A superintendência-geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) sugeriu a aprovação das propostas da Petrobras que flexibilizam o cumprimento de Termos de Compromisso de Cessação (TCCs) assinados em 2019 relacionados à concorrência nos mercados de refino e transporte de gás. Nos documentos submetidos à entidade, a estatal alegou que se empenhou para cumprir os acordos, mas empecilhos alheios à petroleira impediram o pleno cumprimento nos prazos estabelecidos. A diretoria do Cade ainda vai analisar as propostas e pode acatar ou não o entendimento da superintendência.
Em nota técnica, a superintendência-geral disse entender que o cumprimento parcial dos TCCs já provocou mudanças importantes nos mercados de transporte de gás e de refino no Brasil, e que as medidas propostas pela Petrobras poderão viabilizar a continuidade da desconcentração do mercado – que seria o objetivo principal dos TCCs originais.
Nas propostas apresentadas ao órgão antitruste, a Petrobras explicou que não avançou nas vendas de refinarias e da Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil (TBG), como acordado com o Cade, por falta de propostas atrativas de novos investidores. Ao mesmo tempo, a companhia afirma que desde 2019 houve mudanças significativas nos mercados no Brasil e no mundo, e as vendas desses ativos não seriam mais interessantes no contexto da transição energética. Por isso, são propostas alternativas à venda dos ativos, sob a argumentação de que assim a concorrência será garantida e não haverá abuso de poder de mercado pela estatal.
Na época em que os TCCs foram assinados, o objetivo era contribuir com o avanço da abertura do mercado de gás natural brasileiro, até então dominado pela Petrobras em todos os elos da cadeia, e estimular investimentos privados em refinarias no Brasil – a Petrobras era dona de 98% do parque de refino nacional, e a concorrência ficava a cargo de importação e empresas com baixa expressividade no território brasileiro. O TCC de refino suspendeu ainda um inquérito administrativo que apurava suposto abuso de posição dominante pela estatal.
TBG
No TCC relacionado ao papel dominante da Petrobras no transporte e na distribuição de gás, o único desinvestimento não realizado foi o da TBG. Na época em que o acordo com o Cade foi celebrado, a companhia já tinha vendido os controles da Transportadora Associada de Gás S.A. (TAG) e da Nova Transportadora do Sudeste (NTS). Em 2021, foi vendida sua fatia na Gaspetro, mas restou a transportadora responsável por trazer o gás boliviano ao país eu seu portfólio.
Ao Cade, a estatal argumentou que a venda da TBG não foi possível diante do não recebimento de propostas dentro do valor de mercado da transportadora, com posterior determinação do Ministério de Minas e Energia (MME) para suspensão da alienação de ativos da Petrobras, após a mudança de governo. Além disso, o Planejamento Estratégico da companhia divulgado no final de 2023 voltava a prever a integração de negócios de gás.
Para assegurar a autonomia da TBG, a Petrobras propôs dispositivos de governança, com indicação de conselheiros independentes selecionados por meio de head hunter. Além disso, a estatal planeja sugerir aos demais sócios da TBG que o diretor Financeiro também seja selecionado por profissional independente, e assegurou a vedação de interferências de qualquer de suas gerências com a diretoria Financeira da TBG.
A ideia é segregar os papeis da Petrobras “acionista”, cujos interesses residem na excelência da condução dos negócios e no crescimento sustentável da companhia, da Petrobras “carregadora”, cujos interesses residem na contratação de serviços de transporte de gás natural junto à TBG.
A área técnica do Cade acatou a argumentação da Petrobras, e reconheceu que já existem mecanismos no Portal de Oferta de Capacidade (POC), onde a TBG e demais transportadoras oferecem suas capacidades ociosas, que inibem a discriminação de carregadores por parte do transportador. O Cade também considerou que a TBG tem bastante capacidade ociosa, o que comprovaria a viabilidade de contratação por terceiros.
Refino
Para continuar com a abertura do mercado de refino, a Petrobras propõe divulgação ampla e não-discriminatória de suas diretrizes gerais comerciais para a venda de petróleo cru e a celebração de contratos na modalidade Frame, em que assegura os volumes requeridos pelos compradores durante o período de negociação. Assim, o papel dominante da companhia no setor não seria um impeditivo para investimentos privados, ampliando a concorrência.
A diferença entre um contrato Spot e um contrato Frame, segundo a nota técnica do Cade, é que no contrato Frame a vendedora preserva os volumes solicitados até o fim da negociação e o acordo tem prazos mais longos e pré-fixados, enquanto na contratação Spot não há garantia de preservação dos volumes em negociação e os acordos costumam ser de produções marginais para entrega imediata, sem contratações de longo prazo.
Além disso, as negociações das contratações Frame serão monitoradas pelo Cade, com arquivamento de todas as trocas entre as partes. Embora o Conselho não vá arbitrar sobre os preços praticados, o monitoramento tem como objetivo afastar a prática de preços demasiadamente altos que possam encobrir uma eventual recusa de fornecimento.
Refinarias não alienadas
A Petrobras alega que não conseguiu cumprir o TCC relacionado à alienação de 50% de sua capacidade de refino em grande medida porque não foram recebidas propostas dentro dos valores de mercado calculados pela própria Petrobras e pelo Citibank, que foi o assessor financeiro contratado para as transações. Isto ocorreu para a Refinaria Presidente Vargas (Repar), Refinaria Gabriel Passos (Regap) e Refinaria Alberto Pasqualini (Refap). A Refinaria Abreu e Lima (RNEST) teve desistência da única empresa que permaneceu interessada após a pandemia de Covid-19.
No caso da Refinaria Lubrificantes e Derivados do Nordeste (Lubnor), a transferência foi frustrada por questões relacionadas ao terreno onde está instalada a planta. A refinaria está em área cuja propriedade é parte da União e parte da prefeitura de Fortaleza. A União não reconheceu a competência da Petrobras para negociar a transferência de um ativo federal, além de exigir de pagamento retroativo referente a todo o tempo em que a Petrobras ocupou o espaço, o que foi contestado pela empresa.
Em relação ao território da prefeitura de Fortaleza, a Petrobras descreveu que, após negociações, revelou-se que o terreno não tinha matrícula regular e seria necessário aguardar o trâmite legislativo municipal para resolver a situação, que só seria resolvida após o prazo vinculado no contrato de alienação da refinaria.
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