ser pagos pela tarifa. Se o Brasil usar o espaço tarifário para contratar projetos com custo-benefício duvidoso, estaremos gastando dinheiro do consumidor de forma irresponsável”, disse Barroso.
Aumento dos custos
A perspectiva de aprovação do PL nesta semana tem renovado a mobilização de entidades do setor que se posicionam contrariamente. No início da semana, uma carta assinada por associações de consumidores, geradores, distribuidores, transmissores e comercializadores de energia foi enviada aos senadores alertando sobre os impactos da aprovação do PL.
“Os custos impostos sem razoabilidade aos consumidores no marco legal da eólica offshore superam e muito qualquer benefício que o marco legal possa entregar aos brasileiros no curto e médio prazo. É uma distorção completa que uma matéria relevante seja usada de instrumento para aumentar, imediatamente, a conta de energia das populações mais pobres do Brasil”, disse Rodrigo Ferreira, presidente da Associação Brasileira de Comercializadores de Energia (Abraceel), uma das entidades que assina o documento.
A Frente Nacional dos Consumidores de Energia, que também assinou a carta, publicou nota à imprensa após a aprovação pela comissão do Senado nomeando os 14 senadores que votaram a favor da aprovação do parecer do senador Weverton Rocha (PDT-MA), que manteve a maior parte das emendas aprovadas na Câmara há um ano. ” Chegaremos à COP30 com um legado climático negativo para apresentar à comunidade internacional: o Parlamento está sujando a matriz elétrica brasileira, tão admirada ao redor do mundo”, diz o comunicado.
Entre os “jabutis”, o estudo da PSR destacou os impactos tarifários da contratação compulsória de 4,25 GW em termelétricas a gás inflexíveis, a prorrogação de contratos de térmicas a carvão, a contratação compulsória de 4,9 GWs em PCHs, a extensão dos contratos do Proinfa, a contratação compulsória de 300 MW em eólicas no Rio Grande do Sul, além da obrigação da construção de uma planta de 250 MW de hidrogênio.
Impactos negativos para a eólica… offshore
Segundo Barroso, um efeito indireto importante dessas emendas é a piora do curtailment, já que mais geração inflexível vai aumentar os cortes de fontes não despacháveis.
Além disso, o PL da eólica offshore não cria a obrigação da compra da energia elétrica a ser gerada nesses empreendimentos, e os jabutis dificultam que essa demanda seja viabilizada. “Um consumidor industrial não vai querer comprar energia de eólicas offshore, com preço mais caro, e não existe uma estratégia de eletrificação no Brasil no médio prazo que passe pela offshore. Então, a offshore vai precisar disputar com outras fontes”, explicou o CEO da PSR.
Se a estratégia passar por defender um leilão de energia de reserva para viabilizar os investimentos, os jabutis em questão vão ocupar essa demanda.
Para o especialista, além de todos os custos já calculados e de toda a contribuição para a “desgovernança energética” que vive o país, “os jabutis ocupam um espaço no leilão de reserva que poderia ser ocupado pelas renováveis, incluindo a própria offshore. Ou seja, os jabutis tiram espaço da offshore nos leilões de reserva, dado que este é o único mecanismo que esta fonte tem para entrar, pois ela não é competitiva no mercado cativo nem no livre”, completou.
Impactos sociais
Os setores beneficiados pelo PL, por sua vez, comemoraram a aprovação. É o caso da Associação Brasileira do Carbono Sustentável (ABCS), que representa o carvão mineral, para quem a manutenção da atividade carbonífera é fundamental para as regiões no Sul do Brasil que dependem desta indústria.
A falta de benefícios às usinas a carvão do Nordeste do país, que utilizam carvão importado, chegou a ser objeto de reclamação antes da apreciação do texto na CI hoje.
Segundo Carlos Baldi, presidente da Energia Pecém, que controla a termelétrica Pecém 1, faltou isonomia na elaboração do PL, e sem incentivos os estados do Ceará e Maranhão, onde há usinas desta fonte, serão prejudicados com redução na arrecadação. “O texto, além da perda de arrecadação, impactará de forma significativa os trabalhadores diretos e indiretos dos dois Estados. Devemos ter isonomia entre os projetos do Sul e Nordeste do Brasil”, disse Baldi.
Para a Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa (Abragel), a aprovação do PL trará avanços muito importantes para o desenvolvimento de uma matriz elétrica equilibrada, segura, confiável e com ênfase na modicidade tarifária.
“Os dispositivos que incluem as centrais hidrelétricas de pequeno porte são fundamentais, uma vez que elas são alternativas importantes para endereçar a expansão limpa, renovável e firme da nossa geração de energia e nossos objetivos de transição energética, com cadeia produtiva 100% nacional e atributos técnicos e ambientais significativos que asseguram flexibilidade operativa e sustentabilidade ambiental, além de proporcionarem menores custos para as tarifas dos consumidores”, disse Charles Lenzi, presidente da Abragel.